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Ocupação em São Mateus marca jornada nacional de luta pela reforma agrária

Cerca de 250 famílias ocupam a Fazenda Coqueirinho e reivindicam assentamento das 1,6 mil acampadas no Estado

Mariana Motta/MST

A ocupação da Fazenda Coqueirinho, em São Mateus, norte do Estado, iniciada na madrugada desta quarta-feira (17), marca a participação do Espírito Santo na Jornada Nacional de Luta pela Reforma Agrária, realizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ao longo desta semana.

A jornada acontece todos os anos, em memória ao Massacre de Eldorado dos Carajás, em 17 de abril de 1996, com o assassinato de 21 trabalhadores sem terra. Neste ano, o MST traz o lema “Ocupar para o Brasil alimentar”, para apresentar a reforma agrária como alternativa urgente e necessária para a produção de alimentos saudáveis para a população do campo e da cidade, com o objetivo de combater a fome, gerar emprego e avançar no desenvolvimento do país. A Jornada vai até sexta-feira (19), com um conjunto de ações em todas as regiões do País, marcando também os 40 anos de história do MST no Brasil e 39 no Espírito Santo.

Em São Mateus, a ocupação Coqueirinho conta com cerca de 250 famílias, subindo para 1,6 mil o número total que aguarda a reforma agrária no Estado, em diversos municípios de norte a sul.

Sergio Cardoso_ArCo

A fazenda está às margens da BR-381 e tem 294 hectares, sendo 28 identificados como área devoluta (patrimonial) do governo do Estado. Segundo o MST, a Fazenda já foi sede de uma antiga fábrica de farinha de mandioca chamada Inquinor e a área está na Justiça Federal por conta do não cumprimento de direitos trabalhistas. 

“É uma área muito boa para a reforma agrária, vai da rodovia até o rio São Mateus, tem água. E tem problema com o governo federal, questões trabalhistas, então está dentro dos critérios que o presidente Lula definiu, que o governo tem interesse em arrecadar para a reforma agrária”, explica Carolino da Silva, membro da direção nacional do MST no Espírito Santo.

Sergio Cardoso/ArCo

Essa mesma fazenda já havia sido ocupada em 2002 pelo MST, quando ela era de propriedade do ex-prefeito Rui Baromeu. “Agora parece que pertence ao pessoal da Alcon [Companhia de Álcool Conceição da Barra] ou da família Donati [também ex-prefeito Jorge Donati, falecido em 2016]. Pedimos para o Incra averiguar tudo isso”.

A expectativa de retomar os projetos de reforma agrária se mantém, passado quase um ano e meio do terceiro mandato do presidente Lula. “O orçamento é muito ruim, péssimo. Era de R$ 200 milhões para obtenção de terras. Daí, passou pra 300, agora está em R$ 500 milhões”. Mas a demanda para assentar todas as mais de 105 mil famílias acampadas no País e cumprir a meta assumida até 2026, ressalta, é de R$ 3,8 bilhões. E é uma meta que cresce continuamente. No Espírito Santo, exemplifica, eram 1,4 mil no início do ano e agora já são 1,6 mil. Ao longo dessas quatro décadas de luta, cerca de três mil famílias foram assentadas no Estado.

Sergio Cardoso/ArCo

Diálogo e pressão

“Nós estamos dialogando e pressionando, é um governo de disputa, de frente amplíssima. A classe trabalhadora tem que ir para cima, porque o Lula, com esse Congresso que temos, vai ter muita dificuldade. Precisa mesmo pressionar. Todas as classes trabalhadoras. A gente fica feliz de ver o movimento das greves dos trabalhadores. Porque precisamos recuperar as conquistas que perdemos, tem um passivo histórico de seis, sete anos para resolver”, acrescenta o dirigente do MST.

Uma resposta do governo federal, salienta, foi o anúncio do Programa Terra da Gente, justamente nesta semana da Jornada Nacional. A iniciativa faz parte de uma nova estratégia para ampliar e dar agilidade à reforma agrária. A estratégia, conforme divulgou o próprio MST, é beneficiar 295 mil famílias agricultoras, em todo o país, até 2026.

Ceres Hadich, da coordenação nacional do MST, afirma que assentar “é mais que distribuir ou regularizar terras, é garantir o direito do acesso à terra e a todas as políticas públicas que permitam o pleno desenvolvimento das pessoas e das comunidades no campo”.

Carolino reforça: “nossas ações são para ajudar o governo a fazer o que o povo precisa. O governo Lula 3 não é o mesmo que o 1 e o 2, tem muito mais dificuldade. Se a gente tiver a postura de romper com ele, é tudo o que a extrema direita quer. Nós precisamos cobrar, mas de um jeito que resulte em resultados concretos para a classe trabalhadora. Nem com o governo Casagrande a gente deixa de dialogar! Em todo governo, precisa fazer pressão, quando tem uma frente ampla dessa, então”.

Sérgio Cardoso/ArCo

Suzano

O dirigente capixaba lembra ainda que, neste 17 de abril, completa um ano da ocupação de uma área de monocultivos de eucalipto da Suzano em Aracruz, norte do Estado. Foi uma das duas ocupações que tiveram mais repercussão em 2023, ao lado da Embrapa de Pernambuco. Após dez dias de mobilização, os trabalhadores realizaram um ato político marcando a transferência das famílias para uma área próxima, no Assentamento Nova Esperança, devido a uma liminar de reintegração de posse obtida pela multinacional junto à Justiça estadual.

“Depois que a gente saiu, é que descobriu porque tanta pressão, porque o governo do Estado ficou tão incomodado com aquele acampamento. Ele doou oito mil hectares de terra ali naquela fazenda para a Aracruz Celulose, na década de 1980. Era terra devoluta e ele doou para a empresa”, informa.

Nesse um ano, as famílias continuam aguardando a reforma agrária. “Com a Suzano não tem diálogo, conversamos com o Incra, que parece ter uma proposta, pelo GT de Conflitos, do governo federal. Nós estamos aguardando o resultado dessa negociação. Com essa empresa, só mesmo no conflito para avançar. Ela financia todos os governos, consegue todas as licenças, todas as liminares na justiça”, contextualiza, reafirmando o que já é de conhecimento dos movimentos sociais do campo: a Suzano é a maior inimiga da reforma agrária.

Coletivo Comunicação MST/ES

Esse conluio dos governos se faz presente também na proteção que a empresa tem da Polícia Militar nos estados onde atua. Na Jornada Nacional deste ano, o MST identificou conflitos com a PM em São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Distrito Federal. No Espírito Santo, uma viatura da PM ficou em frente à Fazenda Coqueirinho durante toda a noite. Mas em Mimoso do Sul, em março, a violência foi evidente.

“No geral, a polícia tem cumprido o papel de proteger as grilagens da Suzano. Em Mimoso do Sul, mandaram a Força Tática em um acampamento na estrada. Atendendo ao pessoal do Invasão Zero, que é comandado pelo Evair de Melo [deputado federal do PP, acusado de receber financiamento de campanha de invasores de terras indígenas]. Em Aracruz, ainda hoje, passado um ano do início da mobilização, Carolino conta que a PM faz presença constante em frente ao acampamento.

Mobilização nacional

Até o momento, segundo o MST, a Jornada Nacional contabiliza a realização de 30 ações diversas, em 14 estados do país, mobilizando mais de 20 mil famílias. Desse total, o MST realizou 24 ocupações de terra em 11 estados.

As ocupações de terra enfatizam a importância da reforma agrária como alternativa urgente e necessária para a produção de alimentos saudáveis no Brasil, tendo como foco a erradicação da fome no campo e na cidade, garantindo o desenvolvimento do país, no contexto agrário, social, econômico e político. 

O orçamento voltado para a obtenção de terra e direitos básicos no campo, como infraestrutura, crédito para produção e moradia, é por dois anos consecutivos, o menor dos últimos 20 anos.

“Lutamos, porque 105 mil famílias estão acampadas e exigimos que o Governo Federal cumpra o artigo 184 da Constituição Federal, desaproprie latifúndios improdutivos e democratize o acesso à terra, assentando todos e todas que querem trabalhar e produzir alimentos para o povo”. E continua o documento: “lutamos pela reforma agrária para que a terra cumpra sua função social: produzir alimentos saudáveis para o povo brasileiro e cuidar da natureza.”

Sergio Cardoso/ArCo

Carta Aberta

Na Carta ao Povo Brasileiro, lançada nessa segunda-feira (15), o movimento expõe a importância da reforma agrária para o desenvolvimento do país. 

“O agronegócio não pode, não consegue e não quer produzir alimentos saudáveis, pois alimentar verdadeiramente o povo não cabe no seu projeto. Recebe subsídios vultuosos do Estado brasileiro e do capital internacional, concentra riqueza e segue destruindo e desmatando a floresta e os biomas, como o Pampa, a Amazônia e o Cerrado, avançando violentamente sobre as águas e territórios estratégicos para espólio da natureza, para o avanço da monocultura para exportação.

Seu rastro é de veneno, poluição, desertificação, endividamento, destruição e morte, porque é o agronegócio que financia garimpeiros ilegais, grileiros e pistoleiros que ameaçam terras e povos indígenas, quilombolas e assentamentos. Assim como em Eldorado do Carajás, a força das armas estatais e paramilitares, como a milícia ‘Invasão Zero’, são a resposta do latifúndio contra a Constituição Federal de 1988 e o direito de organização dos povos para produzir alimentos e democratizar a terra”, denunciam.

“Portanto, ao povo brasileiro, dizemos: nós lutamos, mas também cantamos para enfrentar o horror dos massacres. O horror da fome, da expropriação e o silêncio do Estado diante da morte organizada contra os povos em luta. Nós cantamos porque sonhamos e seguimos para que, como diz a poesia, o amanhecer nos encontre sorridentes, festejando a nossa liberdade. Liberdade essa que só será possível quando todo povo sem terra alcançar plenamente seus objetivos de lutar pela terra, conquistar a reforma agrária popular e contribuir para a construção de uma sociedade justa”.


Suzano é a maior inimiga da reforma agrária no Estado, avalia MST

Seguindo direção nacional, ocupações de terra serão retomadas se não houver solução emergencial para famílias acampadas


https://www.seculodiario.com.br/meio-ambiente/suzano-e-a-maior-inimiga-da-reforma-agraria-no-es-avalia-mst

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