Estado compõe programação do Dia Internacional de Luta contra as Monoculturas de Árvores
O Dia Internacional da Árvore, comemorado nesta terça-feira (21), é também o Dia Internacional de Luta contra as Monoculturas de Árvores, lembrado anualmente nos territórios impactados por esta atividade. A principal frase de luta é “monocultivos de árvores não formam florestas”.
No Espírito Santo, as ações da data são coordenadas pela Rede Alerta Contra os Desertos Verdes, formada por entidades e ativistas ligados às comunidades quilombolas, aos povos indígenas, de organizações camponesas, de famílias sem-terra e de defesa do meio ambiente e dos direitos humanos em várias partes do Brasil.
Durante a manhã, haverá atividades locais, incluindo a mobilização capixaba no Território Quilombola Tradicional do Sapê do Norte, entre Conceição da Barra e São Mateus, no norte do Estado. Para guiar as discussões, os organizadores entoam questões como: Celulose e siderurgia para que e para quem? Quem financia, quem fornece tecnologia e serviços, quem compra desse setor? Quais os principais conflitos provocados por essa indústria na sua região? Como o setor se relaciona com os poderes legislativo, executivo e judiciário? Como funciona a Captura Corporativa dessas empresas? Que estratégia as empresas usaram para se instalar nos territórios? Quais conseguimos mudar? Como se dá a relação com os trabalhadores e trabalhadoras, a precarização e a terceirização?
Encerrando a programação matutina, um Twittaço às 11 horas, com hashtags #PlantaçõesnãosãoFlorestas #RedeAlertaContraosDesertosVerdes #Monocultura=Monofuturo #DiganãoaodesertoVerde.
À tarde, uma reunião virtual interna da Rede, com objetivo de formar uma relatoria com sínteses dos últimos acontecimentos nos territórios, organizados por estados e regiões do país, a ser apresentado na atividade da noite, que encerra o evento, um debate aberto ao público, transmitido ao vivo nas redes sociais da Rede Alerta.
Durante a live será feita homenagem a Ricardo Carrere, fundador do WRM, sigla em inglês para World Rainforest Movement, ou Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais, uma das mais destacadas no apoio às “lutas reflexões e ações políticas de povos que dependem da floresta, indígenas, camponeses e outras comunidades do sul global”, autodefine-se a organização.
Em seguida, será lançada a publicação A Farsa da Solidariedade S/A, seguido do Relato da Nacional da Rede Alerta, finalizando com a elaboração do Manifesto do Dia 21 de Setembro.
Sobre a Farsa da Solidariedade, o foco é desmascarar a campanha nacional, feita em 2020 pelas papeleiras e outras grandes indústrias que degradam o meio ambiente em horário nobre da televisão aberta brasileira, sobre suas ações de solidariedade diante das populações mais vulneráveis diante da pandemia de Covid-19.
“Essas grandes empresas destruidoras do meio ambiente e da vida das pessoas são em grande parte responsáveis pelas pandemias e péssimas condições de vida que muitas pessoas atravessam no enfrentamento da pandemia. O caos social e ambiental do Brasil e outros países são causados por essas grandes empresas. Demitem seus trabalhadores na pandemia, retiram direitos trabalhistas, perseguem lideranças sindicais, fazem de tudo para impedir que os trabalhadores do campo e indústria não lutem por seus direitos. Quando elas saem a público para dizer que são solidárias, é uma grande mentira e farsa”, aponta Beto Loureiro, ativista da Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional no Espírito Santo (Fase/ES).
A produção da publicação, iniciada há cerca de um ano, foi uma das atividades realizadas durante a pandemia, que esfriou uma retomada que a Rede Alerta havia experimentado em 2019, após quase uma década de recolhimento no apoio às lutas empreendidas pelas comunidades quilombolas, indígenas, camponesas e de pescadores artesanais capixabas.
“Durante um encontro da Recoma [Rede Latino-americana contra a Monocultura de Árvores] no Rio Grande do Sul, em 2019, decidimos sair da ‘hibernação’, pois vimos que conquistas que a gente achava que estavam consolidadas, voltaram a ficar ameaçadas. Resolvemos buscar forças nos bons exemplos do passado e retomar as ações”, relata Beto.
Mais de 30 anos de atuação
Até essa hibernação, foram vinte anos de luta ativa ao lado das populações impactadas pelo deserto verde. “Foi no final dos anos 1990 que a luta dos povos da terra desaguou na Rede Alerta contra os desertos verdes”, relembra o ativista. Luta que, no Espírito Santo, se iniciou na década de 1960, quando os primeiros monocultivos de eucaliptos começaram a ser implantados no norte do Estado por empresas como a então Companhia Vale do Rio Doce e Aracruz Florestal, esta que ampliou as dimensões do impacto de forma extraordinária, preparando a matéria-prima para o funcionamento da Aracruz Celulose, posteriormente redenominada Fibria, hoje Suzano.
O município de Aracruz foi o primeiro a ser invadido pela papeleira, não só por ser o endereço da planta fabril de celulose e da substituição de centenas de talhões de Mata Atlântica primária por plantios de eucalipto, mas também devido à instalação do Portocel, projetado para exportar a celulose para o mercado internacional.
O porto foi o primeiro que a então comunidade pesqueira de Barra do Riacho viu se sobrepor aos seus territórios tradicionais de pesca artesanal, por meio da privatização do mar e das faixas de praia. A comunidade também sofreu com o represamento do rio Riacho, afetando a dinâmica hídrica da região e o abastecimento de água da comunidade, questões severamente agravadas pelo bombardeio de outros grandes empreendimentos industriais que chegariam em seguida, a maioria na área petrolífera.
Após trinta anos de lutas de tantos povos tradicionais impactados pelo deserto verde e demais empreendimentos a eles agregados, Beto conta que estudantes, professores e pesquisadores universitários se uniram aos movimentos populares, criando, no início dos anos 1990, a Rede Alerta contra o Deserto Verde.
Uma década depois, a Rede marcou forte presença no I Seminário Internacional sobre Eucalipto e seus Impactos, promovido em 2001 pela Comissão de Agricultura e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo (Ales).
“O Seminário mostrou que os impactos vão além da monocultura e da planta industrial, mas também a forma ilegal com que a empresa se apropriou das terras, usando funcionários seus como laranja, tudo isso contado na ‘CPI da Aracruz'”, destaca, referindo-se à investigação conduzida também pela Assembleia, em 2002, para investigar casos de grilagem de terras no norte do Estado pela papeleira.