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Pescadores artesanais lutam por território para pesca tradicional

Cada pescador artesanal brasileiro gera, em média, quatro empregos diretos. A categoria é responsável pela produção de cerca de 70% do pescado que chega à mesa da população. No Espírito Santo, estima-se que existam 18 mil pescadores artesanais e 70 mil famílias vivendo da pesca. Apesar de toda a sua importância social, econômica e para a segurança alimentar brasileira, a atividade tem visto apenas serem reduzidos seus direitos sociais e trabalhistas e, mais do que isso, seu território de trabalho.

A garantia de um território para a pesca artesanal no Brasil é a principal bandeira de luta do Movimento dos Pescadores e das Pescadoras Artesanais (MPP), criado em 2005 com apoio do Conselho da Pastoral da Pesca e outras instituições, e foi também o principal ponto de discussão durante a 2ª Assembleia Nacional do MPP, ocorrida entre 23 e 25 de agosto, na comunidade de Batoque, em Aquiraz/Ceará.

“Estamos perdendo território pros latifundiários, pras grandes indústrias, para as empresas de petróleo, para os portos. No mar e nas águas interioranas também não conseguimos mais acessar os locais de pesca por causa de propriedades particulares que fecham os acessos”, denuncia Simião Barbosa dos Santos, presidente da Associação dos Agricultores, Pescadores e Assemelhados de Povoação (AAPAP), e um dos representantes do Espírito Santo no encontro.

“Praticamente nossa costa aqui está toda loteada pelas empresas de petróleo”, denuncia Manoel Bueno, o Nego da Pesca, coordenador estadual do MPP, presidente licenciado da Associação de Pescadores de Jacaraípe e presidente licenciado da Federação Estadual das Associações de Pescadores Artesanais do Espírito Santo (Fapaes) – está afastado das funções devido à candidatura a vereador na Serra pelo PT.

“A empresa consegue licença pra uma plataforma, depois pra um gasoduto, que liga uma plataforma na outra. Aí, um pequeno empreendimento se transforma num imenso empreendimento, e o setor pesqueiro vai perdendo seu espaço. Queremos continuar pescando e fornecendo alimentação saudável pra população”, reclama Neg da pesca. Além do espaço físico loteado, o petróleo traz ainda o grave impacto da sísmica. “É o maior impacto”, avalia.

No mar capixaba, há ainda a pesca industrial predatória, feita por imensos navios do sul do País; especulação imobiliária, que aterra mangues para loteamentos à beira mar, muitos deles irregulares; e os portos. Não bastassem os que já existem, Nego da Pesca lembra que mais 27 portos estão planejados para a pequena costa capixaba.

Nas águas interioranas, os pescadores são impactados pelo desmatamento, pelas monoculturas – de cana, eucalipto, café – e seu excessivo uso de agrotóxicos e irrigação sem controle, e pelas barragens de hidrelétricas sem as escadas para o defeso do peixe.

Simião conta que, além da garantia do território e de um ambiente sem poluição, os pescadores também lutam pelo direito a melhores condições de comercialização do pescado, por meio do acesso a financiamento para equipamentos de beneficiamento, por exemplo, que permitam atender às exigências de mercados mais qualificados, que valorizem mais o trabalho do pescador.

“Precisamos de políticas públicas que nos deem condições de dar uma vida digna para nossas famílias, com educação de qualidade, saúde. Hoje o pescador tá se aniquilando cada vez mais, não tem acesso a financiamento, a informação e vão criando leis que tiram nossos direitos”, afirma.

A criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) da Foz do Rio Doce é uma dessas iniciativas que podem garantir o direito à pesca artesanal das comunidades tradicionais, de forma sustentável, integrada às demais necessidades socioambientais da região.

Necessidades que estão ainda mais graves desde novembro de 2015, quando houve o crime socioambiental da Samarco/Vale/BHP. “Hoje pedimos apoio da assistência social, porque muitas famílias de pescadores estão desestruturadas. Mesmo os que estão recebendo alguma ajuda da empresa, acabam fazendo coisa errada, porque estão ociosos e estão indo para as drogas, para o álcool”, lamenta.

Iniciativa popular

A recuperação e manutenção de direitos sociais e trabalhistas é outro ponto importante na pauta de reivindicações. “Os movimentos sociais não estão sendo ouvidos pelo governo”, reclama Nego da Pesca. “A perda de direitos está sendo muito grande”, avalia, citando as Medidas Provisórias 664 e 665, os Decretos 8424 e 8425, e a Portaria do Ministério do Meio Ambiente 445, todas publicadas no final de 2015, criando uma série de restrições ao trabalho do pescador artesanal.

Todas essas questões foram levantadas durante a 2ª Assembleia e incluídas em um documento que será encaminhada para o Congresso Nacional, para a Presidência da República e ministérios afins à causa do pescador, e, caso não sejam ouvidas, serão encaminhadas para o Ministério Público Federal.

Os participantes também voltaram para seus estados com o dever de casa de fortalecer a Campanha pelo Território PesqueiroLançada em Brasília/DF, em Junho de 2012, a campanha busca a assinatura de 1% do eleitorado brasileiro – equivalente a 1,.4 milhão de assinaturas – para uma lei de iniciativa popular que proponha a regularização do território das comunidades tradicionais pesqueiras.

No site da campanha, há o link para baixar e imprimir folhas do abaixo-assinado e também para uma cartilha sobre esse projeto de lei de iniciativa popular.

“O capital fala mais alto mas a gente não desiste, não. Nossa parte estamos fazendo, defendendo uma bandeira que é pela saúde de todos”, convoca Nego. 

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