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‘O lucro é a vida’, afirma proprietária de RPPN em Marechal Floriano

“A preservação do meio ambiente é que traz o lucro, o lucro é a vida. Há um entendimento muito errôneo com relação ao que é lucro e sucesso. Sucesso é uma cidade com oxigênio pra respirar, é ter mata, ter floresta, ter oxigênio, ter água, ter alimentos saudáveis”. 

A afirmação, aparentemente ingênua e utópica, é da ambientalista e escritora Renata Bomfim, proprietária da Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Reluz, em Marechal Floriano, na região sudoeste serrana capixaba, que tem se tornado cada vez mais um polo de educação ambiental, por meio de ações práticas, como meliponário e viveiro de soltura de animais, além de palestras em escolas e outras instituições e campanhas contra atropelamento de animais silvestres nas estradas. 

“Seria muito bom a chegada do eucalipto acompanhada de uma preocupação ambiental real e não apenas ampliação da monocultura. Que o lucro fosse uma consequência de um negócio”, provoca, levantando um alerta de preocupação com relação à instalação de uma fábrica de papel higiênico em Cachoeiro de Itapemirim, na região central sul do Espírito Santo, e o investimento anunciado, pela Suzano (ex-Aracruz Celulose, ex-Fibria), de meio milhão de reais para ampliar os monocultivos de eucalipto no Estado. 

“É preciso investir em economia criativa, produção de alimentos saudáveis, recuperação do solo, das matas, dos rios” convoca. “Ninguém faz turismo em plantação de eucalipto”, ironiza. 

O montante total previsto pela multinacional para aplicação no Espírito Santo é de R$ 930 milhões, sendo R$ 130 milhões para a implantação da fábrica no distrito de Safra, investimento que irá gerar, segundo a própria papeleira, 87 empregos diretos e cerca de 200 diretos e indiretos, “considerando toda a cadeia de negócios movimentada pela atividade”. Numa conta simples, tem-se a média de R$ 650 mil por emprego direto e indireto. 

“Acredito que é emergencial um despertamento da sociedade para a questão ambiental. Há doze anos não via o braço Sul do Rio Jucu subir tanto, de forma que nem pudemos atravessar a estrada para chegar à reserva”, relata, referindo-se às enchentes de janeiro último. 

“Assistimos as catástrofes acontecerem e é preciso que as pessoas se perguntem o porquê”, provoca, citando “as construções irregulares à beira dos rios, as represas que estrangulam o fluxo das águas e rompem ou ameaçam romper durante as enchentes, o desmatamento que empobrece a biodiversidade e resulta no assoreamento dos leitos, a monocultura que contribui enormemente para o desequilíbrio natural e desconecta os fragmentos de floresta tão necessários para os animais silvestres”. “Enfim, esses são apenas alguns motivos das tragédias cotidianas e todos elas nos dizem respeito. “É preciso um pacto social em torno da questão ambiental”, roga. 

Os monocultivos de eucalipto e café são os mais agressivos na região da RPPN, observa Renata. Fragilizam o solo, empobrecem a biodiversidade, assoreiam os rios, contaminam as águas e todo o ambiente com agrotóxicos. 

Esta semana, conta a RPPNista, vários pássaros mortos foram encontrados na reserva. Dias após um grande sumiço das belas aves. “Acredito que esteja vinculado ao agrotóxico. Se não mudarmos esse cenário, teremos matas vazias e depois nem isso, porque sem os animais a floresta mingua”, adverte. 

Localizada no Braço Sul do Rio Jucu, que abastece a região metropolitana da Grande Vitória junto com o Rio Santa Maria, a RPPN Reluz tem o rio como uma das principais referências para preservação. Nesse sentido, ainda no contraponto à ampliação das monoculturas, Renata reafirma a necessidade de respeitar os limites do rio e restituir a mata ciliar. 

As boas práticas ambientais devem fazer parte do dia a dia até se tornarem rotina, preconiza a ambientalista e escritora. “O poder público deve fiscalizar e punir os infratores, mas deve também contribuir para que as pessoas tenham acesso ao conhecimento, fomentar a educação ambiental. Muitos infratores não têm consciência do poder devastador de seus atos e precisam de alternativas, por isso surge a criação de políticas públicas que incentivem produções e fazeres pautados na sustentabilidade. Precisa apoiar as iniciativas da sociedade civil, como as RPPNs, e parcerias sempre, pois os problemas ambientais são complexos e ninguém sozinho conseguirá dar conta deles na totalidade. Nesse caso vale a máxima: a união faz a força!”, argumenta.

Vizinho à Reluz, o proprietário rural Antonio Darcy Fim concorda com o discurso e a prática da RPPN. “Eu já tenho essa consciência, minha filha fez mestrado em Engenharia Ambiental. Preservamos a água. Nossa nascente estava definhada, mas aí plantei, deixei mata em volta, e ela voltou. Hoje é ela quem irriga nosso pomar e café, mas já chegou até a abastecer a casa”, conta, orgulhoso, ressaltando que, dos seis hectares da propriedade, 4,5 são dedicados à preservação ambiental. 

O rio Jucu também é motivo dos cuidados da família, que já plantou bambu nas margens e não constrói nem faz nenhum plantio comercial na área da mata ciliar. Sobre o Braço Sul do Rio Jucu, aliás, Antonio Fim também enfatiza sua subida extraordinária este ano, como consequência do mau uso do solo e um alerta pra mudanças necessárias. 

“O rio ficou muitos anos com um nível muito baixo. Ninguém nunca tinha visto o rio encher tanto em janeiro”, testemunha. “Estamos do lado direito. Do lado esquerdo, tem muita estrada, muito platô, muito loteamento. O rio nunca tinha subido tanto, tem gente mudando conceito e falando agora ‘não vou construir ali perto porque ele sobe’. Não se pode subestimar a força da natureza”, ensina. 

“Nós, da Reserva Ambiental Reluz, temos um sonho, não sei se viveremos para vê-lo realizado, mas, se preciso, morreremos lutando por ele. O nosso sonho é que nenhum pássaro viva aprisionado, que todos cantem em liberdade”, evoca Renata. 

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