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ONG move ação civil pública contra Arcelor por contaminação hídrica

Poluição na Serra e no rio Santa Maria, aponta a Juntos-SOS, é causada por Revsol

A Organização Não Governamental (ONG) Juntos SOS Ambiental deu entrada em uma Ação Civil Pública (ACP) na Vara da Fazenda Pública Municipal da Serra contra a ArcelorMittal Tubarão. A entidade requer a condenação da empresa ao pagamento de indenização por dano ambiental e danos morais coletivos no valor de R$ 100 milhões, em virtude da poluição hídrica no Rio Santa Maria e no município da Serra, onde apareceram animais mortos no ponto de chegada das lagoas Juara e Jacuné na praia de Jacaraípe. Esses impactos, aponta a ACP, foram causados pela utilização de Revsol, utilizado no Programa Novos Caminhos.

Reprodução

Também é reivindicado que a empresa suspenda, de maneira imediata, “a comercialização e fornecimento de escórias siderúrgicas para quaisquer finalidades, até que comprove que os produtos não são responsáveis pela morte de animais no Rio Santa Maria da Vitória, pela contaminação de peixes e animais no Rio Bubu em Cariacica e espelhos d’água, bem como demonstrar cabalmente a sua segurança e prestar as informações imprescindíveis aos consumidores e à sociedade, sob pena de multa diária de R$ 1 milhão”.

Além disso, a ONG defende que a ArcelorMittal seja obrigada a “custear estudos aprofundados para caracterização das escórias siderúrgicas de acordo com o processo de produção, bem como dos insumos utilizados no processo, e ainda acerca do preparo e tratamento, com vistas à redução dos riscos à saúde pública e ao meio ambiente, a ser realizado por entidade isenta, de confiança deste Juízo”.

Requer, ainda, que siderúrgica seja condenada a reparar “os danos ambientais causados pelos seus produtos, ordenando-se sua retirada dos locais onde causem danos ou coloquem em risco o meio ambiente a saúde pública, restaurando as vias e locais, onde se fizer necessário”.

No que diz respeito ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), a ação solicita que o órgão apresente cópia integral dos processos de licenças ambientais concedida à Arcelor para o fornecimento e comercialização dos seus produtos derivados de escórias. E, ainda, que seja feita à Universidade Federal do Estado do Espírito Santo (Ufes) solicitação de fornecimento dos estudos que possuírem sobre o “impacto da água percolada no solo e lençol freático, após passar pelas pilhas de escória produzidas pela ré e centros de distribuição dos produtos”.

Conforme destaca a ação, o Revsol é um produto feito pela empresa com o material que sobra da fabricação de produtos siderúrgicos e que precisa ser descartado. Foi criado pelo fato de essas sobras serem lesivas ao meio ambiente e tem sido utilizado para revestimento primário de vias, pátios e aterros. Essa utilização se dá, conforme consta no documento, por meio do Programa Novos Caminhos, que estabelece uma cooperação entre a ArcelorMittal e o poder público, na qual o Revsol é utilizado para revestimento primário em ruas e estradas não pavimentadas.

A Juntos-SOS destaca que o principal município beneficiado pelo Revsol foi Santa Maria de Jetibá, na região serrana, onde nasce o rio Santa Maria, que banha também os municípios de Santa Leopoldina, na região serrana, e Cariacica, Serra e Vitória, na região metropolitana. “O rio Santa Maria da Vitória nasce em Santa Maria de Jetibá e deságua na baía de Vitória, percorrendo 122 quilômetros. É um dos principais mananciais do Espírito Santo, juntamente com o Rio Jucu, sendo responsável pelo abastecimento de água da Grande Vitória e da parte continental da capital”, diz a ACP.

A Juntos denuncia que o Revsol tem contaminado o rio, sendo responsável ou corresponsável “por enorme mortandade dos peixes e colocando em risco a saúde pública”. Também destaca matéria publicada por Século Diário na qual é relatado que pescadores de Jacaraípe, na Serra, foram surpreendidos com animais mortos nas proximidades da praça Encontro das Águas, como peixes, siris e tartarugas. “Os animais apareceram boiando nas águas que vêm das lagoas Juara e Jacuné e seguem rumo ao mar. Além disso, as águas estavam verdes e com mau cheiro, cujas suspeitas da contaminação das águas recaem sobre a construção de um condomínio próximo à lagoa Juara e pela utilização do coproduto Revsol em vias vicinais no munício da Serra”, descreve o documento.

Também é mencionado que uma matéria jornalística de abril de 2017, cujo veículo de comunicação não foi citado, sobre a suspensão temporária pelo Iema do uso de escória da ArcelorMittal para aterrar os alagados do Mestre Álvaro, para que fossem avaliados os riscos do uso do resíduo da produção de aço em áreas alagadas, cujas águas descem para os manguezais do Lameirão, na baía de Vitória, pelos rios Santa Maria e Canal dos Escravos. “Não há dúvidas de que os produtos são lesivos ao meio ambiente. As dúvidas que existem são quanto à extensão dos danos causados, ou que possam a vir ser causados pelos produtos”, aponta.

A entidade informa no documento que solicitou  ao Iema cópia integral do processo administrativo que concedeu licença para a empresa ArcelorMittal produzir, comercializar, estocar e os ensaios práticos de impactos ambientais do Revsol. “De qualquer forma, não poderia a ré colocar seus produtos no mercado sem que fosse, previamente, verificada a sua segurança, como determina o Código de Defesa do Consumidor, bem como informados os consumidores dos seus riscos e com informações a respeito dos cuidados no seu uso”, diz a ACP.

Pedido negado

A Juntos- SOS chegou a encaminhar notícia de fato para a ArcelorMittal, requerendo o financiamento de um projeto de pesquisa e extensão, com o objetivo de mensurar os impactos dos produtos Revsol com amostras fornecidas pela ArcelorMittal e também coletadas no aterro das margens do rio Santa Maria da Vitória. Contudo, a empresa se recusou, alegando que “já possui compromissos estabelecidos com diversas instituições relacionadas ao tema”.

A Arcelor diz, ainda, que a “suposta contaminação” nos espelhos d’água da Região Metropolitana da Grande Vitória, iniciada em agosto último, “não tem relação com a empresa”, tendo sido isso esclarecido “pelos próprios pescadores em razão da denúncia infundada feita na ocasião”. Contudo, a Juntos contesta essa afirmação. “Isso é de desconhecimento total nosso. Não vimos nada, nenhuma documentação que os pescadores assim afirmaram”, diz o presidente da entidade, Eraylton Moreschi.

No próprio documento enviado para a Arcelor solicitando a pesquisa, é relatado que esses trabalhadores coletaram amostras do material do aterro, colocaram junto a peixes da espécie tainha e, ao comparar com outros da mesma espécie que não tiveram contato com o material, percebeu-se que os que tiveram acesso ao produto químico morreram após 40 minutos. “Embora o teste não tenha sido realizado por pessoas certificadas e conforme protocolos específicos, este é um fato robusto que fundamenta o requerimento da Juntos à ArcelorMittal, de que custeie imediatamente testes oficiais para verificação do nexo de causalidade entre seus produtos e a morte de peixes”, cobrou a Juntos no ofício.

Providências

Não é a primeira vez que a Juntos-SOS faz cobranças às autoridades relacionadas à mortandade de peixes no Rio Santa Maria da Vitória e na baía de Vitória. A entidade já havia encaminhado ofícios ao Iema e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). No caso do Iema, indicou a necessidade de coletar amostras da água e fazer análises com base em uma série de substâncias – conforme especificação, segundo o ofício, do biólogo marinho e ictólogo Anderson Batista, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

A coleta foi feita pelo órgão estadual no dia 29 de agosto, mesmo dia de protocolo dos ofícios, após vistoria acompanhada de pescadores, quando também foram mapeados os locais onde houve maior registro de peixes mortos. Na ocasião, o Iema afirmou que foram verificadas as empresas da região, mas não foram encontrados indícios de contaminação, e que mediu ainda a oxigenação, a temperatura e a condutividade da água, que se encontram dentro da normalidade.

No dia 26 de agosto o Iema chegou a informar que não encontrou evidências de despejo de uma substância líquida no curso hídrico após um aterro com Revsol, que foi relatado por pescadores. O Instituto alegou que os vídeos dos pescadores eram datados de 21 de agosto. Entretanto, após protesto na Rodovia do Contorno sete dias depois, a autarquia realizou reunião na Ilha das Caieiras com os trabalhadores, da qual também participaram representantes da Prefeitura de Cariacica, da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e da Polícia Civil (PC).

A Juntos SOS também requereu a Luciano Bazoni Júnior, chefe da divisão técnico-ambiental do Ibama no Espírito Santo, “dar providências legais em acordo com o que está estabelecido nas ações supletivas de atribuições da entidade”, de forma a “fiscalizar, responsabilizar e cobrar os poluidores da baía de Vitória, Estação Ecológica do Lameirão e Rio Santa Maria da Vitória”.

Ações emergenciais

O presidente da Assembleia Legislativa, Marcelo Santos (Podemos), encaminhou ofício para o governador Renato Casagrande (PSB) solicitando que sejam adotadas, urgentemente, medidas que auxiliem os pescadores artesanais que estão impossibilitados de trabalhar há quase um mês, devido à contaminação dos peixes no Rio Santa Maria. O ofício foi encaminhado após uma manifestação desses trabalhadores, há uma semana, em frente à Casa de Leis, e que gerou reunião com Marcelo Santos e o presidente da Comissão de Meio Ambiente, Fabrício Gandini (PSD).

No ofício, o parlamentar afirma que 330 famílias de pescadores são prejudicadas pela impossibilidade de prosseguir na atividade pesqueira. Por isso, solicita implementação de um auxílio emergencial para as famílias afetadas, “visando mitigar os impactos econômicos imediatos e prevenir uma crise social mais profunda”.

Outras demandas são a realização de um estudo técnico e monitoramento ambiental da baía de Vitória, com o objetivo de identificar as fontes de poluição e propor soluções efetivas para a recuperação do ecossistema; e o desenvolvimento de um plano de ação para garantir a qualidade dos alimentos pescados na região e restaurar a confiança dos consumidores.

Gandini já havia feito uma indicação à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), para que conceda auxílio extraordinário aos pescadores que dependem exclusivamente da pesca artesanal. A proposta foi aprovada no dia 2 de setembro, mas ainda não há sinalização da pasta sobre o assunto. Os pescadores relatam que a situação das famílias é preocupante e de instabilidade financeira.

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