Foram demolidores para a Vale e a ArcelorMittal Tubarão e Cariacica os depoimentos dos médicos Ana Maria Casati Nogueira da Gama, professora doutora em pneumologia da Universidade Federal do Estado (Ufes), José Carlos Perini, presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai), e do cardiologista José Aid Soares Saad na CPI do Pó Preto. Foram unânimes em apontar que morar na Grande Vitória é mais prejudicial à saúde do que morar em São Paulo, capital.
Os médicos foram convidados pela CPI do Pó Preto da Assembléea Legislativa para falar sobre a relação da poluição do ar com doenças comuns em suas especialidades. Compareceram nesta quarta-feira (20).
Para muitos pacientes com suas doenças alérgicas, respiratórias e cardíacas controladas, a poluição do ar produz agravantes, entre as quais infarto e derrames. Muitos dos pacientes recebem sugestão para que mudem da Grande Vitória para lugares menos poluídos, como única forma de controlar os agravos das doenças.
Especialista em morbidade e letalidade produzida pela poluição desde 1991, Ana Maria Casati (foto) fez doutorado na área na Universidade de São Paulo (USP). Afirmou que a poluição do ar na Grande Vitória não permite que pacientes com sinusite sejam controlados. As pessoas sempre estão em condições agudas. Também assinalou que na região as pessoas usam mais remédios do que em São Paulo para tratar as doenças respiratórias, como asma, rinites e sinusites.
Nos asmáticos, seus pacientes têm de receber mais corticoides. Para muitos, a solução é mudar da Grande Vitória. Os pacientes das Doenças Pulmonares Obstrutivas Crônicas (DPOCs), como o enfisema pulmonar, também são agravados pela poluição do ar. A professora foi didática em apontar a poluição do ar como causadora de doenças cardiovasculares, que levam a infartos e derrames, e explicar o mecanismo de ação dos poluentes. Poluentes, como os derivados do nitrogênio e enxofre, impedem a ação do oxigênio.
A Grande Vitória é recordista nacional em doenças respiratórias, como rinites e faringites. Tem 46% da população apresentando estas doenças, contra uma média nacional de 26%. A poluição do ar causa doenças em todos os moradores, mas afeta com mais intensidade as pessoas com imunidade baixa, as crianças com até cinco anos de idade, idosos e os portadores de doenças respiratórias crônicas.
José Aid Soares Saad informou que em unidades de terapia intensiva cerca de 90% dos pacientes têm mais de 80 anos e sofrem doenças respiratórias agravadas, exigindo tratamento intensivo. É impressionante ver doentes do coração compensados desenvolveram problemas como fibrilação arterial, que pode levar a derrames e infartos. E a matar.
Para os médicos, é claro que a poluição do ar produzida pelas indústrias da Vale e ArcelorMittal está agravando a situação da população, produzindo doenças, agravando os que estão doentes, e produzindo mortes.
E o custo da poluição para os moradores? José Carlos Perini lembrou que cada morador de regiões poluídas tem gasto que varia de 100 a 150 dólares (cerca de R$ 450,00) por ano para tratar doenças derivadas das emissões. Ele criticou o inconsciente coletivo, que acha que está tudo bem, apesar do sofrimento das pessoas.
Perini orientou as pessoas para que não se exercitem ao longo de rodovias, como é o caso da BR-262, onde o trânsito de veículos é intenso. O ar poluído pode produzir doenças. No caso do município de Cariacica, a situação é agravada pela usina siderúrgica da ArcelorMittal, localizada na divisa com Vila Velha.
A poluição lançada ao ar pela Vale e ArcelorMittal Tubarão é mais intensa na área litorânea, onde moradores se exercitam. Mas ninguém na Grande Vitória consegue fugir dos poluentes. Todos os moradores, que respiram poluentes 24 horas por dia, ficarão doentes, como já afirmou um médico carioca em depoimento na CPI.
Médicos e membros da CPI do Pó Preto estavam de acordo na reunião desta quarta sobre a necessidade de mudar a legislação estadual do pó preto. Os limites, em vigor desde 2013, favorecem as empresas, que afirmam como um principio que estão dentro da lei.
Os deputados também pediram apoio para realizar pesquisas, indicadas na reunião, sobre prevalência de doenças relacionadas diretamente com a poluição. A professora Ana Casati se comprometeu a produzir protocolo para este fim, assinalando que a pesquisa indicada é simples e custa pouco. Os deputados asseguraram que arranjarão recursos para comprar os equipamentos.
A CPI deve reconvocar os presidentes da Vale, Murilo Ferreira, e da ArcelorMittal, Benjamin Baptista Filho, além da presidente do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), Sueli Tonini, pois consideram mentira quando prestaram depoimentos na CPI. Requerimento neste sentido foi apresentado pelo deputado Gilsinho Lopes (PR) e ficou de ser analisado pela comissão, em reunião interna.
Além de emitir as famosas PM10 (partículas inaláveis, de diâmetro inferior a 10 micrómetros (µm)) e as ainda mais graves PM2,5 (partículas inaláveis finas), a Vale e a ArcelorMittal produzem gases, como o enxofre. As duas empresas não tratam seus poluentes emitidos pelas chaminés, como admitiram na CPI. A ArcelorMittal, por exemplo, tem três siderúrgicas no Planalto de Carapina, e só duas unidades de dessulfuração.
A siderúrgica ArcelorMital Cariacica é ainda pior. Seus poluentes são vistos a grandes distâncias e poluem grande parte de Cariacica (principalmente a região da Grande Bela Aurora) e de Vila Velha (Grande Cobilândia). Também poluem a região do Centro, em Vitória.