Depois de 19 dias presos, os quatro quilombolas acusados de roubar eucalipto da Aracruz Celulose (Fibria) foram recebidos às 3 horas da madrugada desta terça-feira (1). Chegou ao raiar do dia a festa em sua homenagem, realizada por mais de cem pessoas na comunidade quilombola de São Domingos, em Conceição da Barra, norte do Estado.
Os quilombolas foram presos no último dia 14. Estiveram em cárcere comum, com outros presos, como se fossem perigosos ladrões, Altione Brandino, Antonio Marcos Cardoso, Domingos Cardoso e Hamilton Cardoso. Por pouco não foi preso Marcos Brandino, que está no mandado de prisão, mas não foi encontrado.
Aos presos, como aos outros quilombolas, restou a alternativa de catar gravetos de eucalipto, que nada servem para a empresa, para produzir carvão e vender para assegurar a subsistência. Foram presos sob acusação de roubo.
Habeas corpus
Depois de ter um recurso negado pelo juiz Salim Pimentel Elias, de Conceição da Barra, o advogado dos quilombolas, Péricles de Oliveira Moreno, ingressou na quinta-feira (27) no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) com um habeas corpus. Por sorteio, o julgamento coube ao desembargador Pedro Valls Feu Rosa. Na tarde dessa segunda-feira (31), o desembargador tomou a decisão de soltar os presos.
Na luta contra os direitos dos quilombolas se juntaram a Aracruz Celulose (Fibria) e a Suzano. A Suzano é mais recente na região do antigo Território Quilombola de Sapê do Norte, formado pelos municípios de Conceição da Barra e São Mateus. Entretanto, a Aracruz Celulose (Fibria) tomou as terras dos quilombolas e as utiliza com plantios intensivos de eucalipto desde a década de 60 do século passado. Primeiro, com favores da ditadura militar. Que continuam: principalmente do governo do Estado, mas também da União e dos municípios.
Prisões recorrentes
Na prática, nas terras roubadas dos quilombolas pela Aracruz Celulose (Fibria) restam poucas comunidades. Os que conseguiram resistir à arbitrariedades da empresa estão em minúsculas propriedades, cercados por eucaliptos que roubam a fertilidade da terra, também no seu entorno. Sua pouca água está contaminada por venenos agrícolas, intensamente usados nos eucaliptais.
Foi para a pequena comunidade de São Domingos que os quatro quilombolas que estiveram presos em Viana, na Grande Vitória, voltaram. Longamente esperados, os quatro acusados pela Aracruz Celulose (Fibria) foram recebidos como heróis na luta pela reconquista da terra.
Berto Florentino, morador da comunidade, já foi vítima de trama da empresa. Relata que os moradores esperam os seus quatro irmãos durante a noite. Eles chegaram às 3 horas da madrugada. E a festa durou até o raiar do dia. Novas festas estão programadas, pois a alegria é intensa. Até para o próximo sábado já tem festa garantida.
Apesar da festança pela alegria da volta dos quilombolas, a comunidade está em alerta. Diferentemente dos índios, que já reconquistaram suas terras – igualmente tomadas pela Aracruz Celulose (Fibria) – nenhum quilombola teve de volta o que foi tomado. Prometem que vão intensificar a luta com este objetivo, até retomar tudo o que é da comunidade quilombola no Sapê do Norte.
Operações de guerra
Toda vez que há decisão da Justiça de prender os quilombolas, as políciais Militar e Civil montam operações de guerra. Para a prisão do último dia 14, foram mobilizados cerca de 30 policiais civis do Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas e a Corrupção (Nuroc), da Polícia Civil do Espírito Santo. Foram empregadas oito viaturas, e os policiais estavam com armamento de guerra.
No que é apontado como manobra para dificultar a defesa dos presos, os quilombolas foram encaminhados para um dos presídios de Viana, na Grande Vitória. No processo, o governo do Estado deu sua outra contribuição: mandou sua esquadrilha de helicópteros (três dos quatro que tem) para aterrorizar os quilombolas com rasantes sobre suas casas.
A Polícia Militar fez uma operação de guerra famosa pelas atrocidades cometidas contra os quilombolas, em 2009. Com cerca de 100 policiais armados até os dentes, naquele ano e ainda no segundo mandato do governador Paulo Hartung, foram realizadas dezenas de prisões arbitrárias. O que levou o governo do Estado a ser condenado pelas arbitrariedades.