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‘Poder público precisa apoiar a agroecologia nas cidades’, diz hortelã urbana

Ione Duarte destacou, na Assembleia, que Grupo de Trabalho irá elaborar legislação com foco na oferta de água às hortas

Ellen Campanharo/Ales

Há um papel importante do poder público no apoio à produção urbana de alimentos que precisa ser alcançado. O pleito foi recebido nessa quarta-feira (23) pela Frente Parlamentar de Proteção da Biodiversidade Capixaba, da Assembleia Legislativa, que reuniu hortelãos e servidores públicos municipais, estaduais e federais que atuam em favor da produção de alimentos nas cidades. O objetivo foi aprofundar os laços de cooperações entre instituições e sociedade civil e encaminhar ações e políticas públicas de fortalecimento do setor. 
Representando a Rede Urbana Capixaba de Agroecologia (Ruca), a hortelã Ione Duarte destacou a importância de levar a agroecologia e, principalmente a agroecologia urbana, para dentro da Assembleia Legislativa. “Estar neste espaço, ocupar a Casa com a voz e as bandeiras da Ruca, é muito significativo”, reconhece.
Agroecologia urbana, ressalta, “não é só produzir alimento, é cuidar da terra, das pessoas”. “A gente está muito individualista e a horta traz esse envolvimento coletivo, trabalho em conjunto”, descreve.

Com a responsabilidade de levar o assunto para a Assembleia sob a perspectiva das hortas urbanas, Ione atesta que “o maior desafio hoje é o apoio do poder público” e que, dentre as demandas urgentes, o acesso à água se sobressai. “Foi um grande ganho ter conseguido um encaminhamento imediato para a questão da água”, sublinha, referindo-se à criação de um Grupo de Trabalho (GT) que irá elaborar uma legislação voltada a garantir o acesso à água potável por todas as hortas urbanas do Estado que assim o solicitarem. “É uma questão muito frágil e que teve o reconhecimento da sua urgência”.

Levantamento feito recentemente pela Ruca identificou 45 hortas urbanas na região metropolitana. Dessas, uma parte funciona dentro de escolas e outra tem fontes próprias de abastecimento, mesmo que seja por captação de água de chuva. Uma parte importante, no entanto, encontra dificuldade em arcar com as tarifas mensais de água. São essas que, num primeiro momento, a legislação pretendida pelo GT vai atender.
“Há hortas que não estão conseguindo pagar a conta de água, precisam ter suporte do poder público, porque é função dele contribuir nesse processo”, afirma. E é fundamental pensar as soluções coletivamente e que sejam uma reivindicação legítima da sociedade civil. Os entes públicos, acentuou Ione, devem “atender demandas e não construir programas de cima para baixo”.
Municípios
A polinizadora da Ruca também salienta a importância de um maior envolvimento dos municípios, parabenizando a participação da Prefeitura da Serra de forma virtual na reunião, que mostrou o apoio dado a dezenas de hortas populares, principalmente escolares.
“Não dá pra fazer uma horta só com a cessão do espaço. Vitória tem lei municipal que permite o uso de terrenos abandonados para produção de alimentos. Mas é preciso conseguir sementes, adubo, água, assistência técnica…”, elenca. “Muitas prefeituras têm viveiros, mas a gente não tem acesso a eles. Terra, também, caminhões jogam terra em espaços improdutivos, mas a gente poderia receber essa terra nas hortas”, exemplifica.
Há principalmente, afirma, a dificuldade em ter uma interlocução mais assertiva dentro das prefeituras. “Quando muda a gestão, a gente fica sem saber qual secretaria acionar quando precisa demandar alguma coisa. As hortas demandam a Ruca e a gente tem essa dificuldade. Há desmontes periódicos das estruturas municipais, que destroem tudo o que a gente conquista ao longo de um governo. A cada troca de gestão, tem que fazer tudo de novo”, reivindicou, afirmando que este deve ser um dos outros pontos que serão trabalhados pelo GT após a solução do acesso à água.
Ellen Campanharo/Ales

Segurança alimentar

A coordenação da mesa da reunião foi do presidente da Frente, deputado Fabrício Gandini (Cidadania), que enfatizou a insegurança alimentar que sofrem milhares de famílias. “Em Vitória temos mais de 13 mil famílias que recebem o Bolsa Família, que é para pessoas com risco de insegurança alimentar. É algo que a gente achou que estava contornado, mas temos de novo esse desafio”, lamentou.

O coordenador de Agroecologia e Produção Orgânica da Secretaria de Estado da Agricultura (Seag), Luciano Fasolo, afirmou que a crise econômica que se arrasta no país há alguns anos tem efeitos perversos, principalmente nas populações de baixa renda, e apontou dados que revelam 20 milhões de brasileiros em um quadro severo de insegurança alimentar.

Segundo Fasolo, a agroecologia urbana pode ser um caminho para amenizar a fome das pessoas. “Não é só alimentar, matar a fome, mas alimentar bem. Pensar em alimentação saudável é fundamental. Os quadros de insegurança alimentar não são só de acesso ao alimento, mas ao alimento de qualidade”, pontuou.

Ele informou que, dentro do Programa AlimentarES, voltado para a distribuição de alimentos saudáveis produzido por agricultores familiares, ocorreu a capacitação de técnicos e a elaboração de projetos de apoio à agroecologia urbana. Conforme o coordenador, houve a apresentação à gestão da Seag de um projeto de apoio a três hortas, mas a iniciativa não se concretizou, por uma questão orçamentária. Contudo, disse que a ideia é novamente avaliada pela pasta.

Apoio técnico

A coordenadora técnica de Agroecologia do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), Andressa Alves, mencionou que os servidores da autarquia prestam mais apoio técnico a hortas no interior do Estado e que agora começam a ampliar a atuação para as hortas urbanas. Ela frisou que é preciso aperfeiçoar a formação dos técnicos e pensar em medidas como captação de água das chuvas e energia solar para viabilizar as hortas comunitárias.

Sara Hoppe, representante do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), contou que a política pública existente na pasta é destinada para a agricultura familiar, mas que dentro da mesma, é possível incluir a produção em zonas urbanas. “As famílias podem se cadastrar como OCS (Organizações de Controle Social) e vender seus produtos como orgânicos”, explicou.

Ao final da reunião, Gandini conclamou os participantes a formarem um grupo de trabalho para construir uma proposição que contemple as várias demandas, em especial, o problema da água. “A legislação tem que pensar na Cesan [Companhia Espírito-Santense de Saneamento], na empresa privada (que fornece água em Cachoeiro de Itapemirim) e nos Saaes (que prestam o serviço em vários municípios)”, concluiu.

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