sexta-feira, novembro 15, 2024
25.9 C
Vitória
sexta-feira, novembro 15, 2024
sexta-feira, novembro 15, 2024

Leia Também:

MPA retoma as ‘roças coletivas’ para criar um Centro de Referência em Agroecologia

Na semana em que um jovem agricultor saudável morre, repentinamente, por insuficiência respiratória aguda, levantando sérias suspeitas de intoxicação por agrotóxicos, surge como um bálsamo a notícia de que o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) está retomando uma antiga prática de formação técnica e política em agricultura alternativa.

Na última quinta-feira (23), um grupo de doze famílias do município de Pancas – bem próximo a Marilândia, onde o jovem citado veio a óbito horas depois de aplicar agrotóxicos em sua lavoura de café – realizou mais um mutirão na área de um hectare onde funciona uma “roça coletiva”, que se prepara para abrigar o primeiro Centro de Referência em Agroecologia do MPA no estado.

A roça coletiva fica na região do Córrego do Espinho e está recebendo plantios de milho, arroz, mandioca, banana e amendoim. A produção é compartilhada entre o grupo e o objetivo é que, a partir de fevereiro, se transforme em um Organismo de Controle Social (OCS), que poderá receber certificação participativa do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), favorecendo a comercialização com reconhecimento do produto como sendo diferenciado, saudável e sustentável.

Mesmo com todo o caráter de trabalho coletivo que caracteriza o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), uma das principais organizações voltadas à expansão da Agroecologia no Brasil e no mundo, tendo ajudado a fundar a Rede Campesina, que atua em toda a América Latina há vinte anos, a iniciativa é considerada inédita no Espírito Santo. “Tivemos algumas experiências em vários municípios, mas pontuais, que duraram um ano, dois… foram bem pontuais. Agora retomamos esse trabalho, mas a longo prazo”, explica Douglas Fernandez, militante e técnico extensionista do MPA.

O foco, diz, é na produção de sementes crioulas – genuínas e com genética livre dos transgênicos – e no fortalecimento dos canais de comercialização na Grande Vitória, “para o povo trabalhador, nas periferias de Vitória”, conta. “Surge como demanda nesse período de seca, muitas famílias perderam muitas sementes”, lamenta Douglas.

O espaço também será utilizado para a formação política dos militantes. “A formação política tem que ser constante, o Movimento sempre fez. Mas na conjuntura atual, é ainda mais necessário”, contextualiza Genques Borcarte Strelhow, membro da coordenação estadual do MPA e um dos participantes do grupo do Córrego do Espinho, referindo-se à perda de direitos, ao congelamento dos gastos públicos e outros ataques aos trabalhadores.

A união dos camponeses é uma questão de sobrevivência, destaca Genques, principalmente no período atual, onde a difícil conjuntura nacional se torna ainda mais cruel em nível estadual. “Nós temos uma situação no Espírito Santo bem particular”, pondera. A seca extrema dos últimos três anos levou os agricultores familiares a uma situação de dívida insustentável, mas, mesmo com toda a reivindicação feita às instituições– bancos públicas e governos estadual e federal –, nenhum apoio efetivo foi obtido.

“Alguns poucos deputados levantaram a bandeira para discutir, mas foi pouca coisa. A instituição do Estado Brasileiro não contribuiu em nada com os camponeses do Espírito Santo. Estamos resistindo e construindo outras formas. Não é suficiente, precisa da contrapartida dos governos estadual e federal pra fortalecer a produção de alimentos”, afirma.

Na unidade produtiva coletiva, os camponeses se encontram quinzenalmente e decidem tudo coletivamente: o que plantar, onde e como. “As famílias precisam deixar seu trabalho individual pra fazer o coletivo. Tem sido um desafio, mas tem dado muito certo”, relata o coordenador do MPA, avaliando esses primeiros oito meses de trabalho.

“Dialogamos sobre a nossa proposta de produzir alimento para a classe trabalhadora e sobre a aliança campo-cidade. A intenção da roça é fortalecer a comercialização que o MPA tem feito na Grande Vitória nos bairros de periferia. A nossa tarefa de levar alimento pro trabalhador”, reafirma Genques.

Mais Lidas