Principal esperança está no andamento de ação movida pela Mitra Arquidiocesana de Vitória
O ano de 2024 foi de aprofundamento da destruição ambiental no Morro de Guaibura, que fica na região da Enseada Azul, em Guarapari. As obras de construção do condomínio Manami Ocean Living avançaram no local, ao mesmo tempo em que a ação contra o empreendimento na Justiça Federal foi suspensa. Por outro lado, os rumos da ação de reintegração de posse movida pela Mitra Arquidiocesana de Vitória na Justiça Estadual dão maior esperança para quem contesta o empreendimento de luxo.
A Mitra entrou com a ação pelo fato de o cercamento do empreendimento no Morro de Guaibura ter incluído uma área reivindicada pela igreja. A entidade defende a anulação do registro de propriedade da área do Morro de Guaibura, devido a “diversos indícios de falsificação do registro imobiliário”.
Uma primeira liminar em favor da igreja foi provisoriamente derrubada em segunda instância. Um novo julgamento na 2ª Câmara Cível de Vitória deverá ocorrer em fevereiro. Em uma manifestação preliminar emitida no último dia 29 de novembro, o juiz Gil Vellozo Taddei descartou um dos principais argumentos da Design 16, empresa responsável pelo condomínio, de que a controvérsia sobre a posse do Morro já foi julgada em definitivo anteriormente.
Segundo a empresa, uma ação sobre a posse da área do Morro de Guaibura, julgada em 1988, teve decisão desfavorável à Mitra Arquidiocesana e já transitou em julgado. O juiz entendeu, porém, que o assunto atual em questão se trata de uma área de 800 metros quadrados requerida pela Mitra, e o processo de 1988 tratava de outra extensão territorial de 25 mil metros quadrados.
Além disso, o magistrado argumentou que “a versão dada aos fatos por ocasião do julgamento da primeira ação possessória não é imutável e indiscutível em processos posteriores”. Apesar disso, ainda resta decidir, de forma incontroversa, sobre a questão da posse da área.
Ação paralisada
A juíza federal Maria Claudia de Garcia Paula Allemand decidiu, no último dia 10 de dezembro, pela suspensão da ação civil pública (ACP) que questiona a construção do condomínio no Morro de Guaibura. Segundo a magistrada, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) precisa se manifestar de forma “conclusiva” sobre a possível demarcação da área para que o processo prossiga.
A questão nem chegou a ser analisada no mérito. A ACP já passou por tramitação na Justiça estadual, depois teve um pedido de federalização negado, até que a 5ª Turma Especial do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), enfim, decidiu pela tramitação na esfera federal. Agora, a questão poderá retornar para o âmbito estadual.
A ação movida pela Organização Não Governamental (ONG) Sociedade Gaya Religare considera tanto a questão dos direitos indígenas quanto o dano ambiental para pedir a paralisação da construção. Com essa nova decisão, a entidade poderá desmembrar os dois assuntos em processos separados, como forma de tentar impedir a destruição do morro que está em curso, mas a entidade tem dificuldades para custear os trâmites de dois processos.
A Defensoria Pública da União (DPU) emitiu parecer favorável à paralisação das obras, destacando os danos ambientais já causados e “indicativos robustos” sobre a necessidade de documentação de território indígena. Entretanto, a juíza considerou, em sua decisão, a “manifesta ausência de interesse da União e do Ibama” na continuidade da ação na esfera federal.
Licenciamento contestado
A construção do condomínio no Morro de Guaibura começou no segundo semestre de 2023, causando destruição dos ecossistemas locais e restrição de acesso à comunidade da região, inviabilizando suas práticas culturais. O espaço, considerado uma área de preservação ambiental permanente por ambientalistas, já recebeu até mesmo escavações com britadeiras para erguer as colunas do condomínio.
O Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) emitiu um parecer em 2023 questionando as licenças concedidas para a construção. O Conselho Estadual de Cultura (CEC) também apresentou pedido de embargo à obra, mas uma portaria da Secretaria de Meio Ambiente (Seama), nº 011-R de 2016, permitiu que a área tombada fosse desconsiderada no processo de licenciamento ambiental.
Por meio de um abaixo-assinado, os moradores ressaltaram que o condomínio de luxo planejado na área, com capacidade para 460 pessoas (cerca de três vezes a população local), ameaça gravemente manguezais, aquíferos e a vegetação da Mata Atlântica da Área de Preservação Permanente (APP). Outras áreas de Guarapari estão sob intensa pressão do mercado imobiliário.