Vereador Maurício Leite, relator da proposta, apontou vício de iniciativa

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara de Vitória, em sessão ordinária realizada nesta quarta-feira (9), deu parecer contrário ao projeto da chamada “Lei Martini”, que “dispõe sobre a permissão a qualquer cidadão de instalar câmeras e capturar imagens de logradouros públicos”. Com isso, apesar de ter tramitado em regime de urgência, a matéria não seguiu para votação no plenário.
O vereador Maurício Leite (PRD), relator na CCJ, apontou que a proposta do seu colega Dárcio Bracarense (PL) “carece de maior estudo” e apresenta “vício de iniciativa”, tendo em vista que invadiria a competência exclusiva do Poder Executivo. Os outros quatro parlamentares da comissão votaram a favor do parecer: Luiz Emanuel (Republicanos), o presidente; Aloíso Varejão (PSB); Aylton Dadalto (Republicanos); e Karla Coser (PT).
Karla aproveitou para discursar mais uma vez contra a proposta. O projeto de lei, conforme reforçou, afronta dispositivo do artigo 5º da Constituição Federal, que dispõe sobre a inviolabilidade da imagem e da intimidade. A vereadora petista argumentou, ainda, que não são apresentados critérios para atender a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Ela reiterou os riscos do projeto de lei, como a possibilidade de “pedófilos instalarem câmeras na frente de escolas”, ressaltando que não há impedimento para o videomonitoramento pessoal de imóveis particulares, apenas de locais públicos. A vereadora Ana Paula Rocha (Psol) também discursou, argumentando que o debate sobre segurança é necessário, mas não pode ser feito de forma “atropelada”.
Já o vereador Dárcio Bracarense tentou contrapor os argumentos dos demais vereadores, afirmando que o projeto não aponta como a prefeitura vai disciplinar a matéria, e pediu para que os parlamentares acrescentassem emendas para retirar as eventuais ilegalidades em vez de descartá-la como um todo.
Bracarense também criticou a base governista por “se aliar ao PT e ao Psol” na discussão do projeto. Ele disse que conversou com o secretário de Governo, Erick Musso (Republicanos), para tentar mudar a orientação da gestão do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos), e que chegou a receber uma mensagem do “governo” dizendo que o Executivo faria projeto sobre o assunto se ele desistisse.
Dárcio falou ainda que, ao contrário dos vereadores governistas, não é um “político profissional” e que vai continuar “incomodando” a política tradicional. “Estou só começando. Vou tacar muito sal no capeta ainda!” comentou.
Maurício Leite se defendeu, dizendo que “não faz parte de panelinha” e é conhecido por ser “constitucionalista”. Luiz Emanuel, por sua vez, classificou como “piada” a imputação de que teria se aliado ao PT e ao Psol. Acrescentou que as articulações políticas fazem parte e é “balela” não se colocar como político, além de criticar a qualidade da atuação de figuras do PL, como o senador Magno Malta, que chamou de “muito ruim”.
No momento da discussão, a galeria da Câmara estava lotada por apoiadores de Dárcio Bracarense, e também por mulheres contrárias à proposta.
O projeto
O projeto de lei faz referência ao caso do comerciante Eugênio Inácio Martini, que se viu obrigado a retirar as mais de 200 câmeras que ele mesmo instalou no Centro de Vitória para supostamente monitorar atividades criminosas no bairro.
Entre os pontos do projeto de lei, está a liberação para a instalação de sistemas de captação de imagens em logradouros públicos independente de autorização prévia do Poder Público, “ressalvados os casos em que a instalação envolva a ocupação ou o uso especial do espaço público”.
Também está prevista a utilização de instrumentos que deem visibilidade às câmeras, incluindo placas informativas, além da vedação da “utilização das imagens captadas para fins ilícitos, discriminatórios, vexatórios ou que atentem contra a dignidade da pessoa humana”, e ainda a observação aos princípios da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Entretanto, moradores e parlamentares progressistas alertam para os riscos da proposta, por liberar a captura de imagens de forma aleatória e sem o consentimento de transeuntes. Na última quinta-feira (3), um grupo de mulheres se reuniu no Instituto Fênix, no Centro, para tratar do assunto. Entre as reclamações, está o fato de que as câmeras foram instaladas na altura dos corpos das mulheres e de crianças.
Martini recebeu uma moção de aplauso da Câmara. Já o ex-vereador André Moreira (Psol), que o denunciou à Promotoria Criminal do Ministério Público do Estado (MPES), foi alvo de uma moção de repúdio.