Projeto do governo do Estado prevaleceu após acordo que substituiu proposta de Fabricio Gandini
A Assembleia Legislativa aprovou, em sessão ordinária desta terça-feira (12), o Projeto de Lei 1.014/2023, que institui a Política Estadual de Qualidade do Ar. A proposta, de iniciativa da gestão do governador Renato Casagrande (PSB), não apresenta, porém, valores atualizados de emissões e concentração de poluentes permitidos.
O deputado estadual Fabrício Gandini (PSD), presidente da Comissão de Meio Ambiente, também havia protocolado o Projeto de Lei nº 494/2022, tratando do mesmo tema, mas com padrões mais restritivos. As duas propostas foram colocadas em discussão única, por serem matérias correlatas, mas apenas o texto do governo estadual – que foi protocolado em dezembro passado e tramitou em regime de urgência – foi à votação, resultado de um acordo.
O PL governista atribui a gestão da qualidade do ar em território capixaba à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama). Ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), é dado o poder de fiscalização, e o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema) será o órgão consultivo.
O projeto descreve os tipos de poluentes a serem monitorados, e também determina que a Seama e os municípios publicarão, anualmente, o inventário de emissões de poluentes atmosféricos em suas respectivas esferas de atuação.
Quanto aos valores máximos permitidos de concentração de poluentes, apenas indica que serão regulamentados por meio de decreto. Sendo assim, continuam em vigor os valores do antigo decreto 3.463-R, de 13 de dezembro de 2013, sem haver qualquer tipo de atualização.
No caso da poeira sedimentável – popularmente conhecido como pó preto, ou pó de minério -, o valor máximo estabelecido no decreto de 2013 é 14 gramas por metro quadrado em 30 dias. A lei de qualidade do ar da cidade de Vitória, aprovada em dezembro e contestada na Justiça pelo empresariado, já atualiza esse número para 10 gramas por metro quadrado.
A deputada estadual Camila Valadão (Psol) apresentou uma emenda “para melhorar o projeto”, adicionando padrões semelhantes aos da lei de Vitória. Iriny Lopes (PT) também apresentou uma emenda com outras substâncias, e o próprio Gandini tentou uma emenda ao seu próprio projeto com mudanças nos parâmetros de poluentes.
Todas as proposições foram recusadas. O relator, Tyago Hoffmann (PSB), vice-líder do Governo, acatou apenas uma emenda oral de Fabrício Gandini, que estabelece que o decreto 3.463-R de 2013 deverá ser revisado em até 180 dias após a publicação da lei.
Gandini lamentou que os padrões da proposta inicial não tivessem sido mantidos, e citou “pressão” para as alterações. Ele mencionou o fato de, em Nova Iorque, nos Estados Unidos, o valor máximo permitido de poeira ser de 5 gramas por metro quadrado. Ainda assim, comemorou a aprovação do projeto de lei. “Como dizem, a política é a arte do possível. Nesse momento, esse é o possível, e nós vamos continuar trabalhando pela qualidade do ar”, discursou.
Iriny Lopes, por sua vez, criticou as modificações. A deputada citou o fato de a poluição não se restringir às principais poluidoras, Vale e ArcelorMittal, e acrescentou que “não adianta criar milhares de empregos e ter que gastar dinheiro com a saúde das pessoas por causa da qualidade do ar”.
Tyago Hoffmann exaltou que os deputados “fizeram história, votando um projeto tão importante”, classificando a proposta como uma “lei moderna” e que “traz segurança jurídica para as empresas”.
O deputado Alcântaro Filho (Republicanos) também elogiou a proposta e parabenizou o secretário de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Felipe Rigoni – citando, inclusive, o novo licenciamento ambiental, aprovado no fim do ano passado, e classificado por diversas entidades como “PL da Destruição”.
A definição de novos parâmetros para a qualidade do ar no Estado, com base nos definidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), foi o principal compromisso assumido por Gandini há mais um ano, como presidente da Comissão de Meio Ambiente. Mas prevaleceu, novamente, o poderio político-econômico das duas gigantes poluidoras instaladas no Complexo Industrial de Tubarão, entre Vitória e Serra, e responsáveis, há décadas, pela maior parte dos poluentes lançados na atmosfera da região metropolitana.
A falta de medidas restritivas perpetua um problema crônico ambiental no Estado, com constantes registros do aumento da poluição do ar, como reforça denúncia feita em novembro passado, quando algumas estações da Rede de Monitoramento da Qualidade do Ar (RAMQAr) da Grande Vitória registraram aumento de mais de 1.000% em um ano. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi instaurada na Câmara de Vitória para apurar as causas, mas é formada por maioria governista, que tem se concentrado em apontar questões político-eleitorais, desvirtuando o objeto da investigação.