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‘É a confirmação de uma tradição da extrema-direita no Espírito Santo’

Fotos: Arquivo Público do Espírito Santo (Apees)

Reportagem publicada recentemente pelo Estadão mostra a tentativa de articulação da Frente Integralista Brasileira (FIB), grupo de extrema-direita que remete ao integralismo, que teve grande força especialmente na década de 1930, numa espécie de versão brasileira do fascismo. Segundo os dirigentes da entidade, Espírito Santo é um dos sete estados do país que possuem “núcleos provinciais” da FIB.

“Não é surpresa nenhuma, só uma confirmação da longa tradição da extrema-direita atuando no Espírito Santo”, diz Pedro Ernesto Fagundes, doutor em História e professor do departamento da área na Universidade Federal do Estado (Ufes), que há anos pesquisa o movimento integralista.

Segundo ele, foram inúmeras tentativas de reorganizar os núcleos integralistas no Brasil, que não frutificaram devido à conjuntura adversa. Com a ascensão da extrema-direita a nível internacional e nacional, porém, os integralistas parecem encontrar um terreno propício para se expandir.

Para se ter uma ideia da importância do Espírito Santo, o primeiro congresso nacional da AIB, em 1934, foi realizado em Vitória, mais especificamente no Theatro Carlos Gomes, no Centro Histórico da capital.

Em 1935, na iminência da passagem de Plínio Salgado pela estação de trem de Cachoeiro de Itapemirim numa parada rumo a Campos dos Goytacazes, foi instalado um conflito que gerou um dos primeiros “mártires integralistas”, Alberto Sechin. Ele foi uma das duas vítimas fatais quando os integralistas foram até a estação e entraram em conflito com sindicalistas ferroviários, ligados a movimentos de esquerda, sendo que as mortes teriam resultado provavelmente da intervenção policial, como conta o professor.

Nas eleições municipais que aconteceram entre 1935 e 1936, foram eleitos 26 vereadores integralistas no Espírito Santo e os prefeitos de Santa Teresa e Barra de São Francisco. Os principiais líderes da AIB eram pessoas de destaque no Estado, comenta Pedro Ernesto, que destaca as figuras de Jair Dessaune, jornalista e editor da influente revista Vida Capichaba, e o padre Ponciano Stenzel, ambos eleitos vereadores em Vitória. “Era uma organização política muito organizada, estruturada, tinha uma militância muito ativa, e conseguiu eleger uma banca de vereadores considerável para a época”.

O professor explica que essa militância integralista teve grande adesão dos imigrantes e descendentes de italianos, já que o fascismo também gozava de grande apoio popular na Itália, o que pode explicar, em parte, a grande adesão do Espírito Santo, que recebeu expressiva quantidade de migrantes italianos. Antes de fundar a Ação Integralista Brasileira, Plínio chegou a se encontrar com o ditador Benito Mussolini na Itália. “Tiveram uma penetração e atuação muito grande na sociedade brasileira, a ponto de alguns autores classificarem a AIB como primeiro partido de massas no Brasil”. 

O professor explica que essa militância se organiza entre homens, mulheres, chamadas de Blusas Verdes, e crianças, que compunham a sessão do partido dos “plinianos”, em referência a Plínio Salgado. Se organizavam em decúrias e centúrias, que depois resultavam em núcleos municipais ou provinciais. A simbologia é marcada pelo uso de fardas (que gerou apelido de “galinhas verdes” por seus opositores), do uso do sigma como símbolo, das saudações, desfiles, marchas e outros rituais inspirados no fascismo.

Segundo Pedro Ernesto Fagundes, a principais característica do movimento integralista eram o anticomunismo, um discurso permanente contra a política e todos os grupos políticos existentes, apesar de ironicamente a própria organização ter se transformado num partido político. Outra característica é essa mobilização social que consegue atingir no país.

Criado em 1932 sob liderança de Plínio Salgado, a Ação Integralista Brasileira (AIB) acabou tendo curta existência, mas de grande influência social.

“Inicialmente buscava ser uma alternativa para vários setores da sociedade brasileira como profissionais liberais, comerciantes, estudantes, pessoas ‘comuns’ que não tiveram vez nem voz na política brasileira durante o período da Primeira República”, diz Pedro Ernesto Fagundes. A Revolução de 1930 que leva Getúlio Vargas ao poder marca o fechamento do ciclo em que as oligarquias de São Paulo e Minas Gerais se alternavam no comando do poder nacional e a estrutura oligárquica também dominava o âmbito estadual.

Em 1937, depois da Intentona Comunista, Getúlio Vargas cria o Estado Novo e decreta a ilegalidade de todas organizações políticas e seus símbolos, incluindo a AIB. No ano seguinte acontece o Levante Integralista, em que tentam depor o presidente, sem sucesso. Em 1942, quando Vargas declara guerra aos países do Eixo, formado por governos de extrema-direita, vários militantes integralistas são perseguidos e têm suas casas invadidas e materiais confiscados.

Depois da Segunda Guerra Mundial, Plínio Salgado passa um período em Portugal durante o governo do ditador Salazar e volta ao Brasil convertido à democracia cristã, fundando o Partido de Representação Popular (PRP), concorrendo à presidência em 1955, ficando em quarto lugar, com 8% dos votos. Mas no Espírito Santo sua votação foi a segunda maior do Brasil em termos percentuais, atrás apenas do Paraná, o que mostra a influência de Plínio e suas ideias no Estado. 

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