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Vale deve responder na Justiça sobre funcionamento irregular das oito usinas

A juíza Heloisa Cariello, da 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual, Municipal, Registros Públicos, Meio Ambiente e Saúde de Vitória, citou a empresa Vale para que responda a acusações de funcionamento irregular de suas oito usinas, em ação civil pública impetrada pela ONG Juntos SOS ES Ambiental (Processo nº 0027542-58.2019.8.08.0024). 

Na ação, a entidade denuncia o não cumprimento de doze condicionantes ambientais e as emissões de poluentes do ar em quantidade maior do que previsto no licenciamento ambiental da expansão de suas oito usinas localizadas na Ponta de Tubarão, no extremo norte de Vitória, bem como prazos maiores que os determinados na legislação para as emissões das sucessivas licenças que compõem o processo de licenciamento ambiental.

Os pedidos feitos são pela suspensão das atividades da empresa até a regularização dos fatos, prevendo, em caso de descumprimento, multas diárias entre R$ 100 mil e R$ 500 mil. 

Sobre a emissão excessiva de poluentes, a ACP cita os números informados no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) nº 262, de 2005, que fundamentaram os pareceres técnicos formulados pelas secretarias de meio ambiente estadual e dos municípios da região metropolitana da Grande Vitória, gerando a Licença de Implantação nº 163/2007.

No EIA, a poluidora afirma, entre outras previsões, que a expansão das Usinas I a VII e a instalação da Usina VIII iria gerar poluição de 680,81 g/s (2.450,91 kg/h) de óxidos de nitrogênio (NOx). 

No entanto, “do início das operações até a presente data, a Vale opera com emissões de poluentes acima das especificações que oportunizaram a concessão das licenças”, alega a autora da ação, com base no Inventário de Fontes Emissoras de Poluentes do Ar apresentado pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) em junho de 2019, que aponta a emissão, pela Vale, de 3.314,21 kg/h de NOx, 35,22% acima do apresentado no EIA, mesmo com as Usinas I e II paralisadas no ano do levantamento de emissões. 

A não-conformidade com o EIA e a decorrente Licença de Instalação (LI), afirma a ACP, “deveria causar cancelamento da licença pelo órgão fiscalizador”. 

O NOx tem efeitos diretos e indiretos na saúde humana, argumenta a entidade ambientalista. “Causa problemas respiratórios, cardiovasculares, dores de cabeça, função pulmonar cronicamente reduzida, irritação dos olhos, perda de apetite e dentes corroídos. Indiretamente, pode afetar os humanos ao danificar os ecossistemas em que eles dependem na água e na terra prejudicando animais e plantas”. 

No que diz respeito aos danos ao meio ambiente, prossegue, “um exemplo é a redução da permeabilidade das membranas celulares causada pelos óxidos de nitrogênio, que impedem as trocas gasosas nas folhas e prejudicam a realização da fotossíntese”. “O ozônio e os NOx são solúveis em gordura e, por isso, provocam no ser humano edemas pulmonares, penetrando nos alvéolos e podendo causar morte por asfixia”, informa. 

Prazos 

A ação também expõe os prazos irregulares de concessões das licenças de instalação e operação, bem superiores ao que determina a legislação. 

“A LI 163/2007 foi assinada em 21/06/2007, a 8ª Usina de Pelotização iniciou seus testes pré-operacionais em maio/junho de 2014 e a LO 200/2014 da LO da 8ª Usina de Pelotização fio assinada em 8 de agosto de 2014, prazo superior a sete anos [determinado pela resolução nº 237 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama)] e as usinas I a VII somente receberam a Licença de Operação 123/2018 em 21 de setembro de 2018, superando assim em mais de onze anos, prazos estes em desconformidade com a legislação”, denuncia a entidade.  

Condicionantes 

Sobre as doze condicionantes não cumpridas na LI 163/2007 e na LO 200/2014, as mesmas referem-se a estudos para implantação de estações de monitoramento da qualidade do ar nos bairros São Pedro e Santo Antonio e a parcerias com a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) ou outra Instituição de Ensino Superior, com intermediação do Iema, para pesquisas que visem melhor identificar qualitativa e quantitativamente os poluentes do ar emitidos pela empresa, bem como sua redução. 

Entre as medidas, inclui-se um plano de atendimento à norma legal que contenha, dentre outras,” rotinas para redução da produção de pelotas e/ou manuseio de cargas, em períodos de condições meteorológicas críticas, caso seja necessária para a recuperação e manutenção dos níveis aceitáveis nos períodos, conforme metas estabelecidas para cada um desses períodos, considerando única e exclusivamente os poluentes originados nas operações da empresa”.

Na transcrição das condicionantes não cumpridas, destaca-se que o texto original das licenças classifica a Vale como “a maior fonte industrial de material particulado da região da Grande Vitória”. 

Dados não factíveis 

A Vale disponibilizou dados não factíveis no EIA 262/05, acentua a Juntos SOS ES Ambiental, “não informando todo o percentual de poluentes lançados na atmosfera com a conclusão das ampliações das Usinas. Assim, o parecer técnico 06/2006 da Prefeitura de Vitória baseou suas conclusões em dados irreais”. 

Consequência disso, argumenta, “a licença obtida pela Vale para a expansão das usinas existentes e implantação da Usina VIII foi subsidiada e concedida através de dados que não demonstravam as reais consequências que poderiam ser geradas por essa expansão”. 

A responsabilidade por danos ambientais é objetiva, explica a Ação, “bastando, para a sua configuração, a demonstração de nexo causal entre ação ou omissão e o dano ambiental causado, pouco importando tenha ou não culpa o infrator”, propõe. 

Danos morais 

A ação cita ainda um estudo do Ministério da Saúde que avaliou o impacto das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como câncer de pulmão e demais doenças respiratórias, em decorrência da poluição do ar. “No Brasil, as mortes em decorrência da poluição atmosférica aumentaram 14% em dez anos. Nesse período, o número de óbitos por DCNT passou de 38.782 em 2006 para 44.228 em 2016. A constatação é do estudo Saúde Brasil 2018, do Ministério da Saúde, que utilizou dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM)”, informa a Juntos, citando trecho do estudo. 

A situação em apreço apresenta-se da maior gravidade, porque a ré lança no nosso ar elevadas percentagens de compostos altamente nocivos à saúde humana e ao meio ambiente, que trazem uma série de consequências danosas à saúde da população capixaba. 

Em função do exposto, requer indenização por danos morais difusos na ordem de R$ 20 milhões, a serem alocados no Fundo Bens Lesados de que trata a Lei da Ação Civil Pública. 

“Embora não se possa, com segurança, afirmar que todos os titulares do direito difuso de fato experimentem sofrimento e dor espiritual advindos da poluição do ar, também o contrário não se poderia dizer com certeza, o que se pode afirmar é que as doenças e mortes por problemas respiratórios e cardiovasculares estão crescendo e o ar que respiramos é o principal culpado”, explana a entidade. “Seria impossível averiguar os danos morais das futuras gerações, às quais também pertence o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, acrescenta. 

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