O oceanógrafo especialista em Pesca e analista ambiental do ICMBio em Vitória, Nilamon de Oliveira Leite Junior, esclarece que a maioria das espécies constantes na Portaria 445/2016 não interfere na pesca.
Segundo ele, das dezenas de espécies de badejos e garoupas usadas na moqueca capixaba, apenas duas de garoupa e uma de badejo estão na lista. E outras espécies, bastante valorizadas para consumo, não estão ameaçadas de extinção, como os dourados, robalo e vermelhos. “Apenas um vermelho está na lista, o caranha”, informa. Mas os mulata, realitos, dentões e outros, não estão, podendo ser pescados normalmente. Das espécies de tubarão ou cação, acrescenta Nilamon, apenas o tubarão azul tem valor comercial e não está na lista do MMA.
Por isso, argumenta o especialista, as poucas espécies que constam na lista de proibição, apesar de “importantes para os pescadores, não determinam o fim da pesca artesanal e da moqueca capixaba”, esclarece. “Tirar da lista não resolve o problema do pescador”, enfatiza.
Caso a caso
O que é preciso fazer então? “É preciso estudar caso a caso. Tudo tem que passar por um planejamento e negociação”, afirma o oceanógrafo. Até porque, se a pesca dessas espécies ameaçadas de extinção continuar sem controle, elas acabarão desaparecendo, o que só faz adiar o problema da pesca artesanal, além de agravar o desequilíbrio ambiental. “Tem que passar por um planejamento negociação”, orienta.
A Nota Técnica, em elaboração pelo ICMBio, segundo Nilamon, foi solicitada pelo MMA em razão da solicitação feita pelo Governo do estado do Espírito Santo, por meio da Secretaria Estadual de Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca (Seag), de retirar 41 espécies da lista da portaria.
O documento está reunindo as primeiras informações sobre essas 41 espécies, mostrando as medidas possíveis para conciliar a manutenção da pesca e a proteção desses animais ameaçados.
Locais de pesca e não-pesca
Sobre os badejos e garoupas, por exemplo, o ideal seria não ter pesca dirigida a eles, que vivem entre recifes, podendo, no entanto, haver liberação de algumas áreas de ocorrência e proibição da pesca em outras, permitindo que alguns locais permitam a reprodução dessas espécies e o aumento do seu estoque natural, evitando a extinção.
Já para os tubarões, uma medida simples e eficiente é a retirada do cabo de aço que geralmente é colocado ao final do espinhel – uma arte de pesca que consiste em uma sequencia de anzóis, instalada em alto-mar. Retirando o cabo de aço, boa parte dos tubarões consegue se soltar do espinhel que continuaria a capturar atuns e dourados, outros peixes comerciais que são alvo dessa arte de pesca.
Nilamon explica que badejos, garoupas e tubarões alcançam a idade reprodutiva apenas por volta dos 30 anos, mas são pescados antes disso, por isso seus estoques estão sendo tão reduzidos, a ponto de estarem ameaçados de extinção. Se não forem protegidos agora, afirma, irão desaparecer.
Da lista do Governo estadual, por exemplo, constam duas espécies de budião que são endêmicas da Ilha de Trindade, ou seja, só ocorrem naquela região e em nenhum outro lugar. Não são importantes economicamente, portanto, podem ter a pesca proibida, sem causar grandes problemas aos pescadores.
Negligência histórica
O especialista também enfatiza que é preciso realizar mais estudos sobre a pesca. A última estatística pesqueira é de 2011 e elas, tradicionalmente, não informam o nome científico das espécies.
Outro problema citado pelo analista ambiental é o fato do setor da Pesca ser, historicamente, muito negligenciado pelos Governos. Quando a portaria foi publicada, em 2014, um de seus artigos determinavam a realização de Planos de Ação para as espécies comerciais e que, criados os planos, elas poderiam voltar a ser capturadas e comercializadas. No entanto, logo depois da publicação da norma, o Ministério da Pesca foi extinção e suas funções foram absorvidas pelo Ministério da Agricultura. Agora, que a portaria volta a ser discutida, a Pesca está em novo processo de transferência, para o Ministério da Indústria.