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Codesa demitiu mais de um trabalhador por semana em um ano

O processo de tentativa de privatização da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) em curso, ao arrepio da legislação vigente no país, já tem provocado demissões significativas, antes mesmo de sua consolidação. A percepção é do Sindicato Unificado da Orla Portuária (Suport-ES). 

“Em dezembro de 2018, tínhamos 316 trabalhadores. No último levantamento feito recentemente, contamos 254. Logo, são 62 trabalhadores a menos desde o início da gestão que aí está, tanto no governo federal quanto na Codesa”, relata o presidente da entidade, Ernani Pereira Pinto. 

O Sindicato alerta ainda para outra ilegalidade flagrante no setor, que é a não contratação dos trabalhadores do Órgão Gestor de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso (Ogmo-ES).  

A criação dos Ogmos no Brasil atende à chamada nova lei dos portos – lei 12.815/2013 – e traz elementos da Convenção 137 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que regulamenta o trabalho portuário, e da qual o Brasil é signatário, determinando que os portos privados devem suprir suas necessidades de serviços avulsos contratando exclusivamente os trabalhadores do Ogmo. 

No Estado, a instituição tem cerca de 1,6 mil pessoas, mas tem sido preterida pelos portos privados. Ernani explica que esse desrespeito à legislação objetiva burlar obrigações trabalhistas, obrigando o trabalhador a trabalhar mais, em condições piores e com menores remunerações. 

“Os trabalhadores avulsos do Ogmo, perto de 100% são filiados ao sindicato. Esses trabalhadores têm clareza daquilo que está definido no Acordo Coletivo, nos contratos, e não se submetem ao que estiver fora disso”, afirma. 

“Ocorre que as empresas querem pagar menor salário, querem que esse trabalhador tenha um regime de escala de trabalho fora das condições que é previsto numa atividade de risco, numa atividade de grande responsabilidade, que é transportar, movimentar toda a riqueza, 95% do PIB brasileiro é por importação e exportação. Logo, a gente percebe que o que eles querem é fragilizar a organização do trabalho e as conquistas sociais provenientes do Acordo Coletivo e até aquilo que está definido em lei”, elenca. 

O cenário, avalia o líder sindical, é de tensão. “Percebo que os trabalhadores estão apreensivos e inseguros. E ninguém elege um governo pra viver com insegurança, sela ela qual for”, provoca. 

Os problemas também acontecem na gestão macro. O modelo de gestão landlord, com operação privada e gestão pública, é adotado nos mais avançados portos do planeta e é o mais indicado também para a realidade capixaba, concluem as entidades representativas dos trabalhadores. Neles, diferentemente do Brasil, compara Ernani, a gestão é profissional. 

“Os currículos são analisados, a sociedade participa da escolha, principalmente dos trabalhadores, dos operadores, dos usuários do porto. Não é uma questão política ou por indicação de qualquer segmento que seja. Então assim, a qualidade fica melhor. Porque a pessoa geralmente é uma pessoa da área, é uma pessoa com larga experiência, e quando você analisa currículo, analisa a qualidade do serviço e da administração que vai ser feita”, argumenta. 

Os governos brasileiros, ao longo das décadas, ao contrário, “vivem salvando empresas caloteiras que sonegam impostos, que sonegam a Previdência, dão perdão fiscal … logo o Estado vai estar sempre presente pra salvar esse sistema”, denuncia. 

“Quando você trata de portos, está dizendo que existem terminais privados, empresas grandes, com carga própria, com carga de terceiros, mas aqueles que não são detentores de porto, que também têm indústrias, outras importações e exportações terão um local onde o Estado vai recepcionar e dimensionar essa necessidade de vazão e onde cria também empregabilidade, cria segurança pra essas pessoas que podem importar, e com custo que cabe dentro do seu bolso, porque se ele for buscar isso em outro ente privado, ele não vai ter a mesma condição que é dada hoje no porto público”, esmiúça. 

Atores locais

No afã de privatizar não só a operação portuária na Companhia Docas pública, mas também a sua gestão, isso ao arrepio da lei e do que há de mais eficiente e moderno no mundo, o poder político-econômico tem se fechado cada vez mais e tentado inviabilizar a participação dos trabalhadores e da sociedade. 

“Falta diálogo, falta representatividade, não por parte dos trabalhadores, mas por aqueles que receberam por outorga do voto a representação de toda a sociedade. Tanto que eles não nos convidam logo de primeira pra participar dos fóruns de debate”, descreve. 

No Brasil, lembra o líder sindical, a maioria dos portos públicos está dentro de cidades, o que naturalmente expõe a necessidade de incluir, na gestão portuária, os representantes das prefeituras e dos governos dos estados. Além disso, acrescenta, existem as comunidades locais, onde vivem um grande número de trabalhadores dos portos das quais elas são vizinhas. “Sendo assim, essa comunidade contribuiria muito com propostas, com a participação, com o reconhecimento daquele porto público no local onde está”, aduz. 

“Nós trabalhamos em regime de produção, nós trabalhamos realmente fazendo a carga sair e fazendo a carga entrar de maneira rápida, que é o que faz com que o custo fique mais baixo. No porto, a coisa acontece, mesmo com alguns gargalos que muitas vezes são colocados sobre a mão de obra ou sobre um ou outro pequeno operador ou pequeno terminal”, afirma. 

Gargalos que são criados pelo “excesso de autoridades intervenientes”, aponta. “Um libera, o outro segura, tudo isso atrapalha. E muitas vezes a resposta não está em quem está lá pra produzir, em quem está lá pra executar, mas em quem administra e em quem governa, e não nos trabalhadores e na sociedade que está aqui diretamente ligada ao porto”, esclarece. 

“Parece que eles têm medo da gente, de nos encarar. Parece que eles não querem conhecer a verdade dos fatos e preferem então fazer uma discussão de cúpula onde a base, a sociedade não participa”, lamenta. 

Salto de qualidade

Além das demandas trabalhistas, como manutenção da empregabilidade, valorização salarial, mais segurança no trabalho e melhores condições de produção, há também sugestões para a melhor rentabilidade e eficiência do setor portuário. 

“A gente precisa de dar um outro salto de qualidade onde a sociedade como um todo participe desse processo. O porto é uma área estratégia, como uma área de segurança, então a gente precisa ter muito cuidado com a atividade portuária pra não se transformar numa bomba-relógio”, adverte. 

“O debate do corredor centro-leste começou dentro do Movimento Nacional de Defesa dos Portos, do qual nós fizemos parte, lá pelos idos de 1991/1992 até 1993, que se transformou depois na Intersindical dos portos do Espírito Santo”, relata, citando também a reivindicação de um porto de águas profundas no Espírito Santo, feita inicialmente pelos sindicatos de trabalhadores. “Continuamos acreditando que podemos contribuir para a melhoria do nosso estado e do nosso país”, exulta. 

Complexo portuário grandioso

Segundo especialistas, o complexo portuário do Espírito Santo é um dos maiores da América Latina. Nele, além da Codesa, de gestão pública, que movimenta seis milhões de toneladas de cargas diversas, destacam-se diversos outros portos ligados às maiores indústrias instaladas no Estado: Barra do Riacho, em, Aracruz, norte do Estado, que responde 70% das exportações brasileiras de celulose; Tubarão e Praia Molde, na Grande Vitória, grandes exportadores de pelotas e minério de ferro; Regência e norte Capixaba, no litoral norte, de uso da Petrobras; e Ubu, em Anchieta, no sul, utilizado pela Samarco.

 

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