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Plástico que mata animais marinhos é encontrado na águas das torneiras

Plástico mata. No caso dos animais marinhos, isso acontece diariamente, seja devido à ingestão ou ao estrangulamento de nadadeiras e outras partes do corpo, provocando necrose fatais. No caso humano, ainda não se sabe de que forma a ingestão desses resíduos sintéticos pode afetar a saúde, mas certamente, a situação é preocupante e merece medidas urgentes.

Sobre a fauna que habita os mares do litoral capixaba, as tartarugas marinhas são mártires que indicam a gravidade do problema: a presença de plástico nos sistemas digestivos foi verificada em um quarto do total de animais necropsiados pelo Instituto de Pesquisa e Reabilitação de Animais Marinhos (Ipram), entre 1 de janeiro de 2016 e 29 de junho de 2017.

O médico-veterinário Luis Felipe Mayorga, no entanto, ressalva que, nesse período, o Instituto não dispunha do acesso ao número real de carcaças encontradas nas praias do Estado, podendo ser maior o percentual de animais encalhados que são vítimas da ingestão de lixo.

E a proporção deve ser bem maior, considerando os dados produzidos pelo Projeto Tamar/ICMBio, no período em que foi responsável pelo trabalho, antes do Instituto. A médica-veterinária Cecília Bapstisotte, coordenadora regional do Tamar no Espírito Santo, conta que a ingestão de plástico chegou a ser constatada em 40% dos animais necropsiados no último levantamento, há cinco anos. “Esse percentual vinha crescendo ano a ano, chegando a 40%”, diz.

A letalidade da contaminação plástica dos mares é estarrecedora. “Poucas tartarugas sobrevivem à ingestão de detritos”, afirma Luiz Felipe. “Já tentamos resolver cirurgicamente, mas é sempre tarde demais. Em poucos casos, elas conseguem expelir o lixo nas fezes e receber alta clínica”, conta. Há casos em que, mesmo uma quantidade pequena é fatal. “Palitos de dentes ou cerdas de vassoura acabam perfurando o intestino quando passam, e levam ao óbito. Mesmo sendo em pouca quantidade, matam”, relata Luiz Felipe.

Cecília acrescenta ainda a gravidade da presença de outros detritos, como cordas e outros apetrechos de pesca que são abandonados ou perdidos pelas embarcações, a chamada “pesca-fantasma”, além do lixo invisível a olho nu, como os microplásticos.

“Isso nem está sendo registrado no Brasil, mas os microplásticos já estão na água das torneiras”, alerta, referindo- se a uma pesquisa feita pela ong Orb Media e divulgada pelo jornal britânico The Guardian em setembro de 2017.

Bilhões de pessoas bebendo plástico

Segundo a reportagem, 83% das amostradas analisadas, em doze países, continham microplásticos que estão sendo ingeridos por bilhões de pessoas.

Luiz explica que os microplásticos são produzidos já pequenos, como fragmentos de esfoliantes e outros cosméticos, ou podem ser gerados na erosão de detritos maiores e que já se sabia da contaminação humana por meio do consumo da carne dos animais marinhos que o engoliam.

A pesquisa da Orb Media, no entanto, agrava ainda mais a situação. Segundo a reportagem, os EUA tiveram a maior taxa de contaminação, com 94%, das amostras contaminadas com fibras plásticas, incluindo água de torneiras em edifícios do Congresso, da sede da Agência de Proteção Ambiental. Fora da América, Líbano e Índia tiveram taxas bem próximas às dos Estados Unidos.

Sobre o caminho percorrido pelos microplásticos até chegar nas torneiras, a reportagem diz que ainda é um mistério para a Ciência, mas menciona a hipótese mais aceita entre os cientistas, de que “a atmosfera é uma fonte óbvia”. “Nós realmente pensamos que os lagos [e outros corpos de água] podem ser contaminados por insumos atmosféricos cumulativos”, disse Johnny Gasperi, da Universidade Paris-Est Créteil, que fez os estudos de Paris.

As fibras plásticas também podem ser lavadas em sistemas de água, complementa The Guardian, “com um estudo recente descobrindo que cada ciclo de uma máquina de lavar roupa poderia liberar 700 mil fibras no meio ambiente”. “As chuvas também podem varrer a poluição microplástica, o que poderia explicar por que os poços domésticos utilizados na Indonésia estavam contaminados”, afirma a reportagem, que também citou a contaminação de águas engarrafadas amostratadas nos EUA.

O Brasil não foi amostrado pela Orb Media, mas considerando as pesquisas sobre as possíveis formas de contaminação das águas de torneira com os microplásticos, e os dados sore a destinação dos resíduos sólidos no país, é fácil concluir que o problema já se instalou aqui. 

Dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abelpre), de 2012, citados em um artigo do Ipram, aponta que “o Brasil é um dos campeões em produção de resíduos sólidos, descartando apenas 13% destes em locais apropriados e 76% em lixões a céu aberto. Levados pelo vento e corpos d’água, os resíduos humanos já estão entre os principais problemas para preservação e conservação dos mares, tornando-se hoje, alvo de inúmeros debates acerca de suas consequências”.

Na esteira dessa discussão, Cecília informa que há um movimento mundial que procura proibir a incineração de resíduos sólidos – como o lixo hospitalar, que, via de regra, é incinerado – para evitar a produção de dioxina, um dos mais terríveis POPs – poluentes orgânicos persistentes, que não se degradam no ambiente e se acumulam nos organismos dos seres vivos, incluindo o humano. 

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