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Jack Rocha pode relatar um dos processos de ofensiva contra deputadas

PL representou contra seis parlamentares, alegando quebra de decoro em manifestações em favor dos povos indígenas

A deputada federal Jack Rocha (PT) pode ser a relatora de um dos processos instaurados na Câmara contra seis parlamentares mulheres acusadas de quebra de decoro durante a votação do projeto de lei do Marco Temporal (PL 490/2023), no dia 30 de maio. O nome da capixaba foi sorteada para integrar a lista tríplice relacionada ao processo contra a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG). Cabe agora ao presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Federal, deputado Leur Lomanto Junior (União-BA), escolher um nome para relatoria de cada processo.

Ao lado de Jack, foram sorteados também os deputados Paulo Magalhães (PSD-BA) e Jorge Solla. Na representação aberta pelo PL contra a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP), a lista tríplice tem os deputados Washington Quaquá (PT-RJ), Gutemberg Reis (MDB-RJ) e Miguel Ângelo (PT-MG). Contra Talíria Petrone (Psol-RJ), a lista tem Sidney Leite (PSD-AM), Delegado Fabio Costa (PP-AL) e Rafael Simoes (União-MG). Contra Erika Kokay (PT-DF), os sorteados foram Bruno Ganem (Podemos-SP), Ricardo Ayres (Republicanos-TO) e Acácio Favacho (MDB-AP). Contra Fernanda Melchiona (Psol-RS), a relatoria será escolhida entre Gabriel Mota (Republicanos-RR), Ricardo Maia (MDB-BA) e Alex Manente (Cidadania-SP). Já a representação contra Juliana Cardoso (PT-SP) será apensada a uma anterior, cujo relator definido foi Gabriel Mota.

Todas as representações foram apresentadas pelo Partido Liberal (PL), que tem o deputado Gilvan da Federal como representante na bancada capixaba. A instauração dos processos disciplinares ocorreu nesta quarta-feira (14). Como justificativa para a ofensiva, o PL alega que as deputadas gritaram ao microfone para os deputados favoráveis ao Marco Temporal: “Assassinos! Assassinos do nosso povo indígena!”.

Apesar de os microfones terem sido cortados, o PL reclama que as deputadas continuaram ofendendo os parlamentares que fazem oposição ao governo, principalmente o deputado Zé Trovão (PL-SC), autor do requerimento de urgência para a votação do projeto em Plenário. O PL alega que as deputadas usaram as redes sociais para “manchar a honra de diversos deputados”.

O PL quer estabelecer o dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, como referência para a demarcação de territórios indígenas, determinando que somente as terras já ocupadas por comunidades indígenas até essa data podem ser homologadas, além de trazer diversos outros dispositivos que retiraram direitos já consolidados aos povos originários do Brasil.

Lula Marques/ABr

A primeira tentativa do PL de processar as parlamentares foi feita pelo presidente do partido, Valdemar Costa Neto, de forma coletiva. Porém, no dia 2 de junho, ele mesmo pediu a retirada de tramitação da representação, o que foi feito nesta terça-feira (13) pela Mesa Diretora da Câmara. Em seguida, foram recebidas pela Mesa as representações de forma individualizada.

Além do caráter contrário aos povos indígenas, as representações do PL também são entendidas pelo seu aspecto misógino, visto que somente atacou as parlamentares mulheres que se manifestaram. O fato, posicionou Fernanda Melchionna, é uma espécie de “caça às bruxas”.

Na reunião desta quarta-feira, as deputadas representadas e outros parlamentares protestaram contra a atitude do PL por meio de cartazes com frases como “Não vão nos calar”; “Não vão nos intimidar”; e “Basta de machismo”.

Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Jack Rocha ressaltou que a coordenação da bancada feminina da Câmara emitiu nota suprapartidária no início de junho a esse respeito, denunciando que as seis representações “são uma tentativa de silenciar as parlamentares, de impedir o exercício dos seus mandatos e de obstaculizar seus direitos políticos”. A nota da se baseia na legislação que considera violência política contra as mulheres “toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos delas”, conforme explica.

“É violência política de gênero sim, é violência contra os povos indígenas, é transformar o conselho em instrumento daqueles que acham que podem calar a voz das mulheres no Parlamento, eliminar o outro porque pensa de forma diferente”, reiterou a deputada Erika Kokay.

Sâmia Bonfim afirmou que as representações foram aceitas em tempo recorde. “Foram quatro horas entre o protocolo e chegar aqui na pauta do Conselho de Ética. Isso nunca tinha acontecido na história do Congresso Nacional”, apontou.

Ela defendeu ainda o direito de as deputadas se expressarem e acrescentou que todos os dias as parlamentares são ofendidas, sofrem violência política e até são ameaçadas de morte e, mesmo assim, não há punição no conselho. Na visão dela, a extrema direita se incomoda com o empoderamento feminino e tenta intimidar as parlamentares.

Para Célia Xakriabá, não há democracia com o silenciamento de mulheres eleitas democraticamente. “Parlamentar significa direito de falar. Por que não posso falar de genocídio, de etnocídio legislado?”, questionou.

“Não houve nenhuma indignação dos deputados quando no microfone de aparte me chamaram de imbecil. Isso está registrado nos vídeos. Ou quando outros deputados falam com parlamentares chamando-as de abortistas ou vagabundas, mesmo não estando com microfone aberto”, acrescentou Juliana Cardoso.

O deputado Chico Alencar (Psol-RJ) questionou a celeridade no envio das representações ao conselho, diante de tantos outros que continuam na Mesa Diretora . Ele afirmou que, por exemplo, no dia 2 de fevereiro, protocolou representações contra parlamentares que, por meio de suas redes sociais, se manifestaram em favor dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro – representações que ainda estariam “na gaveta”. Ele pediu isonomia no tratamento dos casos. Para ele, está havendo perseguição política, com uma “eiva de machismo”, não só pela pressa no envio dos processos, como pelo mérito das representações.

Alencar pediu recusa pelo presidente do conselho das representações contra as deputadas, citando precedente ocorrido na legislatura passada, quando o deputado Paulo Azi (União-BA), então presidente do órgão, não aceitou representação do Psol contra o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Já o deputado Cabo Gilberto (PL-PB) pediu que a decisão fosse colegiada, e que o presidente não retirasse as representações de pauta.

Leur Lomanto Júnior declarou que colocaria em pauta todas as representações chegadas ao órgão 24 horas depois. Ele afirmou que não tem controle sobre a ordem das representações enviadas pela Mesa Diretora ao colegiado. Além disso, alegou que, como já foi designado relator para o caso da deputada Juliana Cardoso, não se sentiria confortável em tratar as outras deputadas de forma diferenciada. Ele se comprometeu, porém, a se reunir com Lira para questionar por que representações apresentadas antes pelo Psol não foram encaminhadas ao conselho. Ele prometeu dar tratamento igual a todos os partidos no órgão.

Votação

Apenas quatro dos dez deputados federais capixabas se manifestaram contrários ao Marco Temporal  e votaram contra o Projeto de Lei 490/23: Gilson Daniel (Podemos); Helder Salomão (PT); Jack Rocha (PT); e Paulo Foleto (PSB). O sim foi dado por Amaro Neto (Republicanos); Da Vitória (PP); Evair de Melo (PP); Gilvan da Federal (PL); e Messias Donato (Republicanos). Dr. Victor Linhalis (Podemos), que havia se posicionado contra a urgência do projeto, se ausentou da votação. O placar geral ficou em 283 votos a favor e outros 155 contra.

Depois de aprovado na Câmara, o PL seguiu para o Senado, onde pode ser votado a qualquer momento. No dia 7 de junho, a tese foi retomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento de uma ação movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, depois de quase dois anos suspenso. Na ocasião, o ministro Alexandre de Moraes proferiu seu voto contrário. Em seguida, o ministro André Mendonça pediu vistas, suspendendo novamente o processo.

Até o momento, o placar no STF está em 2 a 1 contra o Marco. Em 2021, antes da interrupção do julgamento, o ministro Edson Fachin votou contra a tese, e Nunes Marques se manifestou a favor.

No caso do Espírito Santo, o Marco Temporal beneficia usurpadores históricos do território indígena Tupinikim e Guarani de Aracruz, na região norte, como a Suzano (ex-Fibria e ex-Aracruz Celulose). Durante muito tempo, a papeleira tentou sustentar a argumentação de que teria chegado em Santa Cruz antes e chegou a financiar, no início dos anos 2000, uma violenta campanha de difamação dos indígenas, por meio de outdoors espalhados na cidade que diziam “A Aracruz trouxe o progresso, a Funai, os índios”.

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