Fotos: Jorge Alex
Mais de 500 quilombolas do norte do Espírito Santo pararam o trânsito na BR-10, na altura da entrada para Conceição da Barra. Exigem que sejam imediatamente soltos quatro quilombolas presos a pedido da Aracruz Celulose (Fibria) sob a acusação de roubar galhos de eucaliptos, que usam para produzir carvão. Ocorre que os presos estão entre os quilombolas que são os donos das terras, griladas pela empresa em plena ditatura militar.
O ato é contra a Fibria Celulose S.A, antiga Aracruz Celulose, e a Suzano Papel e Celulose S.A. As empresas têm latifúndios de eucalipto no Espírito Santo e são altamente predadoras ao ambiente e à sociedade. Afetam particularmente os quilombolas, pequenos agricultores e indígenas.
Estão na cadeia, a pedido da Aracruz Celulose (Fibria), Altione Brandino, Antonio Marcos Cardoso, Domingos Cardoso e Hamilton Cardoso. Como se fosse pouco a prisão arbitrária, que transformou os quilombolas de vítimas em criminosos, eles foram transferidos para Viana, na Grande Vitória. Outros 24 estariam na mira da polícia para serem presos.
Embora grileira com histórico de intensa degradação ambiental e social, a Aracruz Celulose (Fibria) produz ações judiciais para criminalizar os quilombolas. No caso da atual prisão dos quatro quilombolas, a medida foi decretada pelo juiz Salim Pimentel Elias, de Conceição da Barra. A defesa dos presos está a cargo do advogado Péricles de Oliveira Moreno. Por incrível que possa parecer, a ação tramita em segredo de Justiça.
Parou tudo
A ação dos quilombolas na BR-101 norte causou engarrafamento de aproximadamente quatro quilômetros nos dois lados da rodovia. Os manifestantes se reuniram a partir das 5 horas desta manhã, e até às 10 horas, ainda chegavam manifestantes. São de várias comunidades que ainda resistem à ação criminosa da Aracruz Celulose (Fibria) e da Suzano ao seu território.
Os manifestantes pararam a produção do viveiro de mudas da Aracruz Celulose (Fibria) e o carregamento dos eucaliptos produzido em suas terras pela empresa.
A Polícia Militar compareceu com quatro viaturas, de Conceição da Barra, e a Polícia Rodoviária Federal (PRF), com duas viaturas. Não se tem notícia do efetivo da Policia Civil no ato.
Os manifestantes não temem a repressão, mas esperam a qualquer momento a ação de tropas enviadas pelo governador Paulo Hartung. O governador é antigo parceiro da empresa, de quem recebe dinheiro para suas campanhas eleitorais. Um dos mais antigos parceiros políticos do governador, Robson Leite Nascimento, o Robinho Leite, 52 anos, é subscretário no terceiro mandato de Paulo Hartung, e foi diretor da Aracruz Celulose (Fibria).
Se manifestam contra os atos criminosos das duas empresas mulheres, crianças, velhos e homens. Mesmo pessoas doentes estão no ato, segundo relato de Berto Florentino, um dos quilombolas que lutam pela recuperação das terras tomadas pela Aracruz Celulose (Fibria) e também usurpadas pela Suzano.
Berto Florentino já foi vitima de ação criminosa, direta, da Aracruz Celulose (Fibria). Garantiu que a manifestação desta quarta vai até o final da tarde. E será repetida nesta quinta, até que os presos sejam soltos.
Rosário de crimes
Para prender os quilombolas, o Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas e a Corrupção (Nuroc) Espírito Santo mobilizou cerca de 30 policiais e empregou armamento de guerra. Não é a primeira ação arbitrária deste tipo produzida pela Aracruz Celulose (Fibria) contra os quilombolas.
Trata-se de um ato de subversão. As atividades da Aracruz Celulose (Fibria) começaram no campo, em novembro de 1967, quando foram plantados os primeiros eucaliptais da empresa.
Os plantios foram precedidos da tomada da terra: o comando foi do tenente Merçon, do Exército. Mas houve ação de cooptação, comandada por Benedito Braulino, o Pelé, quilombola que tinha um comércio na região. Os preços pagos aos donos das terras foram vis. Foram seduzidos com promessas de emprego na empresa. A Aracruz Celulose (Fibria) também tomou enormes quantidades de terras devolutas, que tem de ser destinadas prioritariamente à produção de alimentos.
Diferentemente, para tomar as terras dos índios, a Aracruz Celulose (Fibria) contratou pistoleiros, como o temido matador major Orlando Cavalcanti, da PM.
O projeto era do empresário norueguês Erling Sven Lorentzen, ligado à coroa do país. O projeto foi tocado com sua aliança às mais altas figuras da ditadura militar, como o general-presidente da República, Ernesto Geisel. E com a ajuda dos representantes dos militares no Espírito Santo, os governadores biônicos (não eleitos pelo povo e nomeados pelo governo federal) Arthur Carlos Gerhardt Santos e Cristiano Dias Lopes. Foi Gerhardt que começou a preparar o terreno para o domínio da Aracruz Celulose, fundada em abril de 1972.
Até hoje o destruidor da cultura e das terras quilombolas, dos índios e dos pequenos agricultores, sem contar a destruição de pelo menos 50 mil hectares de mata atlântica e toda a sua biodiversidade, Erling Sven Lorentzen é laureado no Brasil pelas elites. O norueguês detinha 28% das ações, vendidas em 2009, por R$ 2,3 bilhões. A empresa continua recebendo dinheiro do governo federal, por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O uso intensivo das terras com plantios de eucalipto pela Aracruz Celulose (Fbria) exauriu as terras que usurpou. E contaminou as águas e as terras dos poucos quilombolas que continuam resistindo às pressões da empresa. Agora, esta empresa conta com a parceria da Suzano para pressionar os donos das terras.