Após a revelação de novos bens ocultos em nomes de familiares, o ex-governador Paulo Hartung (PMDB) voltou a utilizar o termo “baixaria” na tentativa de evitar dar explicações sobre as acusações. Novamente, o candidato ao governo disse que a sua família está sendo alvo de ataques. No entanto, Hartung se esqueceu de um ponto fundamental: ele mesmo implicou a família ao transferir à esposa, Cristina Gomes, o ônus da declaração da “mansão secreta” em Pedra Azul, além da gestão de uma empresa familiar, aberta logo após deixar o governo, que abriga um patrimônio avaliado em R$ 36 milhões.
Em entrevista ao jornal A Gazeta, o peemedebista repetiu o discurso que vai manter uma “campanha propositiva”, enquanto o seu principal adversário, o atual governador Renato Casagrande, cobra explicações do candidato sobre episódios ligados à gestão passada. Para a mesma publicação, Hartung chegou a desafiar para que encontrem “um fiapo de desvio” em sua vida, porém, todos os questionamentos sobre o patrimônio real do peemedebista seguem em aberto.
Na declaração de bens entregue à Justiça Eleitoral, o ex-governador listou um patrimônio total de R$ 979 mil, divididos em um imóvel de alto padrão em Vila Velha, no valor de R$ 617,5 mil, a participação na empresa Hartung Palestras e Assessoria (R$ 70 mil), além de aplicações financeiras (fundos de investimento e cartões pré-pagos) que totalizam R$ 291.523,35. No entanto, os valores estão bem aquém do verdadeiro patrimônio do peemedebista, revelado nas últimas semanas em reportagens do jornal Século Diário e que tiveram repercussão até na imprensa nacional.
O primeiro episódio foi a “mansão secreta” do ex-governador e da mulher nas montanhas capixabas. Em agosto de 2011, o casal adquiriu um terreno de 2,1 mil metros quadrados no condomínio “Villaggio Verdi”, na região de Pedra Azul, em Domingos Martins. No local, Hartung construiu uma edificação de alto padrão, mas tanto o terreno quanto a mansão – que sequer foi registrada em cartório – foram omitidos da declaração de bens do candidato.
Questionado sobre a omissão no registro da mansão, o peemedebista afirmou que o imóvel foi declarado pela esposa, fato que o “desobrigaria” de informar a existência do bem à Justiça Eleitoral – e consequentemente aos eleitores capixabas. Essa tese não é sequer abrigada pela legislação, que obriga a declaração de todos os bens no momento de sua candidatura. O ex-governador é casado em comunhão parcial de bens, que atrela o patrimônio adquirido por um cônjuge após a união. Esses objetos de propriedade compartilhada também deveriam ser declarados.
Outro exemplo de patrimônio oculto do ex-governador envolve a criação de uma empresa familiar (a PPG Empreendimentos Imobiliários), no final de seu governo, com o objetivo de abrigar cerca de R$ 36 milhões em imóveis e terrenos – a maioria deles oriundos de herança. Diferentemente do que prevê a legislação sobre as holdings familiares – tipo de empresa que tem como objetivo a preservação do patrimônio e garantir a sucessão entre os herdeiros –, Hartung não figura no quadro societário da companhia.
No lugar do candidato ao governo, herdeiro natural dos bens do pai (Paulo Pereira Gomes, cujas iniciais foram utilizadas na razão social da empresa), somente a ex-primeira-dama Cristina Gomes e os filhos do casal compõem a companhia. Mas assim como ocorreu no caso da mansão, os ativos da PPG Empreendimentos Imobiliários também não constam na declaração de bens do peemedebista.
Uma parceria a preço de custo
O único imóvel declarado por Hartung também é alvo de controvérsias, um apartamento no Edifício Moacyr Loureiro, localizado na Avenida Estudante José Júlio de Souza, em frente da orla de Itaparica, em Vila Velha. No pleito de 2006, o peemedebista declarou o mesmo imóvel, ainda em construção pelo mesmo valor (R$ 617,5 mil). Hoje, uma unidade no mesmo prédio não sai por menos de R$ 1,3 milhão, de acordo com anúncios publicados na internet.
O ex-governador mora em uma unidade no último andar (1101) com quatro quartos, sendo duas suítes, sala de três ambientes, home theater, cozinha/copa, três vagas de garagem, com área total de 250 metros quadrados. O empreendimento foi construído pela Galwan, mesma construtora que aparece em outro caso envolvendo o ex-governador: a transação de compra e venda de um apartamento de luxo no Barro Vermelho, bairro nobre de Vitória, que foi escriturado em 19 de maio de 2011 pelo valor de R$ 48 mil e vendido na mesma data por R$ 2,1 milhões.
No início da corrida eleitoral, o ex-governador conseguiu retirar do ar duas reportagens veiculadas no jornal ES HOJE e no blog do jornalista Elimar Côrtes, que levantavam a suposta omissão da operação na declaração de bens do candidato. De acordo com o registro em cartório, o ex-governador “adquiriu” um apartamento no edifício “Solar Oliveira Santos”, com área de mais de 600 metros quadrados, da Galwan Construtora e Incorporadora (que construiu o prédio).
No dia seguinte, Hartung vendeu a unidade para a empresa Lazer Administração e Participação (que pertence ao empresário Victor Pignaton, diretor do colégio Leonardo da Vinci) e Maria Alice Paoliello Lindenberg (uma das proprietárias da Rede Gazeta). Toda a operação de compra e venda está registrada no Livro Registro nº 2, matrícula 59364, do 2º Cartório de Registro de Imóveis de Vitória.
Essa relação de Hartung e a Galwan vai muito além da aquisição de imóveis. A holding familiar do ex-governador, a PPG Empreendimentos Imobiliários, é dona de três lotes em Jardim da Penha, que vão dar espaço a um novo condomínio da construtora. O prédio será batizado de Edifício Paulo Pereira Gomes, em alusão ao pai do ex-governador, morto há mais de uma década. O empreendimento vai contar com apartamentos de dois e três quartos, com área total entre 72 e 88 metros quadrados. O valor inicial das unidades de dois quartos começa em R$ 411 mil, e os apartamentos de três quartos em até R$ 517 mil, de acordo com a própria construtora.
Os três lotes foram declarados bem abaixo do valor de mercado no contrato social da PPG. Ao todo, o terreno com área total de 1,5 mil metros quadrados foi estimado em R$ 50.970,54. No entanto, o terreno foi avaliado em R$ 3 milhões por fontes do mercado imobiliário ouvidas pela reportagem do Século Diário.