“(…) que seja reconhecida a incompetência absoluta da Justiça Federal para processar e julgar o presente feito, remetendo-se os autos ao Juízo Estadual cabível”. Este é um dos requerimentos apresentados pelos advogados da Vale em sua defesa na ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF) na Justiça Federal.
A ação do MPF requer que a Justiça Federal determine que a Vale retire as montanhas de minério de ferro que lançou em Camburi, em Vitória. O crime durou de 1969 a 1984, quando quatro das usinas de pelotização da Vale instaladas no Planalto de Carapina despejavam minério no mar. Houve ainda contaminação da vegetação de restinga, além da praia e do fundo do mar. A Vale tem hoje oito usinas na região.
A ação recebeu o número 0101820-77.2015.4.02.5001 e está tramitando na 5ª Vara Federal Cível no Espírito Santo, a cargo da juíza Maria Cláudia de Garcia Paula Allemand. A ação judicial é do procurador federal Fabrício Caser.
Os advogados da empresa pleiteiam que seja designada audiência preliminar para tentativa de conciliação entre as partes. A defesa quer que seja reconhecida a incompetência absoluta da Justiça Federal para processar e julgar o mérito, remetendo os autos para a Justiça estadual. Também alegam que a petição do procurador federal foi inepta “por cumulação indevida de pedidos incompatíveis entre si”.
A Vale também não quer pagar indenização pela destruição ambiental que produziu, nem restituir nada à sociedade. Consideram “tanto a impossibilidade jurídica do pedido de indenização por danos extrapatrimoniais coletivos, quanto à falta de interesse processual em face das circunstâncias verificadas, devendo o feito ser julgado extinto sem resolução de mérito, na forma do art. 267, inciso VI do CPC”.
A ação civil pública do MPF pode mudar uma situação que se arrasta há anos. E não é a única ação que a Vale responde na Justiça Federal no Espírito Santo. Responde, por exemplo, por poluir o ar da Grande Vitória, causando produzindo doenças e matando pessoas, além de destruir o ambiente.
Desde 2003, o MPF investiga o problema causado pela Vale em Camburi, levantando um grande número de documentos. Na ação, o procurador federal Fabrício Caser afirma sem rodeios que “a operação das usinas da Vale causou o lançamento de efluentes líquidos contendo partículas de minério de ferro, causando degradação do meio ambiente local, especialmente na praia de Camburi, bem de uso comum do povo”.
Em estudo é apontado que a área destruída pela Vale é estimada em exatos 109.300 metros quadrados: 95.550 metros na região submersa, e 13.750 metros na face de praia. A Vale criou no fundo do mar uma montanha de minério com 51.400 metros cúbicos. Ou 183 mil toneladas de sedimentos de minério de ferro.
Foram formadas camadas com 175 centímetros de espessura. Em alguns pontos, os teores de minério de ferro variam de 26% a 60% do material analisado. O levantamento foi exigido em 2003, produzido por empresa contratada pela própria Vale, por determinação legal.
A Vale sabe não só quanto poluiu, como conhece os resultados da poluição que produziu no mar com a operação de suas usinas I a IV. Obrigada a cumprir uma condicionante ambiental, a empresa contratou uma consultoria. Foram feitas quatro campanhas ao longo de 2004, em seis estações de coleta.
Cita o procurador federal na ação civil pública contra a Vale: “(…) Restou demonstrado a presença de toxidade em todos os pontos, mas nos pontos 2 (local de deposição do minério de ferro) e 5 (local de lançamento de esgoto doméstico de Jardim Camburi) foram os mais críticos, recomendando-se a realização de testes específicos para identificação dos componentes causadores desta toxidade”.
Na ação judicial é citado que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semmam) da Prefeitura de Vitória definiu, em 2007, que a melhor solução para o problema seria a Vale fazer a dragagem do rejeito, para mitigar o impacto ambiental. A própria Vale reconheceu, em 2007, como melhor metodologia a ser aplicada para que seja remediada a degradação que promoveu da área de face da praia, “a escavação total e na remediação da área de fundo marinho a dragagem total”.
A Vale não moveu nem uma palha para resolver o problema que causou com a poluição do mar. Aliás, rejeitou as sugestões sobre onde depositar o minério a ser retirado do mar. Com as providências requeridas pelo MPF, a Justiça Federal pode mudar a situação.
Os advogados da Vale pedem à Justiça Federalque seja reconhecida a inépcia da ação inicial, por incompatibilidade de pedidos, devendo o feito ser extinto. Eles pedem ainda que seja determinado ao autor que promova a citação Iema como litisconsorte passivo necessário, sob pena de extinção do processo sem julgamento de mérito.
A Vale, pasmem, não vê dano nenhum causado ao ambiente em Camburi, nem à sociedade. “Seja, ao final, julgada improcedente a ação coletiva ora impugnada, tendo sido sobejamente demonstrada a inexistência de danos ambientais materiais e extrapatrimoniais a serem reparados, afastando-se no mérito, via de consequência, os pedidos indenizatório e compensatório formulados, tanto mais por seu injurídico caráter punitivo subjacente”, alegam os advogados.