Processo iniciado na comunidade de Morro da Onça se arrasta há 13 anos

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a União devem ser condenados pela demora em concluírem o processo de titulação e regularização do território quilombola Morro da Onça, em Conceição da Barra, no norte do Estado. A cobrança foi feita ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), em ação sobre a regularização fundiária da comunidade, que aguarda há 13 anos a conclusão do processo. As terras são exploradas há décadas pela Suzano Papel e Celulose (ex-Aracruz Celulose e ex-Fibria).
A ação foi movida pela Defensoria Pública da União (DPU) e Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPE/ES), e pede que o Incra e a União sejam obrigados, em prazos definidos, a concluir o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade e dar seguimento às demais etapas necessárias: emissão de portaria de reconhecimento do território quilombola; decretação do território como de interesse social; avaliação e indenização das terras dos ocupantes não-quilombolas; retirada dos ocupantes não-quilombolas; e titulação.
Os órgãos requerem, ainda, o pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor mínimo de R$ 1 milhão. A Justiça Federal negou os pedidos, mas a DPU recorreu da decisão. No parecer apresentado ao TRF2, que antecede o julgamento, o Ministério Público Federal (MPF) se manifestou favorável às demandas, destacando que a comunidade vem sofrendo grave violação a diversos direitos fundamentais desde 2011, quando buscou a demarcação de seus territórios.
“O processo tramita há cerca de 13 anos e ainda se encontra em fase inicial, sem nenhuma perspectiva de conclusão”, apontou o órgão ministerial, sustentando que a União deve assegurar meios para que o Incra conclua o procedimento administrativo.
O MPF ressaltou o direito dos remanescentes de quilombos à propriedade de suas terras, previsto na Constituição Federal, como uma medida compensatória aos quase 400 anos de escravidão vividos no Brasil. “Passados mais de 35 anos da promulgação da Lei Maior, é uma vergonha para o Estado (aí incluso também o Judiciário) não dar efetividade ao comando constitucional”, critica o parecer.
O documento também destaca como justa a condenação por dano moral, já que a inércia do poder público causa danos à comunidade, como a ausência de acesso a serviços públicos adequados de água e de energia por falta de título da área; invasões frequentes de terceiros grileiros, sem a assistência devida do Incra; e ausência de acesso a políticas públicas de fomento e incentivo às atividades tradicionais, por falta de comprovação de posse da área e esgotamento da área cultivável.
A comunidade de Morro da Onça é uma das mais de 30 que integram o antigo território do Sapê do Norte, formado ainda pelo município de São Mateus, e já certificadas pela Fundação Cultural Palmares, aguardando finalização do processo de titulação, pelo Incra, de suas terras usurpadas pela papeleira. Em 2022, cansados de esperar, as famílias de Morro da Onça e do Córrego do Alexandre iniciaram a retomada de parte de seu território tradicional, em uma área localizada entre os dois quilombos, anteriormente usada para monocultivo de eucaliptos pela Suzano.
Os quilombolas lutam no Espírito Santo há mais de trinta anos pela recuperação de suas terras, enfrentando para isso, além da empresa e da inércia do Judiciário, a subserviência dos sucessivos governos estaduais.
A exploração do Sapê do Norte pela Suzano é considerada ilegal, como consta em ação civil pública impetrada em 2015, que determinou que seja declarada a nulidade dos títulos de propriedade emitidos para a então Fibria, por terem sido resultado de grilagem de terra, conforme demonstrou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Aracruz Celulose em 2002. Outra medida foi de que o governo do Estado realize a titulação quilombola das terras devolutas hoje sob posse da papeleira. O caso ainda tramita, em fase de recursos.