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Portos previstos para o norte do Estado desrespeitam tratado para conservação de tartarugas marinhas

A construção do Porto da Manabi, em Linhares (norte do Estado), pode fazer com que o Brasil descumpra um compromisso ambiental assumido com outros 17 países. O alerta é do coordenador nacional do Projeto Tamar, Joca Thome. A Convenção Interamericana para a Proteção e Conservação das Tartarugas Marinhas foi firmada em 1996, na Venezuela, e regulamentada por decretos presidenciais brasileiros no ano de 2001. De acordo com o tratado, as tartarugas marinhas devem ser protegidas, conservadas e recuperadas, assim como os habitats dos quais dependem.
 
A instalação do Porto Norte Capixaba (PNC) acontecerá justamente no povoado de Degredo, que se localiza próximo a Regência. Justamente a área entre este povoado e Itaúnas, em Conceição da Barra, compõe a única área de desova regular das tartarugas-gigantes, ou tartarugas-de-couro, em todo o litoral brasileiro. Joca aponta que, não só o PNC, mas também o porto da Nutripetro serão extremamente prejudiciais ao trabalho que já vem sendo feito pelo Projeto Tamar na região há mais de 30 anos.
 
Nas duas últimas temporadas de desova, o Projeto Tamar registrou flagrante de 29 e 30 tartarugas, respectivamente, que usaram o local para se reproduzir. Antes, a expectativa anual era de apenas entre 4 e 12 indivíduos. O aumento de desovas de todas as espécies de tartarugas, em todo o litoral capixaba, foi de 34,14% entre a penúltima e a última temporadas. Somente da espécie Lepidochelys olivacea, cuja ocorrência de ninhos não chegava a dez registros, foram encontrados 38 na última temporada.

 

Além disso, houve o flagrante de cinco tartarugas-gigantes enroladas em redes de pesca e, por isso, encalhadas na foz do Rio Doce. Destas, quatro foram salvas devido à ação do Tamar na região, como registrou Cecília Baptistotte, da coordenação regional do Projeto Tamar no Espírito Santo. Na região, como detalha, o Tamar mantém ações de acompanhamento com pescadores artesanais que, inclusive, se tornaram colaboradores, responsáveis por avisar a ocorrências desses animais nas proximidades da foz do rio.
 
Além de as tartarugas que usam o litoral brasileiro para sua reprodução, Joca também detalhou que todo o litoral do município de Linhares está incluído no Decreto Federal 5.092, de 21 de maio de 2004, que definiu que o Ministério do Meio Ambiente (MMA) deveria definir as regras para identificação de áreas prioritárias para a conservação. Essa regulação aconteceu com a Portaria 126, de 27 de maio de 2004, no qual foram estabelecidas como áreas prioritárias aquelas apresentadas no mapa “Áreas Prioritárias para a Conservação, Utilização Sustentável e Repartição de Benefícios da Biodiversidade Brasileira”.
 
Esse mapa foi publicado pelo MMA em novembro de 2003 e reeditado em maio de 2004. Nele, dentre diversas outras, é delimitada a área entre os Rios Riacho, em Aracruz, e Barra Seca, no município de São Mateus, como de importância extremamente alta para a conservação da biodiversidade. Na mesma categoria, está classificado o complexo de Abrolhos, que compreende a região marítima entre o norte do Espírito Santo e o sul da Bahia, e também a área entre a Barra do Riacho, em Aracruz, e Manguinhos, na Serra.

Além da área pleiteada pela Manabi estar dentro de uma região de extrema importância para a conservação da biodiversidade, ao lado da área em que se pretende instalar o PNC existe, ainda, a Unidade Municipal de Conservação de Degredo, que abriga centenas de espécies de orquídeas e bromélias selvagens e é área de desova de tartarugas marinhas.

 
O intenso movimento marítimo e costeiro, o tráfego de embarcações e a ocupação da costa são fatores que podem mudar o comportamento das espécies que ocorrem na região e, como informou Cecília, não é possível afirmar como nem qual será a mudança sofrida pelas tartarugas que frequentam a região do povoado de Degredo, uma vez que o trabalho do Tamar nunca acompanhou uma mudança de tal impacto durante seus trabalhos.
 
Além disso, a poluição causada tanto pela construção do porto, como por seu funcionamento e, também, pelo crescimento desordenado da região, pode aumentar a incidência nas tartarugas de uma doença chamada Fibropapilomatose, que consiste no crescimento de tumores na pele dos animais. O tumor não é maléfico, como esclarece Cecília, mas as tartarugas morrem porque, dependendo da região do corpo em que ele cresce, pode impedir que a tartaruga nade, coma ou se movimente, em vários casos levando à morte. De acordo com a coordenadora do Tamar, a incidência dessa doença, somente na baía de Vitória, é de 58% nas tartarugas.
 
Nessa sexta-feira (30), apesar de todas as adversidades contra a instalação de seu porto, a Manabi anunciou que a Marinha emitiu o “nada a opor” à obra de construção do seu PNC. Para que as obras sejam iniciadas, faltam as emissões das licenças prévia (LP) e de instalação (LI) pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). No site do Ibama, na consulta ao licenciamento, é possível conferir que ainda está pendente a Análise Final para que a LP do empreendimento seja liberada.

 

A instalação do PNC, além de prejudicar o trabalho do Projeto Tamar, também é criticada pelas populações tradicionais da região que, além de serem obrigadas a conviver com os danos do minério, perderão a liberdade de uso do litoral do vilarejo de Degredo, restringindo a área de pesca. Os danos do terminal são constantemente comparados à poluição e aos danos ambientais gerados pelos portos da Vale e da ArcelorMittal na Ponta de Tubarão, entre Serra e Vitória.
 
No norte do Estado, a Manabi intensificou sua campanha para eliminar resistências ao seu projeto e, desta forma, acelerar o processo de licenciamento, com apoios a eventos e reformas, em parceria com a Prefeitura de Linhares. 

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