A Vale e a ArcelorMittal devem ser enquadradas em diversos crimes, entre os quais, o de homicídio. Esta é uma das proposições feitas pela CPI do Pó Preto da Câmara de Vitória, que encerrou seus trabalhos nesta quinta-feira (30).
Nas suas proposições, os vereadores sugerem o indiciamento das empresas ArcelorMittal e Vale na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98). Defendem o enquadramento da Vale e ArcelorMittal nos artigos 3º, e parágrafo único, 4º e 54º (prática de crimes ambientais contra a saúde humana).
E mais: propõem que as empresas sejam enquadradas no artigo 132 do Código Penal (perigo para a vida ou saúde de outrem), no artigo 129 (Lesão Corporal) e artigo 121 (Homícidio). Além de enquadramento da ArcelorMittal e Vale por infrações administrativas que incidem nos tipos previstos no Decreto Federal 6.514/2008, artigos 61, 62, V, VII.
O enquadramento das empresas por diversos crimes ambientais e infrações denunciados pela CPI do Pó Preto da Câmara de Vitória cabe a uma serie de órgãos, elencados no documento.
O relatório final foi encaminhado à Prefeitura de Vitória; ao presidente da Câmara de Vitória; à Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Espírito Santo; ao Ministério Público Federal; ao Ministério Público do Trabalho, especificamente; ao Ministério Público Estadual (MPES); ao Departamento de Polícia Federal; ao Departamento de Polícia Civil; à Secretaria de Meio Ambiente de Vitória; ao Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema); à Secretaria de Saúde de Vitória e do Estado; ao Tribunal de Justiça do Estado; e, ao Tribunal Regional Federal 2ª Região.
Muitos destes órgãos apontados no relatório como omissos e/ou coniventes com a Vale, como é o caso especifico do MPES, e com a ArcelorMittal, como o Iema a Seama, em relação às duas poluidoras.
A CPI do Pó Preto da Câmara de Vitoria foi presidida pelo vereador Davi Esmael (PSB), e relatada por Rogerinho Pinheiro (PHS). O vereador Vinícius Simões (PPS) foi vice-presidente. O envio do relatório seguiu às autoridades, para que sejam tomadas “as providências cabíveis”.
Uma das proposições exige a “implantação de painéis digitais na cidade de Vitória com informações online da qualidade do ar e seu referencial aos valores recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), bem como o monitoramento 24 horas por dia das emissões da Ponta de Tubarão, acessíveis à população pela internet”.
Outra, que a Vale e ArcelorMittal e outras poluidoras do Estado sejam impedidas de patrocinar a Feira do Verde, “pois esse espaço (é) destinado ao estudo e diálogo sobre o meio ambiente e sustentabilidade”.
Os crimes das empresas
Nas proposições sobre as providências relacionadas ao pó preto, os membros da CPI pedem “o indiciamento das referidas empresas por responsabilidade civil por lesões difusas e coletivas, metaindividuais (aquilo que transcende um indivíduo, partindo para a coletividade) e individuais homogêneas,morais e patrimoniais aos cidadãos, mediante danos à saúde, ao seu conforto e bem-estar, a poluição de seus bens e consequente desvalorização dos mesmos. E, ainda, prejuízos ao Sistema Único de Saúde (SUS), afetando o erário Municipal, Estadual e Federal”.
Citam que os crimes foram constados e apontada a responsabilidade criminal contra administração ambiental da Vale e ArcelorMittal “por incidência nos tipos do art. 66, 67, 69-A e 70 da Lei 9.605/98, havendo necessidade de continuidade na apuração da autoria da concessão de manutenção das licenças que permitem o funcionamento das referidas empresas nas condições atuais, sobretudo a que possibilitou a operação da 8ª Usina da Vale”.
Seguem os vereadores propondo “a remessa integral de cópia dos autos desta CPI aos Ministérios Públicos Estadual e Federal, bem como ao Ministério Público do Trabalho, para que promovam a responsabilização criminal das indiciadas e seus representantes legais, bem como às Superintendências de Policia Civil e Polícia Federal do Estado, para que prossigam nas investigações das autorias dos crimes contra administração ambiental”.
Defendem nas proposição “aos órgãos ministeriais, o ajuizamento de ações civis públicas visando à reparação dos danos morais e patrimoniais causados ao erário do SUS e à população, incluindo os danos à saúde e o sofrimento causado pelas enfermidades, o desconforto, as despesas com limpeza dos prédios e suas desvalorizações, o uso das águas e contaminação do ar, bem como sejam tomadas providências visando impedir ou mitigar a poluição causada, inclusive mediante a cassação de licenças porventura concedidas irregularmente”.
E mais: “Recomenda-se, em especial, aos órgãos Ministeriais a propositura de medidas judiciais com os seguintes objetivos: que as poluidoras reduzam imediatamente a poluição ambiental a patamares que não impliquem mais em poluição dos prédios situados no município de vitória, e de modo que os seus habitantes não mais sejam prejudicados em suas saúdes ou confortos, sob pena de interdição das atividades das poluidora; e indenização ao SUS (Erários Federal, Estadual e Municipal) por todos os tratamentos gerados pelo pó preto, a ser rateado proporcionalmente pelas poluidoras, causadoras de doenças cardiovasculares e respiratórias”.
Moradores
A CPI do Pó Preto da Câmara de Vitória também propôs o “pagamento de danos morais aos habitantes que sofreram ou tiveram o agravamento de doenças, ou desconforto, em virtude do pó preto”. E, “pagamento das despesas médicas, farmacêuticas e hospitalares, não cobertas pelo SUS, que habitantes ou seus familiares tiveram com o tratamento de doenças respiratórias causadas ou agravadas pela poluição causada pela Vale e ArcelorMittal.
Uma outra proposta da CPI é o “pagamento de indenização decorrente de depreciação causada a imóveis situados nas áreas da Grande Vitória, afetadas pela poluição causada pelo pó preto”. Além de “pagamento de indenização aos habitantes de imóveis situados em áreas afetadas pelo Pó Preto, a título dos serviços prestados pelos próprios, para a limpeza diária do pó com minério, ou despesas com trabalhadores domésticos. Considerando que parte do trabalho doméstico refere-se à limpeza da poluição causada pelo pó preto”.
Federalizar investigações
Os vereadores da CPI também propuseram ao Ministério Público Federal “que proceda à federalização das investigações e tome providências para defesa do bem comum, tendo em vista que a poluição das águas e da atmosfera não encontra proteção adequada nos órgãos estaduais”.
Já ao Ministério Público do Trabalho a proposta é de “que acompanhe os casos omitidos pela Vale S/A e Arcelor Mittal, concernentes às doenças ocupacionais causadas pela poluição, vez que os trabalhadores estão expostos a patamares de poluição inaceitáveis, devendo ocorrer um maior controle de emissões de particulados em área interna, observando padrões aceitáveis pela OMS”.
PGE
E para o procurador-geral de Justiça? “Recomenda-se que tome providências imediatas visando estruturar a Promotoria Ambiental com técnicos especialistas na defesa do meio ambiente, que a defesa coletiva da saúde do cidadão lesado por poluição seja afeta à Promotoria Ambiental, determinando sejam adotadas ações imediatas visando à indenização dos prejuízos à coletividade, morais e patrimoniais causados pela poluição, e propondo, ainda, ações visando a reparação do SUS pelas despesas causadas. Que determine, ainda, uma avaliação do cumprimento das condicionantes estabelecidas para a oitava usina da Vale”.
Mais: que o MPES dê cumprimento às suas diretrizes legais, respeitando a Resolução nº 006/2014 – Publicada em 08.08.2014 e republicada em 20.08.2014, que trata e disciplina a tramitação dos autos extrajudiciais no âmbito do MPES na área dos interesses ou direitos difusos, coletivos, individuais homogêneos e individuais indisponíveis, o compromisso de ajustamento de conduta, com ampla publicidade e disponibilizando na internet para ciência de toda a população antes de qualquer decisão na assinatura de termos de compromissos ou ajustamentos de conduta”.
E querem os vereadores que a “remessa integral dos autos da CPI às Defensorias Públicas Federal e Estadual, considerando a legitimidade concorrente para a propositura de ações civis públicas”.
O prefeito Luciano Rezende (PPS) não poderá dizer que desconhece o que foi aprovado na CPI do Pó Preto. Para o prefeito de Vitória e o presidente da Câmara Municipal de Vitória, os vereadores aprovaram a remessa integral dos autos recomendando da comissão.
Recomendam “que seja criada uma comissão permanente no legislativo e outra no executivo para objetivar a melhoria da qualidade do ar, como meta principal a implantação dos padrões recomendados pela Organização Mundial da Saúde e os padrões de poeira sedimentável para todas as estações de medições com valor máximo de 5 gramas por metro quadrado/mês até a data de 16/12/2022”.
Defendem e propõem que a comissão “obrigatoriamente deverá ser paritária bipartite, uma parte constituída pelos órgãos governamentais federais, estaduais e municipais, mais a representatividade do setor produtivo e a outra parte constituída pela sociedade, associações de moradores, ONGs ambientais, federações de moradores e trabalhadores, associações de classe, a academia e etc”.
Fundo
Os membros da CPI do Pó Preto de Vitoria defendem a “implantação do fundo para qualidade do ar com o objetivo de fazer a gestão da arrecadação das compensações ambientais e utilização das mesmas para o aparelhamento dos órgãos ambientais, pesquisas e, sobretudo, impedir que as poluidoras contratem serviços de fiscalização e análise dos materiais colhidos”. Propõem ainda que tais atividades sejam realizadas exclusivamente pelo poder público.
Cobram que “seja adequada a estrutura dos órgãos ambientais Comdema, Iema e Seama à necessidade do meio ambiente e a população, com a criação de cargos efetivos, treinamento dos servidores, melhora salarial, e estrutura física adequada, inclusive laboratórios, implantação de rede de segurança para a coleta dos dados ambientais. De sorte a não terceirizar as atividades que são essenciais ao apoio da fiscalização ambiental”.
No campo das proposições, querem os vereadores que “seja suspensa a concessão de incentivos fiscais às indiciadas até que adéquem suas emissões aos padrões recomendados pela OMS e poeira sedimentável (pó preto), sendo todo este processo gerido pela comissão permanente da qualidade do ar; fique condicionada a concessão de incentivos fiscais, bem como a transferência de créditos acumulados de ICMS (Lei Kandir), à indenização do SUS e dos danos patrimoniais e morais causados à população”.
Seguem: “revisão na forma de composição do Consema e dos Conremas de tripartite para bipartite; revisão das licenças ambientais concedidas as indiciadas, mediante apreciação das condicionantes por parte da Secretaria Municipal de Saúde e Secretaria Estadual de Saúde e da Procuradoria Geral do município de Vitória e Procuradoria Geral do Estado”.
No campo das propostas, a “reformulação da gestão e atendimento da legislação ambiental por parte dos órgãos ambientais criando ferramentas de auditoria; criação de ferramentas de fiscalização dos sistemas de informação ambiental das empresas a fim de se garantir a honestidade, ética e transparência das informações; e que o município de Vitória revise todas as ferramentas de gestão ambiental”.
Também propõe “que os órgãos ambientais municipais e estaduais observem obrigatoriedade de certificação e acreditação de todas as documentações que suportam condicionantes de licenciamentos ambientais por empresas isentas, idôneas, certificadas, acreditadas e sem relação profissional com a empresa licenciada e com o órgão licenciador. E, ainda, pela obrigatoriedade de certificação e acreditação de todas as documentações que suportam condicionantes de licenciamentos ambientais por seu corpo técnico”.
Consideram necessário “que os órgãos ambientais municipais e estaduais garantam a segurança e a inviolabilidade dos processos de medições de poluição do ar, dos sistemas de controles de emissões de poluentes nas indústrias e etc.; para se garantir a acreditação do sistema de gestão ambiental e da poluição no município de Vitória e no Estado; sejam obrigadas as empresas indiciadas a se utilizarem das tecnologias mais modernas em seus processos para o controle das emissões de poluentes líquidos, gasosos, particulados e outras formas, pois ainda há muito a se fazer para se atender as recomendações da OMS para os padrões de qualidade do ar”.
E, “contratação de empresas isentas e de acreditação mundial para comprovação e certificação das documentações técnicas e científicas que suportaram o atendimento das condicionantes contidas na LI 32261845 Vale (CVRD) e a liberação da LO 32261845 da 8ª Usina de Politização Vale (CVRD)”.
Defendem os membros da CPI do Pó Preto de Vitória em proposta à Mesa Diretora da CMV, para a criação de uma frente parlamentar de qualidade do ar, com o objetivo de modificação da legislação, em especial: mudança no Regimento Interno da CMV para impedir a participação na Comissão Permanente de Meio Ambiente de parlamentares que tenham recebido doações de campanha de empresas poluidoras”.
Legislação
E “aprimoramento da legislação ambiental para proibir a terceirização de atividades-fim da fiscalização ambiental, como a coleta de dados e análises em laboratórios, proibindo, ainda, o firmamento de contratos do poder público com as empresas que prestem serviços, concomitantemente, para as poluidoras”.
Na fase final das proposições, é sugerida a “criação de legislação mais rigorosa quanto aos padrões de qualidade do ar e utilização dos recursos hídricos; majoração das multas e compensações ambientais, de forma que reflitam a amplitude dos danos causados; estudos com o intuito de subsidiar o poder executivo para a criação do Fundo Ambiental de Qualidade de Ar, bem como para a estipulação de normas claras para concessões e manutenção de licenças ambientais, com maior participação pela sociedade”.
“Estipulação de leis que obriguem a transparência à sociedade dos dados de pesquisa e fiscalização; proibição e coibição à publicidade ambiental mentirosa e obrigação de divulgar a verdade; certificação, auditoria e segurança na coleta de dados da poluição, no exame de tais dados por laboratórios e na divulgação; elaboração de projetos legislativos, de iniciativa parlamentar, ou apoio ao poder executivo quando for de sua iniciativa, que estimulem pesquisas científicas arcadas pelo poder público com certificação e auditoria independente; criação de instrumentos que possibilitem a participação mais efetiva da sociedade no controle e fiscalização ambiental; código de ética rigoroso no âmbito dos poderes públicos.