Eraylton Moreschi, da Juntos SOS ES Ambiental, aponta “lacunas legais” em projeto de lei aprovado na Assembleia
A Organização Não Governamental (ONG) Juntos SOS ES Ambiental quer que a Política Estadual de Qualidade do Ar, aprovada na semana passada na Assembleia Legislativa, seja declarada inconstitucional. Para a entidade, o Projeto de Lei 1.014/2023, de autoria do Governo do Estado, apresenta uma série de “lacunas legais”.
O posicionamento foi apresentado em ofício ao procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, assinado pelo presidente da ONG, Eraylton Moreschi, e encaminhado nessa sexta-feira (15). As críticas estão centradas, principalmente, no fato de o PL prever a compatibilidade das políticas de qualidade do ar com “desenvolvimento econômico”, “realidade nacional” e “peculiaridades locais”, sem apresentar de forma clara essas definições.
“Qual a definição, no contexto da lei, de realidade nacional? Qual realidade nacional? Da saúde? Do meio ambiente? Dos gastos públicos com atendimentos do SUS para doenças da poluição? Dos gastos públicos com morbidade? Quais os critérios a serem utilizados para definir a realidade nacional? Quem terá a responsabilidade de definir realidade nacional? Qual a definição de peculiaridades locais? Quais os critérios a serem utilizados para definir as peculiaridades locais? Chuva, sol, calor, vento nordeste, crise hídrica, mudanças climáticas?”, questiona.
O ofício ressalta que o Conselho Nacional Meio Ambiente (Conama) terá que editar uma nova normativa de padrões de qualidade do ar no Brasil este ano, ou então prevalecerão as diretrizes estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2021. Isso porque o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou, em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Procuradoria Geral da República (PGR), que a Resolução 491/2018 do Conama previa padrões aquém das recomendações da OMS.
“Pelo visto, a Assembleia Legislativa do Espírito Santo aprovou o Projeto de Lei 1.014/2023 e pretende permitir ao Governo do Estado, via decreto, anunciar números como padrões que sejam aquém das diretrizes de qualidade do ar da OMS, com base em cenários econômicos, realidade nacional e peculiaridades locais”, critica a ONG no ofício.
O projeto de lei, que ainda será sancionado pelo governador Renato Casagrande (PSB), não apresenta valores atualizados de emissões e concentração de poluentes permitidos. A proposta descreve os tipos de poluentes a serem monitorados, e também determina que a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama) e os municípios publicarão, anualmente, o inventário de emissões de poluentes atmosféricos em suas respectivas esferas de atuação.
Quanto aos valores máximos permitidos de concentração de poluentes, apenas indica que serão regulamentados por meio de decreto. Sendo assim, continuam em vigor os valores do antigo Decreto 3.463-R, de 13 de dezembro de 2013, sem haver qualquer tipo de atualização.
No caso da poeira sedimentável – popularmente conhecida como pó preto, ou pó de minério -, o valor máximo estabelecido no decreto de 2013 é 14 gramas por metro quadrado em 30 dias. A lei de qualidade do ar da cidade de Vitória, aprovada em dezembro e contestada na Justiça pelo empresariado, já atualiza esse número para 5 gramas por metro quadrado.
A deputada estadual Camila Valadão (Psol) apresentou uma emenda “para melhorar o projeto”, adicionando padrões semelhantes aos da lei de Vitória. Iriny Lopes (PT) também apresentou uma emenda com outras substâncias, e o próprio Gandini tentou uma emenda ao seu próprio projeto com mudanças nos parâmetros de poluentes.
Todas as proposições foram recusadas. O relator, Tyago Hoffmann (PSB), vice-líder do Governo, acatou apenas uma emenda oral de Fabrício Gandini (PSD), que estabelece que o decreto 3.463-R de 2013 deverá ser revisado em até 180 dias após a publicação da lei.
Gandini, que é presidente da Comissão de Meio Ambiente da Ales, é o autor do Projeto de Lei nº 494/2022, sobre o mesmo tema, mas que já tramitava na Assembleia desde 2022. As duas propostas foram colocadas em discussão única, por serem matérias correlatas, mas apenas o texto do governo estadual – que foi protocolado em dezembro passado e tramitou em regime de urgência – foi à votação, resultado de um acordo.
Rigoni e Findes comemoram
Nas redes sociais, o secretário de Estado do Meio Ambiente, Felipe Rigoni se manifestou dizendo que “a aprovação do PL da qualidade do ar foi uma conquista para o meio ambiente, no Espírito Santo. Com o PL 1.1014/2023, teremos ainda mais transparência e controle em todo o território capixaba, seguindo as orientações da OMS”.
A Findes, por sua vez, publicou nota oficial assinada pela presidente da entidade, Cris Sarmoni, na qual afirma que o texto do governo do Estado “contou com diferentes segmentos do poder público, do setor privado e da sociedade para a sua formulação. Trata-se de uma proposta construída democraticamente ao longo dos últimos dois anos”.
Além disso, a Findes classifica a proposta como “moderna”, aliando “cuidado com o meio ambiente sem abrir mão do desenvolvimento econômico sustentável”.