Novo plano visa adequar zoneamento ao projeto de concessão do governo do Estado
O novo plano de manejo do Parque Estadual Paulo César Vinha, em Guarapari, discutido em reunião realizada no último dia 6, com a presença de conselheiros, ambientalistas e representantes da comunidade, gerou oposição do colegiado e participantes da sociedade civil, diante da redefinição das zonas de proteção e da ampliação de áreas para atividades turísticas. Desde então, conselheiros têm cobrado, sem êxito, transparência no processo e solicitado os documentos técnicos que embasaram as propostas de alteração.
Os representantes da sociedade civil argumentam que, sem os estudos detalhados e a documentação técnica, é impossível avaliar adequadamente os impactos. Em um ofício enviado ao gerente do parque, Georges Mitrogiannis da Costa, o o representante das associações de moradores no Conselho Gestor do Parque Paulo César Vinha, Lúcio Lopes, ressaltou: “Considerando que não é possível emitir nenhum parecer como conselheiro sobre as propostas apresentadas para revisão do Plano de Manejo sem os devidos estudos de fundamentação, solicitamos a documentação necessária para a análise detalhada das alterações propostas”.
O conselheiro também destacou que a ata da reunião não inclui as falas contrárias às propostas de alteração do zoneamento e solicitou que o documento seja modificado, para refletir corretamente essas manifestações. Os conselheiros aguardam o envio da nova proposta e terão 15 dias, após o recebimento do documento, para avaliações e manifestações.
“As mudanças no manejo são um equívoco. Nós temos que continuar lutando para fazer com que o governador [Renato Casagrande] veja isso, ouça a comunidade, a sociedade organizada e os técnicos não governamentais que se preocupam com o meio ambiente”, ressaltou.
Para Lúcio Lopes, as novas propostas do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) têm relação direta com o Programa Estadual de Desenvolvimento Sustentável das Unidades de Conservação (Peduc), instituído pelo Decreto nº 5409-R, que estabelece a exploração econômica de seis parques estaduais, incluindo o Paulo César Vinha, por meio de uma concessão de 35 anos ao setor empresarial.
O programa coordenado pela Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama) tem gerado oposição de comunidades locais, ambientalistas e organizações da sociedade civil, que criticam a falta de transparência e os impactos socioambientais provocados pelos empreendimentos turísticos previstos para áreas protegidas, como tirolesas, teleféricos, restaurantes, hospedagens e estacionamentos para centenas de veículos.
As modelagens econômicas e propostas de concessão foram desenvolvidas pela multinacional Ernst & Young, contratada por R$ 8,6 milhões sem licitação. A consultora, segundo críticos, não possui expertise na área ecológica e propôs megaprojetos de infraestrutura que já foram divulgados publicamente antes de qualquer consulta às comunidades ou ao conselho gestor.
Impactos agravados
Com apenas 1,5 mil hectares de extensão, o Parque Estadual Paulo César Vinha é uma das principais áreas de conservação de restinga no Espírito Santo. O conselho denunciou que as mudanças no zoneamento foram desenhadas para adaptar o parque às demandas de exploração econômica, sem respeitar o objetivo primário da unidade de conservação, a preservação da biodiversidade.
As mudanças incluem a criação de cinco zonas de uso antrópico dentro do parque, mas os conselheiros ressaltam que as novas zonas de impacto ambiental, onde seria permitido o aumento de antropização e o fluxo excessivo de veículos, agravaria a degradação do ecossistema, que sofre com queimadas, caça ilegal, furto de areia e outras atividades predatórias, aponta o representante do conselho. “Essas áreas precisam ser recuperadas, e não destinadas a usos que intensifiquem ainda mais o impacto ambiental,” argumentou.
Neste ano, o Parque Estadual Paulo César Vinha enfrentou um dos maiores desafios de sua história recente, com um incêndio que se estendeu por 34 dias, entre 22 de setembro e 26 de outubro. As áreas afetadas somaram 555 hectares, representando 37% da extensão total do parque. Este foi o segundo maior incêndio em termos de área atingida, ficando atrás apenas do registrado em 2014.
A reivindicação sobre a revisão do plano de manejo do Parque Estadual Paulo César Vinha também se estende à Área de Proteção Ambiental (APA) que envolve a unidade. Os conselheiros destacam a necessidade de realizar um plano de manejo para esta zona de proteção para conter atividades ilegais e garantir a proteção adequada do território, onde muitos empreendimentos não autorizados continuam sendo realizados por invasores que destroem áreas sensíveis e lançam resíduos nos rios da região, afirma Lúcio Lopes. Ele destaca que a falta de fiscalização efetiva pelo Estado tem permitido essa expansão irregular, especialmente no setor imobiliário, o que agrava ainda mais os impactos ambientais.
Resistência
Além do Paulo César Vinha (PEPCV), o programa do governo do Estado inclui o Parque Estadual de Itaúnas, em Conceição da Barra, norte do Estado; o Parque Estadual Cachoeira da Fumaça (PECF), em Alegre, e Forno Grande (PEFG) e Mata das Flores (PEMF), em Castelo, no sul do Estado; e Pedra Azul (Pepaz), em Domingos Martins, na região serrana. Um leilão para a concessão dessas unidades está previsto para o primeiro semestre de 2025.
No César Vinha, as intervenções são divididas em duas zonas. O primeiro núcleo abrange a portaria principal, a Lagoa de Caraís (também conhecida como Lagoa da Coca Cola) e o Mirante do Alagado, enquanto o segundo envolve o acesso secundário ao parque, além da Lagoa Feia e das áreas alagadas. Entre as novas infraestruturas estão um teleférico, tirolesa, 28 hospedagens tipo glampings e bangalôs, piscina, decks flutuantes, restaurante em rocha, trilhas suspensas e uma torre de tirolesa.
As mudanças previstas na unidade batizada em homenagem ao ecologista Paulo César Vinha, assassinado em 1993 no local por contrabandistas, enquanto registrava uma extração ilegal de areia na reserva, são criticadas por desrespeitarem seu legado de luta e proteção ambiental.
Em Itaúnas, o plano de intervenção abrange cinco polos. O primeiro, próximo ao Hotel Barramar, contará com duas pousadas de 15 quartos, um restaurante e estacionamento para 200 veículos. O segundo envolve a antiga foz do Rio Itaúnas, onde as mesmas estruturas serão replicadas e conectadas por trilhas suspensas. A sede do parque será reformulada, incluindo escritórios, alojamento para 16 pessoas, um centro de visitantes, memorial sobre a vila soterrada, cafés, lojas e até uma tirolesa. O projeto também prevê modificações no Polo da Trilha dos Pescadores e na Praia do Riacho Doce.
O projeto provocou uma forte resistência da população local da vila, que reivindica um modelo de gestão popular que respeite a função primordial da Unidade de Conservação. Eles temem que o modelo de exploração turística estabelecido pelo Peduc possa comprometer suas fontes de renda e alterar o equilíbrio entre preservação ambiental e sustentabilidade local.