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ONG denuncia intervenção em área não autorizada no Morro de Guaibura

Gaya Religare afirma que condomínio Manami realiza desmatamento além do permitido por licenças

A construção do condomínio de luxo Manami Ocean Living no Morro de Guaibura, na região da Enseada Azul, em Guarapari, tem ultrapassado a área permitida nas licenças de instalação. A denúncia é da Organização Não Governamental (ONG) Gaya Religare, que aponta para o desmatamento irregular promovido pelo condomínio, de responsabilidade da empresa Design 16.

De acordo com a ONG, a região de mangue do morro foi cercada de forma irregular, e também houve poda de árvores usadas pelos pássaros para fazerem seus ninhos – impactando, inclusive, uma espécie ameaçada de extinção no Espírito Santo, a “Mimus gilvus”. Foi feita, ainda, a construção de um muro na areia da praia.

Nessa sexta-feira (29), em pleno feriado de Semana, a empresa responsável pela obra iniciou a retirada de terra para terraplanagem no topo do morro, conforme registros feitos por moradores. Durante a semana, o maquinário já havia sido colocado no espaço, indicando o início da intervenção.

“Existem centenas de aves desabrigadas, empoleiradas nos fios dos postes e nas casas do entorno. Não há nenhum resgate de fauna. Vimos passarinhos e saguis da cara branca falecidos. E o morro está cercado, estão impedindo 90% das práticas culturais da comunidade”, relata Juliana Souza, da Gaya Religare.

No último dia 20 de março, a ONG encaminhou uma denúncia ao Ministério Público Federal (MPF), na qual argumenta que foi descumprido o Termo de Adesão da Prefeitura de Guarapari junto à União para a transferência da gestão das praias marítimas urbanas.

Gaya Religare

Entre os pontos do termo de adesão estão: “estabelecer condições para uma melhor gestão dos espaços litorâneos”; “garantir que as praias e outros bens de uso comum do povo (…) cumpram sua função socioambiental”; e “promover o correto uso e ocupação das praias, garantindo o livre e franco acesso a elas e ao mar”.

“Tal denúncia expõe claro desrespeito por parte da Prefeitura de Guarapari a tal Termo de Adesão, além de descumprimento da legislação ambiental com a severa e iminente retirada de um ecossistema de extrema fragilidade, sem possibilidade de reversão do dano (manguezal). Para além disso, a prefeitura, em proveito da confiança transferida pela União, em seus atos administrativos ultrapassa a omissão, promovendo e encorajando a ocupação desordenada, ignorando e agredindo nosso povo, que em uma longa luta para sobrevivência manteve o Morro da Guaibura”, diz a denúncia.

“Os efeitos deletérios aos aspectos paisagísticos, ambientais e urbanísticos por um condomínio em construção sobre um costão rochoso podem ser tratados como uma aberração na gestão pública, se não um ato criminoso”, continua o texto.

A denúncia ressalta ainda que, apesar das licenças dadas pela Prefeitura de Guarapari e pelo Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf-ES), existe um estudo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e manifestação do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) contrários às intervenções.

Denúncias e processo

Desde o segundo semestre do ano passado, a Gaya Religare já realizou dezenas de denúncias sobre a situação. Segundo Juliana Souza, houve uma agenda na semana passada na Assembleia Legislativa com assessores dos parlamentares do Partido dos Trabalhadores (PT), incluindo o senador Fabiano Contarato; os deputados federais Jack Rocha e Helder Salomão; e os deputados estaduais João Coser e Iriny Lopes.

Um dos pontos abordados foi o questionamento da constitucionalidade da Portaria 011-R de 2016, da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama) e do Iema, que derrubou o tombamento da Mata Atlântica que havia sido feito pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC).

Também na semana passada, houve uma visita técnica de uma equipe da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) ao Morro de Guaibura. Durante o ano de 2023, a Gaya Religare realizou um estudo das origens ancestrais da comunidade, que está há mais de cem anos fixada na península de Guaibura. Baseada na pesquisa, a ONG solicitou à Funai e ao Ministério dos Povos Indígenas (MPI) um estudo antropológico e o reconhecimento da comunidade Borum M’nhag Uipe.

Com base na visita, a Funai também deverá se manifestar dentro do processo relativo à ação civil pública movida pela Gaya Religare na Justiça Estadual para barrar a construção do Manami. Em sua manifestação, a Procuradoria-Geral do Município de Guarapari alegou que a licença dada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Agricultura (Semag) foi condicionada à não intervenção em área de mangue, junto à autorização do Idaf-ES e adoção de “medidas mitigadoras”.

A Design 16, por sua vez, argumentou que apenas uma pequena parte do Morro de Guaibura delimitada pelo Idaf corresponde à Área de Preservação Permanente (APP), com restinga e manguezal – o que é contestado pela Gaya Religare. Já o promotor de Justiça Otávio Guimarães de Freitas Gazir acusou a Gaya Religare de produzir “factoides” e de tentar instrumentalizar a Justiça.

Não há desmatamento’

Procurada, a Secretaria de Meio Ambiente e Agricultura(Semag) de Guarapari defendeu, em nota, que “não há desmatamento. O empreendimento possui todas as licenças e as fiscalizações têm sido constantes no mesmo. A supressão florestal está regular, perante o órgão competente, que neste caso é o Idaf”.

Entretanto, a prefeitura não respondeu ao questionamento sobre a restrição de acesso imposta aos moradores da região.

Século Diário também tentou contato com o MPF e a empresa Design 16, mas não teve sucesso.

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