Empreendimento avança na fase 1, apesar dos questionamentos da comunidade

A partir da próxima segunda-feira (10), um trecho de 3,1 quilômetros entre as praias de Marobá e Neves, na orla marítima de Presidente Kennedy, no litoral sul do Estado, não terá mais acesso permitido ao público. Isso se deve ao avanço das obras da fase 1 de instalação do Porto Central, empreendimento questionado pela comunidade local e por ambientalistas.
Segundo a Prefeitura de Presidente Kennedy, “a medida está prevista no planejamento do projeto do Porto Central e em conformidade com o licenciamento ambiental, e busca prevenir riscos de acidentes, tanto para os trabalhadores quanto para os frequentadores da região”. A administração municipal, atualmente sob o comando do prefeito interino Júnior Gromogol (PSB), destaca que o local contará com “sinalização adequada e monitoramento contínuo, garantindo que a população esteja devidamente orientada”.
Nesta etapa das obras, iniciada em dezembro passado, é construída a infraestrutura portuária para acomodar um terminal de granéis líquidos de águas profundas. O terminal servirá de transbordo de petróleo entre navios para operações com embarcações de grande porte, como os Very Large Crude Carriers (VLCCs).
Para isso, estão sendo removidos cerca de 65 hectares de vegetação de um total de 2 mil para os quais o Porto Central conseguiu licença. Segundo o Porto Central, teve início em outubro “o resgate da fauna terrestre e serão feitas medidas compensatórias, como plantio de mais de 12 mil mudas nativas”.
Ainda de acordo com o empreendimento, “a execução segue o cronograma, com ações de compensação florestal em andamento, incluindo o plantio de mudas nativas do viveiro local e reintrodução de espécies em áreas aprovadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A meta é plantar 100 mil mudas até o fim desta fase”.
Para as próximas etapas, estão incluídas “terraplanagem, implantação do canteiro de obras, produção e transporte de rochas para a construção do quebra-mar sul, instalação da central de fabricação de elementos de concreto e dragagem do canal de acesso”. A conclusão das obras da primeira fase está prevista para meados de 2027.
Questionamentos
Vendido como uma grande oportunidade de desenvolvimento para a região, o Porto Central não é bem-aceito pela comunidade e por especialistas, por seus impactos ambientais, socieconômicos e culturais.
Do ponto de vista ambiental, as “compensações” propostas são consideradas insuficientes. “Para construir, tem que destruir muito”, alerta o sociólogo e educador popular da Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), Marcelo Calazans.
De acordo com Marcelo, em nenhum lugar em que isso foi feito deu certo. Ele exemplifica com o vazamento de óleo ocorrido na baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, no ano 2000. Marcelo recorda que foram plantadas mudas sem nenhum planejamento, que acabaram não sobrevivendo. Para o sociólogo, a iniciativa implementada em Presidente Kennedy também não tem planejamento suficiente.
Na questão socioeconômica, o Porto Central tem destacado que, para a fase 1 das obras, serão contratados 1,2 mil trabalhadores. “Em sua grande maioria homens, trabalhadores temporários. O Espírito Santo é famoso nesses casos, como em Barra do Riacho [Aracruz], onde muitos depois ficaram desempregados. A região vai ficar com um inchaço de trabalhadores temporários e precários, e a construção do porto ainda vai destruir a pesca, ou seja, acabar com a fonte de renda que já existe. O porto vai ser automatizado, vai gerar 200, 300 empregos fixos, no máximo”, destaca Marcelo.

No início de 2024, a Organização Não Governamental (ONG) Restauração e Ecodesenvolvimento da Bacia Hidrográfica do Itabapoana (Redi) lançou o documentário de curta-metragem Antes que o porto venha, que apresenta entrevistas de trabalhadores pesqueiros da região. O Porto Central deverá impactar pelo menos 400 famílias ribeirinhas que vivem da pesca.
Do ponto de vista cultural, além dos impactos nos modos de vida da comunidade, está a preocupação com a histórica Igreja de Nossa Senhora das Neves, datada de 1694, que ficará enclausurada no meio do megaempreendimento. O tema foi tratado pelo bispo da Diocese de Cachoeiro de Itapemirim, Dom Luiz Fernando Lisboa, durante a Romaria de Nossa Senhora das Neves, realizada em agosto do ano passado.
Em novembro passado, a Campanha Nem Um Poço a Mais protocolou, no Governo do Estado, um abaixo-assinado contra a instalação. A entrega do documento foi parte da manifestação contra a expansão da indústria petroleira no Espírito Santo, realizada na Praça Costa Pereira, no Centro de Vitória. O documento conta com mais de 25 mil assinaturas.