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PEC 215 é sentença de morte para o povo indígena do Brasil e fere Constituição Federal

Fotos: Rogério Medeiros

 

A  Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 é sentença de morte para o povo indígena do Brasil. Por esta razão, o povo indígena está em guerra contra sua aprovação, e em defesa dos direitos conquistados na Constituição Federal de 1988.
 
A constatação de que a  PEC 215 produzirá  o genocídio do povo indígena e a conclamação para a guerra por seus direitos é do índio Ailton Krenak. Ele teve atuação destacada na Assembleia Nacional Constituinte, que promulgou a Constituição Federal de 1988.
 
Ailton Krenak está no Espírito Santo e participou da abertura da conferência dos Tupinikim no Estado. A conferência, em Caieiras Velhas, Aracruz (norte do Estado), começou nesta segunda-feira (13) e será concluída nesta terça-feira. 
 
 
Já os Guarani farão conferência na quarta-feira (15), a partir das 9 horas, e na quinta-feira (16), na aldeia de Boa Esperança (Tekoa Porã). As conferências visam  discutir a  política que os povos indígenas querem para si no Brasil.
 
Durante sua fala, Ailton Krenak revelou que apenas 20 deputados federais têm 600 mil hectares de terras no país. Os deputados têm mais terras que todos os índios brasileiros que moram no Nordeste, Sudeste e Sul do país.
 
Homenagem 

O jornalista Rogério Medeiros, fundador e diretor responsável deste jornal, foi homenageado pelos indígenas durante o evento. Ele foi um dos responsáveis pela defesa da causa indígena no Estado, quando os governos estaduais nomeados pela ditadura militar negavam a existência de índios no Espírito Santo, para permitir a implantação da Aracruz Celulose (Fibria). A empresa tomou as terras dos índios à força, e as explorou com plantios de eucalipto até a exaustão.
 
Os índios reconheceram a importância desse trabalho de Rogério Medeiros, que redundou na retomada das terras indígenas no Espírito Santo. São  exatos 18.154,93 hectares de terras indígenas no município de Aracruz, norte do Estado, dos povos Tupinikim e Guarani hoje sob posse e domínio da comunidade indígena. 
 
O jornalista, que nessa época trabalhava como correspondente do Jornal do Brasil, se disse muito gratificado com o reconhecimento, e particularmente, quando os índios citaram expressamente a contribuição de Século Diário na cobertura da saga índigena no Estado desde a fundação do jornal, há 15 anos. Os índios também destacaram a omissão da chamada grande imprensa capixaba durante sua luta.

PEC 215

 
A PEC 215 tramitou na Câmara dos Deputados e foi arquivada no ano passado. Entretanto, durante a eleição do atual presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o deputado negociou o apoio da  bancada ruralista  e assegurou o desarquivamento da proposta. Mesmo se tratando de um procedimento  inconstitucional e antirregimental na Câmara, a PEC está tramitando.
 
A ameaça aos povos indígenas, e também a quilombolas e às unidades de conservação, está na transferência da palavra final sobre demarcação das terras das comunidades e das unidades de conservação para a Câmara dos Deputados.  O ato hoje é prerrogativa do Executivo.
 
Mais: com a PEC 215, a Câmara dos Deputados se dá poderes para anular atos já definitivos, como as terras indígenas e quilombolas já demarcadas. O mesmo poder quer a Câmara para anular as unidades de conservação e alterar sua tipologia. Todos temem as manobras que a aprovação da PEC 215 irá gerar.
 
Governo indígena
 
O que os índios capixabas estão discutindo será levado à Conferência dos Povos Indígenas, que será realizada este ano. Na ocasião,  decidirão o que propor ao  governo como política indígena, rejeitando qualquer ingerência neste processo.
 
Ailton Krenak falou para aproximadamente 300 Tupinikim.  Depois de citar os latifúndios com 600 mil hectares que são dos 20 deputados federais, o líder indígena afirmou que o Brasil é um país muito ruim para os povos indígenas. Defendeu que a relação dos índios com o Estado brasileiro é fundamental para os povos indígenas.
 
A palavra, disse, criava compromisso. A duração da palavra era indefinida.  Mas o  papel veio a substituir a palavra. E foi na Constituição Federal de 88, “pela qual lutamos”, destacou Ailton Krenak,  que os direitos dos  índios foram reconhecidos de forma expressa, no papel. 
 
A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 231, define: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.  …”. Este direito terá que ser respeitado, exigem os índios.
 
Além de assegurar as terras já demarcadas e a demarcação de outras áreas, reconhecidamente indígenas, os índios vão definir  –  eles próprios, sem tutela da Fundação Nacional do Índio (Funai), nem de nenhuma outra organização  –  o que querem também em termos de saúde, educação e cultura.
 
“A saúde pública que  nos é oferecida é dos brancos, não nossa. Temos de tratar disso, temos que cuidar de nossa própria saúde, segundo nossos costumes.  Quem usa o que temos, são os de fora. Estamos hoje limitados aos espaços definidos. Nossa terra tem de ser conquistada e entregue a nossos netos”, disse Ailton Krenak.
 
Defende o fortalecimento dos indígenas para melhorar a barganha com os de fora, os brancos. Defendeu um passo à frente ao que foi conquistado na Constituição Federal de 88. “Temos ainda gente morrendo para demarcar nossas terras. Para que as futuras gerações tenham território para viver com a herança cultural que nossos antepassados nos legou. Temos que reconquistar nos terras”, seguiu o índio em seu raciocínio.
 
Mas não é o que está acontecendo. As leis são feitas pelos filhos dos latifundiários, escritas por eles.  Como a PEC 215, que é um grande retrocesso  Lembrou que até durante a ditadura militar os índios ocuparam o próprio Palácio do Planalto em defesa de seus direitos.
 
“Nos cabe mostrar o nosso potencial e disposição de luta. Em usineiros, não batem. Lamentavelmente, nossos direitos estão sob gravíssimo risco. O sistema político está centrado no poder econômico. A bancada do agronegócio  por várias decisões desta legislatura, quer decidir sobre as terras indígenas”, citou Ailton Krenak. E afirmou: “Estamos em guerra na defesa de nossos territórios”, chamando todos os índios à luta.    
 
O líder indígena citou que Collor demarcou terras indígenas, Sarney também. Lamentou que nos governos eleitos com expectativa de mudar, o processo de demarcação das terras indígenas não foi continuado. Lula ainda chegou a demarcar terras no Espírito Santo, após intensa luta dos índios. Mas nada foi feito no governo Dilma. 
 
Chamou o líder indígena para a defesa das  terras homologadas com base na Constituição Federal. “Não há como derrubar  as homologações”.  Chamou para a guerra contra a PEC 215, e à luta por demarcações de novas áreas. Defendeu que cada povo dentro de seu território tenha autonomia para deliberar sobre como viver em suas terras e manter sua cultura.
 
A fala de Ailton Krenak foi acompanhada por várias lideranças indígenas locais e outros membros da comunidade. Entre os que se manifestaram Paulo Tupinkim, coordenador da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do NE, MG e ES (Apoinme). 
 
O cacique Sizenando se manifestou: “Que essa conferência não fique somente no papel. Que venha ao encontro das necessidades indígenas”. Os Tupinikim e Guarani capixabas têm cerca 3.800 pessoas, das quais cerca de  400 guarani. São dez aldeias das duas etnias.
 
No Brasil
 
Segundo o IBGE, o Censo 2010 registrou no país 305 etnias, que falam 274 línguas indígenas.  E que a  população indígena no Brasil era de 896,9 mil em 2012.
 
O direito à  terra indígena não é criada por ato constitutivo, e sim reconhecida a partir de requisitos técnicos e legais, nos termos da Constituição Federal de 1988.
 
Por se tratar de um bem da União, a terra indígena é inalienável e indisponível, e os direitos sobre ela são imprescritíveis. As terras indígenas são o suporte do modo de vida diferenciado e insubstituível povos indígenas que habitam o Brasil.
 
Das terras indígenas do Brasil, apenas 1,58% , espalha-se pelas regiões Nordeste, Sudeste, Sul e estado do Mato Grosso do Sul.   As terras restantes estão concentradas na Amazônia Legal. No total são 113.599.277 hectares de erras indígenas,  de 851.196.500 hectares, ou seja, 8.511.965 quilômetros do território nacional.

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