Deputados, lideranças e o Fórum de Mulheres do Estado repudiaram o vereador e prestaram solidariedade a Camila
A agressão do vereador Gilvan da Federal (Patri) contra Camila Valadão (Psol) durante a sessão dessa quarta-feira (1), na Câmara de Vitória, teve repercussão nacional e local, com manifestações de repúdio ao bolsonarista e apoio à vereadora por parte de deputados federais e do Fórum de Mulheres do Espírito Santo (Fomes). Durante a sessão, aos berros, Gilvan mandou Camila calar a boca e a chamou de “satanista” e “assassina de bebês e crianças”.
Em suas redes sociais, os deputados federais David Miranda, Talíria Petrone e Glauber Braga, do Psol-RJ, se pronunciaram. David destacou que Camila foi “atacada pelo bolsonarista Gilvan da Federal (Patriotas) no momento em que defendia os professores” e afirmou que “não vamos tolerar homens que não sabem ouvir as mulheres e as agridem quando discordam de suas opiniões”.
Glauber demonstrou solidariedade à vereadora e manifestou desejo de que “esse sujeito seja devidamente responsabilizado!”. Talíria defendeu que “a escalada da violência política de gênero precisa ser combatida” e afirmou que Camila “não anda só”.
A deputada federal Fernanda Melchiona (Psol/RS) também destacou que não é a primeira vez que Camila sofre violência política de gênero e questiona “até quando?”. Em outro episódio, em março deste ano, Gilvan disse que ela devia “se dar o respeito”. O comentário foi feito em razão de uma blusa de um ombro só que a vereadora usava.
A deputada federal Sâmia Bonfim (Psol/SP) salientou que “o avanço das mulheres na política causa raiva nesses machistas”, e acrescentou: “estamos juntas!”. A também deputada federal Vivi Reis (Psol/PA) pediu “basta de violência!” e demonstrou “total solidariedade à vereadora de Vitória (ES) pelo Psol, Camila Valadão, que sofreu violência política de gênero por um vereador bolsonarista, que a ofendeu com gritos e xingamentos, a mandando calar a boca. Não nos calarão! Estamos juntas, Camila!”.
Manuela D’ Ávila (PCdoB), que atuou na Câmara dos Deputados de 2007 a 2015 e foi candidata a vice-presidente em 2018 na chapa com Fernando Haddad (PT), afirmou que mandar uma vereadora eleita calar a boca dentro da Câmara “não faz parte da política” e se “chama violência política de gênero”.
O deputado federal do Espírito Santo Helder Salomão (PT) também manifestou solidariedade não somente para Camila, mas também para sua colega de partido, a vereadora Karla Coser, que no dia da agressão estava de licença em virtude de seu casamento, mas também já sofreu inúmeros ataques machistas no plenário. “Chega de violência política de gênero! Contem comigo sempre”, disse o parlamentar. A própria Karla Coser já havia se pronunciado, classificando a atitude de Gilvan da Federal como “absurdo” e “desrespeito”. “Não aguentamos mais sofrer violência política. Não nos calaremos!”, destacou.
A deputada estadual Iriny Lopes (PT) declarou “todo apoio à Camila Valadão pelo ataque sofrido na Câmara de Vitória. Dizemos basta à violência política de gênero. Intolerantes terão de aceitar a ocupação feminista, negra e militante em espaços de poder!”. Sua fala foi ratificada pela vice-governadora Jacqueline Moraes (PSB), que afirmou fazer voz ao chamado da parlamentar “em prol do movimento de ocupação feminista, negra e militante em espaços de poder”, dizendo ainda não estar surpresa “com a virulência dedicada a Camila Valadão, que já foi vítima várias vezes”, destacando ainda que Karla Coser também “já perdeu as contas das violências políticas de gênero vividas”.
O Fórum de Mulheres do Estado, por meio de nota, destaca que “quando Camila Valadão pede sua inscrição na Câmara de Vereadores de Vitória, Capital do Estado do Espírito Santo, leva a palavra de milhares de mulheres! Com ela se levanta e perfila a luta ancestral por liberdade e autonomia das mulheres!”. Afirma também que “na fala de Camila vai o resumo de todas as formas de violência contra as mulheres!”.
A nota salienta que, diante da ordem de Gilvan para que ela calasse a boca, a vereadora não se calou, sendo chamada de “satanista” e “assassina de crianças”.
“Nossos corpos são territórios de amorosidade, acolhimento e cuidados e nele ressoa nossa voz, em defesa de todas as mulheres vítimas de violências! Hoje somos todas Camila Valadão e não vão nos calar! Repudiamos as práticas fascistas deste vereador, que dissemina ódios, dando vazão na tribuna da CMV, usando a imunidade parlamentar, a toda sorte de preconceitos! Exigimos respeito!”, diz o Fórum.
A entidade termina a nota reafirmando que “a Câmara é a casa do povo! As mulheres devem ser respeitadas ali ou em qualquer outro espaço no qual os homens machistas e a sociedade patriarcal ainda considerem, infelizmente, como lugar exclusivo dos homens”.
Sucessão de agressões
Durante a sessão em que Camila foi agredida, estavam presentes profissionais da educação e demais servidores do município, que protestavam contra o projeto de organização curricular de 2022 e contra a reforma da Previdência, aprovada em janeiro último. A presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Vitória (Sindismuvi), Waleska Timoteo, utilizou a Tribuna Livre para falar sobre a proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2022.
Representando os servidores públicos municipais, ela iniciou sua fala dizendo que “não somos vagabundos, não somos queimadores de rosca, não somos maconheiros, muito menos satanistas, como foi dito na sessão de ontem [terça, 30]”, referindo-se à fala do vereador Gilvan da Federal. De acordo com Waleska, Vitória conta com 15 mil servidores, “desvalorizados no salário, na alimentação, nas condições de trabalho”, e ainda, com 6 mil aposentados “que tiveram o pão tirado da sua mesa no café da manhã e também seus remédios”, em referência à reforma da Previdência, que aumentou a alíquota de 11% para 14%.
A presidente do sindicato destacou que a peça orçamentária não garante a reposição inflacionária e que as perdas salariais dos servidores já somam 30%. Também fez críticas em relação à condução da educação, salientando que a prefeitura quer tirar a gestão democrática e que as decisões são sem processo de escuta. “É de cima para baixo, verticalizado, e o que é verticalizado não garante avanço coletivo”, ressaltou.
Posteriormente, abriu-se o momento de fala para os vereadores. Gilvan utilizou o seu para, mais uma vez, ofender os professores e entidades ligadas à área da educação. Disse que é preciso “diferenciar professor de uma militância que defende um ladrão corrupto, de uma militância lulista marxista”. Falou também que os docentes “tentam embutir em menino que ele não é menino e em menina que ela não é menina”. Destacou que, em uma live sobre educação, a presidente do Conselho Municipal de Educação Vitória (Comev), Zoraide Barbosa, usou o termo neutro todes, comportamento que ele afirma ser ‘uma desgraça para a educação de Vitória”.
No discurso de Anderson Goggi (PTB), Gilvan iniciou uma discussão com o professor e diretor da Pad-Vix, Madson Moura Batista, fora do microfone, fazendo com que suas palavras não fossem captadas pela transmissão oficial da Câmara. Entretanto, vídeos feitos por pessoas que assistiam a sessão mostram o vereador gritando, dizendo para “respeitar nossas crianças”, chamando o professor de “canalha” e “covarde”, e o acusando de ficar “emboscando criança na escola”.
Goggi pediu respeito ao seu momento de fala, tendo ouvido como resposta do presidente da Casa, Davi Esmael (PSD), que “não posso ir lá, porque o vereador não está fazendo uso do microfone”. Anderson, então, afirmou que “isso aqui está um circo”. Davi Esmael, enraivecido, respondeu que “não sou palhaço e vossa excelência também não é”.
Camila Valadão pediu respeito ao momento de fala do vereador. Foi aí que Gilvan, ainda fora do microfone, a mandou calar a boca. A vereadora reagiu dizendo “você não vem me mandar a calar a boca aqui dentro, você não vem me xingar, porque eu não baixo bola para você. Você me respeita, você não me manda calar a boca”. Nesse momento a transmissão foi interrompida, impossibilitando os cidadãos de terem conhecimento do que se passou a partir daí dentro de um espaço público.
Porém, Camila Valadão publicou em suas redes sociais vídeos feitos por pessoas que estavam no local, que a mostram, ao microfone, dizendo “eu exijo respeito, não caio em provocação não. Como que um homem eleito pode mandar uma vereadora no exercício de sua atividade parlamentar calar a boca?!”. Ao contrário de Camila, Gilvan não falou ao microfone, impossibilitando que sua fala fosse ouvida com clareza, mas as imagens mostram que ele estava muito alterado e apontando o dedo para a vereadora, inclusive fazendo o gesto de arminha. Entre as acusações, chamou Camila de “satanista” e “assassina de bebês e crianças”.
Em meio à confusão, os vereadores se omitiram. Leandro Piquet (Republicanos) foi o único que levantou e tentou apaziguar a situação. Waleska relata que quando Camila estava saindo do plenário, Gilvan ficou cercando a vereadora, que foi protegida por um de seus assessores. “Ele tomou a frente com receio de que houvesse agressão física, pois o vereador foi para enfrentamento direto, muito perto do corpo dela”, diz.
Camila afirma que Gilvan queria atrapalhar a sessão. “Hoje o vereador ficou muito pouco de me agredir fisicamente. Antes de me agredir, estava agredindo os professores e estava visivelmente atrapalhando a sessão, de maneira a impossibilitar o andamento”, relata. Madson destaca que Gilvan “vem fazendo ataques sistemáticos ao magistério”, acusando os docentes, entre outras coisas, de defender pauta LGBT para as crianças e os chamando de “militantes travestidos de professores”.
Trabalhadores da educação voltam às ruas para protestar em Vitória
https://www.seculodiario.com.br/educacao/trabalhadores-da-educacao-de-vitoria-realizam-protestos