Nesta semana, a imprensa brasileira divulgou maciçamente os novos dados de um estudo feito pela entidade mundial, dando conta de que “nove em cada dez pessoas respiram ar contendo altos níveis de poluentes” e que “estimativas atualizadas revelam um número alarmante: sete milhões de pessoas morrem todos os anos em decorrência da poluição em ambientes exteriores e interiores”.
As partículas finas encontradas no ar poluído, explica a OMS, “penetram profundamente nos pulmões e no sistema cardiovascular, causando acidentes vasculares cerebrais, doenças cardíacas, câncer de pulmão, doenças pulmonares obstrutivas crônicas e infecções respiratórias, incluindo pneumonia”.
No site em português da OMS, o diretor-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus, afirma que “a poluição do ar ameaça a todos nós, mas as pessoas mais pobres e marginalizadas enfrentam a maior carga”.
A notícia informa que mais de 4,3 mil cidades, em 108 países, agora estão incluídas no banco de dados de qualidade do ar da OMS, tornando-o o banco de dados mais abrangente do mundo sobre poluição do ar. E que a base de dados coleta as concentrações médias anuais de material particulado fino (PM10 e PM2.5).
O PM2.5, explica a notícia, inclui poluentes como sulfato, nitratos e carbono negro, que representam os maiores riscos para a saúde humana. As recomendações de qualidade do ar da OMS exigem que os países reduzam sua poluição do ar para valores médios anuais de 20 μg/m3 (para PM10) e 10 μg/m3 (para PM2.5).
Na Grande Vitória, no entanto, a Rede de Monitoramento da Qualidade do Ar (RAMQAr), do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), sequer inclui o PM2.5 e a média anual para PM10 e adota, para os demais poluentes, padrões muito acima dos recomendados pela OMS.
Para o PM10, por exemplo, consta apenas a média de 24 horas na tabela divulgada diariamente pelo Iema na internet. Já no Decreto nº 3463-R/2013, a Meta 1 anual é de 45, mais do que o dobro do recomendado pela OMS.
Apenas o que convém para as indústrias
Essa meta já devia ter sido ultrapassada, segundo o decreto, que estabelece um prazo máximo de dez anos para que o governo Estado construa outras duas metas intermediárias – M2 e M3 – para chegar ao Padrão Final (PF), que atenderia às recomendações mundiais. Mas já se passaram cinco anos e o Estado continua estacionado no primeiro degrau.
A escalada rumo a uma restrição mais segura, do ponto de vista da saúde pública, se daria a partir de estudos e projetos que indicariam onde e em que medida deveriam ocorrer as reduções nas emissões de poluentes atmosféricos.
“Esses estudos e projetos poderiam apontar até a inviabilidade da continuidade da operação industrial na Ponta de Tubarão, implicando em desmobilização industrial, para o interior, por exemplo, como foi feito no estado de São Paulo”, informa Eraylton Moreschi Junior, presidente da ong Juntos SOS ES Ambiental, que participou da elaboração do Decreto e do Plano Estratégico de Qualidade do Ar – PEQAr, de 2014, dele decorrente.
Ao invés disso, protesta o ambientalista, “as empresas se articularam com o atual Governo para se submeterem a perícia ambiental pela Cetesb [Companhia Ambiental do Estado de São Paulo], a fim de que fossem indicadas melhorias ambientais”.
No entanto, alerta, “’melhorias ambientais’ possuem limites. Melhorar uma indústria de 60 anos é diferente de construir uma nova indústria! As empresas apenas vão topar fazer o que for ‘viável’ para elas”, denuncia.
Para o presidente da Juntos SOS, não existem dados confiáveis sobre qualidade do ar na Grande Vitória. “As informações do Iema não têm credibilidade, não são certificadas por ninguém. Algumas estações funcionam pela metade e geram dados com credibilidade questionável, pois não têm certificação e acreditação. Quem faz auditoria no RamQuar e no monitoramento da poeira sedimentável? Quem certifica o trabalho das empresas contratadas pelo Iema, Tomazi e Ecosoft? Elas são auditadas pelos técnicos do Iema? Se sim, onde estão esses relatórios? E esses técnicos são certificados e cumprem as exigências legais para fazerem essas auditorias?”, interroga.
“Não temos informações pra fundamentar absolutamente nada. Só temos uma certeza: a quantidade de pessoas com problemas respiratórios aumenta ano a ano”, afirma. Esse aumento, inclusive, motivou vereadores de quatro municípios da Grande Vitória a solicitaram, no início de 2018, dados dos sistemas municipais de Saúde, que possam relacionar poluição do ar e doenças dos aparelhos respiratório e cardiovascular. Requerimentos que ainda não foram atendidos.
Os graves problemas de saúde decorrentes da poluição da Vale e da ArcelorMittal foram fartamente denunciados por diversos médicos especialistas durante as CPIs do Pó Preto da Assembleia Legislativa em 2015 e constam no relatório final da investigação. Contudo, nenhuma de suas recomendações foram ainda cumpridas por nenhum dos órgãos citados – Ministérios Públicos, órgãos ambientais e a própria Ales.
Evento AGENDA UFES & JUNTOS
“A importância do monitoramento da qualidade do ar na RMGV”
Data: 22/05/2018, às 9h
Local: Auditório do Centro Tecnológico da UFES (segundo andar do prédio CT II)
Programação:
– Palestra da professora Maria de Fátima Andrade sobre monitoramento da qualidade do ar em grandes cidades do Brasil e da América do Sul e sua importância para os estudos científicos
– Mesa-redonda com participação do setor industrial, órgão ambiental, sociedade civil e academia.
Entrada gratuita