Desmontes nas leis agravam crise no Estado, com impactos aos mais vulneráveis
Sucessivos desmontes nas políticas de proteção ambiental, com a aprovação do novo licenciamento apelidado de “Lei da Destruição” (Lei Complementar nº 1.073/2023), e o anúncio de medidas privatistas, como o Programa Estadual de Desenvolvimento Sustentável das Unidades de Conservação (PEDUC), agravam a crise registrada na área no Espírito Santo, como alertam organizações articuladas no Observatório Capixaba das Águas e do Meio Ambiente.
“Não estamos no mesmo barco”, afirma a diretora financeira do Sindicato dos Trabalhadores de Água, Esgoto e Meio Ambiente (Sindaema) e secretária de Meio Ambiente da Central Única dos Trabalhadores do Espírito Santo (CUT-ES) Wanusa Santos Corrêa, ao destacar os processos de exclusão e impactos gerados pela degradação sobre as populações mais vulneráveis.
O cenário preocupante foi um dos temas prioritários do seminário de lançamento da rede na última sexta-feira (20), na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), criada para atuar na construção de um plano de atuação conjunta diante do agravamento da crise provocada pelas atividades econômicas destrutivas.
Para o professor de ciência política, coordenador do Instituto Mais Democracia e membro da Rede de Vigilância Popular em Saneamento e Saúde do Rio de Janeiro, João Roberto Lopes, “o Estado está capturado pelo poder corporativo e a agressividade da lógica financeira incide no território sobre a vida das pessoas mais vulneráveis, com abusos dos mais diferentes e violações aos direitos humanos”.
Ele ressaltou as lutas populares em defesa dos recursos hídricos e destacou o avanço da privatização de serviços essenciais no Brasil, onde cinco corporações controlam 80% do mercado privado de saneamento.
O problema da água também foi reforçado pela coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens (Mab), Juliana Nicoli, ao citar a falta de acesso como um dos gargalos no processo de reparação das pessoas atingidas pelo crime socioambiental da Samarco/Vale-BHP, decorrente do rompimento da barragem de Mariana (MG), em 2015.
“Somos atingidos não apenas pelos desastres específicos, mas pelo modelo capitalista como um todo. No Espírito Santo, enfrentamos os impactos do pó de minério causado pela Vale na região metropolitana, a monocultura da Suzano, e as tentativas de privatização da água e do saneamento. Além disso, como em todo o Brasil, somos afetados pelo modelo energético, pagando uma das tarifas de energia mais caras do mundo, apesar de ser majoritariamente produzida por uma fonte barata”, considera.
Dados da Comissão Pastoral da Terra mostram que os conflitos por água crescem em todo Brasil, inclusive no Espírito Santo. Enquanto empresas de celulose crescem em um ritmo acelerado a partir do mercado de carbono, em aliança com o setor fóssil, populações tradicionais do Espírito Santo sofrem a insegurança hídrica e alimentar devido à desertificação dos solos provocada pelos monocultivos de eucalipto.
A educadora da Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional no Espírito Santo (Fase/ES), Daniela Meirelles, aponta que a Suzano é a empresa com mais outorgas para utilização de recurso hídricos no Brasil, um país onde 50 empresas consomem a mesma quantidade que metade da população, como revelou levantamento realizado pela Agência Pública em 2023.
“O que nos unifica é a ação das corporações que consomem e poluem nossas águas, então é importante que olhemos para essas empresas e conflitos, estamos vivendo um momento de emergência climática, sentindo na pele os efeitos de eventos extremos cada vez mais frequentes e com mais intensidade”, convocou.
Agenda ambiental
O Observatório Capixaba das Águas e do Meio Ambiente iniciou a construção de um calendário de ações para subsidiar e fortalecer a resistência diante dos problemas. Foram definidas, inicialmente, duas datas de lutas, o mês de junho, marcado pelo Dia Mundial do Meio Ambiente, e setembro, quando se comemora o Dia da Árvore, no Brasil, e o Dia Internacional de Luta Contra os Monocultivos de Árvores. O grupo se reunirá novamente em novembro, para avançar a atuação e engajamento com a sociedade em defesa do meio ambiente.
Além do Sindaema, do MAB e da Fase, o Observatório Capixaba da Água e do Meio Ambiente reúne o Sindicato dos Petroleiros do Espírito Santo (Sindipetro), Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos (Sindipublicos), Associação de Juízas e Juízes pela Democracia (AJD), e os laboratórios Ambiente, Trabalho e Técnica (Labatt) e de estudos urbano-regionais, das paisagens e dos territórios (Laburp), da Ufes.