As lesões de pele, dores de cabeça, sintomas gastrointestinais e problemas psicológicos e mentais, exaustivamente relatados pelos moradores das comunidades atingidas pela lama de rejeitos da Samarco/Vale-BHP, após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG, no dia cinco de novembro de 2015, estão ocorrendo, na avaliação da médica, possivelmente, como consequência do contato com lama.
A ausência de estudos que comprovem essa relação, por sua vez, só escancaram a forma irresponsável com que a empresa e os governos estão lidando com a situação. “Em julho o Ministério da Saúde realizou estudos na região afetada e até agora não publicou nada. A nossa equipe, com três pessoas, conseguiu autorização definitiva do Conselho de Ética no final de setembro e agora no início de abril já publicamos os resultados”, critica Evangelina. “Eu não confio em nada que a empresa faz”, dispara a médica.
Em Barra Longa, os problemas respiratórios, de pele, dengue e emocionais se destacam entre os males mais recorrentes ou percebidos. “Porém, os danos podem ir além, quando levado em conta as doenças crônicas que poderão vir a se desenvolver ou se agravar, sem que a Samarco ou o sistema público de saúde estejam se preparando para isso”, informa o Greenpeace, Ong ambientalista que gerenciou esse e mais cinco estudos – Água, Fauna, Flora, Impactos Sociais e Direitos Humanos – feitos em comunidades atingidas pelo maior crime socioambiental do país, protagonizado pelas mineradoras Samarco, Vale e BHP Biliton.
Cada um dos estudos foi realizado por pesquisadores independentes, de universidades e institutos com experiência nos respectivos temas, e financiados pelas doações captadas pelo Coletivo Rio de Gente, e gerenciados pelo Greenpeace.
Águas subterrâneas contaminadas
Nessa terça-feira (11), o segundo estudo da série – Contaminação por metais pesados na água utilizada por agricultores familiares na Região do Rio Doce – foi divulgado pelo Greenpeace. Este, feito em duas localidades mineiras e também em Colatina, no Estado, sob coordenação do professor João Paulo Machado Torres, do Instituto de Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Segundo o Greenpeace, a realidade encontrada foi de agricultores usando água sem saber que estão com altos níveis de ferro e manganês. Em geral, a mesma para a irrigação é usada para beber. Em Colatina, 10 pontos avaliados apresentaram valores acima do permitido para ferro e manganês.
Para saúde, o risco é de acumulação desses metais no organismo ao longo do tempo, considerando as altas doses a que as pessoas estão expostas. O manganês pode causar problemas neurológicos, com sintomas da Síndrome de Parkinson. Já o ferro, em quantidades acima das permitidas, está relacionado a problemas enzimáticos que danificam rins, fígado e o sistema digestivo.
“Após o desastre, a lama se transformou numa poeira muito fina, que também pode ser inalada. A absorção pulmonar acaba sendo mais eficiente para o manganês”, diz o pesquisador André Pinheiro de Almeida.
“Não sentem vergonha?”
“O quadro dessa tragédia deixa uma cicatriz. As questões de água e saneamento precisam ser levadas a sério. Será que essas pessoas não se envergonham do que fizeram?”, questiona o coordenador do estudo, João Paulo Machado Torres.
“É uma água de péssima qualidade, com gosto e cheiro ruins, que inviabiliza o plantio de muitas espécies. Elas morrem logo após as regas ou não se desenvolvem bem”, informa Almeida.
Fica constatado, portanto, afirma o Greenpeace, que a empresa Samarco e suas controladoras Vale e BHP necessitam arcar de maneira responsável com os estragos feitos. Ainda que a barragem tenha se rompido em novembro de 2015, os danos continuam afetando a população até hoje. “O metal não vai deixar de ser metal nem sair do rio sozinho. A cada chuva, mais desses contaminantes que estão acumulados nas margens vão parar nas águas”, alerta.
“A contaminação por metais pesados pode ter consequências futuras graves para as populações do entorno, que necessitam de suporte e apoio pós-desastre. Isso deve ser arcado pela empresa e monitorado pelo governo brasileiro”, defende Fabiana Alves, da Campanha de Água do Greenpeace Brasil.