Os quilombolas de Angelim II, em Conceição da Barra, norte do Estado, mostraram um córrego morto, com baixíssima vazão, e contaminado por venenos agrícolas usados pela Aracruz Celulose (Fibria) nos eucaliptais e carreados para o leito do manancial pelas chuvas e pelo lençol freático.
Angelim II foi mostrado à procuradora federal Carolina Augusta da Rocha Rosado, do Ministério Público Federal (MPF), lotada em São Mateus. A procuradora visitou a comunidade no final desta segunda-feira (29).
Quem recebeu a procuradora foi José Mateus dos Santos, presidente da Associação de Pequenos Produtores Rurais de Angelim II (APPRA). Foi dele o pedido de socorro para a comunidade encaminhado ao MPF.
A água que a procuradora federal viu no Córrego do Angelim é esverdeada, da cor de caldo de cana, de tanto veneno. É totalmente imprópria, seja para consumo humano ou para irrigação de plantas.
A procuradora também viu uma enorme quantidade de eucalipto cortado no terreno. Trata-se de um corte diferente do praticado pela empresa, desde que tomou as terras dos quilombolas, em 1972 e as explora, à exaustão, com plantios de eucalipto.
A empresa tomou o terreno de propriedade dos herdeiros de Henrique Luiz dos Santos. Está tudo registrado. A herança é “conforme forma de partilha extraído dos autos do inventário nº 68, à folha nº 5 do livro 1, datado de 20/05/64 do Cartório de 1º Ofício de Conceição da Barra”, conforme certidão em poder dos herdeiros.
O documento, expedido pelo Cartório de 1º Ofício Adolpho Serra, de Conceição da Barra, ainda registra: “… Certifica, finalmente, que o referido imóvel encontra-se livre e desembaraçado de todos e quaisquer ônus’.
Desta vez o corte feito pela Aracruz Celulose (Fibria) em Angelim II foi diferente por ser radical. A empresa derrubou de vez todo o eucaliptal, sinalizando uma retirada apressada da madeira.
Ocorre que, agora, os quilombolas estão para recuperar o que foi roubado pela Aracruz Celulose, hoje Fibria. Há processo na Justiça Federal, produzido pela procuradora Carolina Augusta da Rocha Rosado com este objetivo.
O corte dos eucaliptos às pressas parece sinalizar que a empresa considera que os donos das terras de Angelim II vão recuperar o que é seu. E quer tirar o resto que pode do terreno que usurpou e usou por décadas.
Em sua visita, a procuradora federal ouviu pessoas da comunidade. São famílias que resistiram em pequenos lotes, 12 famílias no total, de 37 que moravam em Angelim II. Pessoas que viviam do que produziam na terra, como a farinha de mandioca, para uso próprio e comercialização. Hoje não há mais terra para plantar, e os moradores vivem em extrema pobreza.
As 37 famílias que viviam em Angelim II também usavam a água do córrego Angelim, quase sem nenhum tratamento. Isto antes da chegada da Aracruz Celulose (Fibria). Tomavam banho em poços formados no córrego, alguns com profundidade de dois metros. Hoje a água atinge apenas os joelhos das pessoas.
Os moradores também pescavam no córrego Angelim. Hoje, o que era na prática um pequeno rio, não tem peixes. São raros os lambaris e carás que conseguem resistir aos venenos agrícolas da Aracruz Celulose (Fibria).
Há uma ou outra nascente em uma área de 40 alqueires, ou área de 200 campos de futebol. Uma área que, se tivesse sua vegetação nativa preservada, teria água suficiente para toda a comunidade.
À procuradora federal, ainda segundo informou José Mateus dos Santos, foi feito mais um pedido. Que ela ajude a exigir do poder público, seja o governo do Estado ou o município de Conceição da Barra, a encanar a água de uma nascente, localizada há cerca de três quilômetros da pequena vila, para abastecimento da comunidade.
Hoje, os moradores têm de se virar para buscar água neste local. E não tem carro-pipa para isto.