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Líderes evangélicos lançam campanha em defesa do Estado Democrático

Pastor e teólogo Abdruschin Schaeffer Rocha aponta distorções nas narrativas do bolsonarismo

“Somos um pela democracia, somos todos pelo Brasil” é a campanha que líderes evangélicos de todo País lançaram nesta terça-feira (6) em defesa do Estado Democrático de Direito. Em carta dirigida à população, com a assinatura de pastores de várias denominações e alguns conhecidos nacionalmente, apontam desafios a serem vencidos, como a fome e o desemprego, e enfatizam o respeito ao processo eleitoral e ao resultado das urnas.

Do Espírito Santo são signatários lideranças como os pastores Abdruschin Schaeffer Rocha e Kenner Terra, do Fórum Evangelho e Justiça, formado por pastores evangélicos da Grande Vitória. Kenner comenta que o documento é apartidário e serve para discutir questões relacionadas à democracia.

A manifestação das lideranças ocorre na véspera da celebração do bicentenário da Independência do Brasil, que, neste ano, será marcado por movimentos liderados pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), caracterizados pela apropriação de uma data que é de todos os brasileiros para a divulgação de fake news, como o fechamento de igrejas, ataques às instituições, em especial ao Supremo Tribunal Federal (STF), e ao processo eleitoral, por meio de contestações infundadas das urnas eletrônicas.

Abdruschin Schaeffer Rocha, que além de pastor da Igreja Metodista Wesleyana da Praia de Itaparica, é professor, teólogo e filósofo, aponta distorções nas narrativas de cunho eleitoreiro divulgadas no meio evangélico. 

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Sobre a convocação do presidente em tentar demonstrar força com fins eleitorais e ameaça às instituições, ele acentua que “essa data cívica tem sido usada ultimamente pelo atual governo para convocar sua militância para vir para as ruas. A expectativa é a de que o bicentenário da independência seja ‘palco’ para a demonstração de força popular e de disseminação de narrativas que se opõem às pesquisas de intenção de voto, que colocam à frente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”.

Antes do governo de Jair Bolsonaro, acrescenta, era comum os presidentes da República comemorarem o feriado da Independência na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, numa parada militar, que atraía pessoas de diferentes espectros político-ideológicos.

“A julgar pelas últimas manifestações, teme-se que no 7 de setembro se repita os costumeiros ataques às instituições, a defesa do fechamento do STF e de um golpe militar, o retorno do AI-5, que foi usado para caçar e prender juízes, parlamentares, e torturar aqueles que se opunham ao regime. Ao mesmo tempo, há um discurso de que esse modus operandi é, na verdade, uma ‘defesa da democracia”, ressalta.

Abdruschin aponta que esse “verniz democrático, que ainda é reforçado pela retórica maniqueísta de que estaríamos diante de uma luta do bem contra o mal, acaba legitimando uma espécie de cooptação dos símbolos nacionais. É como se aqueles e aquelas que realmente estão do lado do bem e amam o Brasil pudessem ser claramente identificados por sua afinidade política. Os símbolos são do Brasil, não de um grupo que simbolicamente tenta colonizá-los! É por isso que cartas como essa, embora não sejam a ‘resposta’ aos nossos problemas, são importantes do ponto de vista simbólico e fazem o favor de nos lembrar de nossos compromissos democráticos”.

O professor destaca ainda a necessidade de um “Brasil comprometido com a manutenção da liberdade; precisamos de evangélicos comprometidos com a manutenção da diversidade, já que é exatamente a defesa dessa diversidade que historicamente deu aos evangélicos o espaço que gozam hoje”.

Ele lembra que a Constituição de 1824 previa que, para ser cidadão, a pessoa deveria professar a religião do Estado (católica), o que significa que os não católicos não podiam nem votar. “Foi apenas em 1891 que isso mudou, quando o Brasil deixou de ser oficialmente um país católico. Ou seja, se isso não tivesse ocorrido, os evangélicos hoje não seriam considerados cidadãos, não poderiam participar da vida política do país. Num momento em que os evangélicos se tornam mais fortes e influentes, muitos querem agora destruir os mesmos princípios que os salvaram no passado da perseguição religiosa”, enfatiza.

Sobre as fake news de que Lula fechará igrejas caso seja eleito, ele afirma: “Ideias como essa fazem parte de uma narrativa que tem por objetivo alcançar o público evangélico mais sensível às ‘pautas ideológicas’, que, inclusive, foram determinantes para a eleição de Bolsonaro em 2018. A insatisfação com um Brasil refém da corrupção e o antipetismo que potencializou esse sentimento acabou por instaurar um ambiente favorável a todo tipo de narrativa absurda, como a de que, caso Lula vença as eleições, inevitavelmente fechará as igrejas ou trabalhará para a fragilização do movimento evangélico”.

Ele destaca que, em primeiro lugar, “esse tipo de discurso é absurdo, porque, claramente, mostra o quanto muitos brasileiros evangélicos desconhecem o modo como se dá a governança em nosso país, sobretudo como se define a competência dos poderes, e certamente isso torna muitos desses evangélicos reféns de líderes populistas. A menos que estejamos falando de um ambiente antidemocrático — incluindo aí todas as versões de legitimação do poder que destoam da democracia —, um presidente não pode simplesmente ‘fechar igrejas”. O professor entende que “isso seria um atentado à liberdade de culto, portanto, inconstitucional”.

Assinam o documento dos evangélicos, também, a pastora Viviane Costa, da Assembleia de Deus do Rio de Janeiro, José Marcos, da Batista de Pernambuco, e a bispa Marisa de Freitas, emérita da Igreja Metodista. Além de divulgar a carta, o grupo irá realizar eventos em capitais como Rio de Janeiro, Brasília, São Paulo e Recife, para confirmar posicionamentos baseados no documento.

“Nesse momento atual, de muitos desafios para o nosso país, como a fome, o desemprego e o subemprego que causam sofrimento a tantas famílias; nesse tempo de tantas divisões e conflitos entre muitos lares e igrejas, nos unimos a irmãos e irmãs — cristãos de diversas igrejas em todas as partes do Brasil para juntar nossas forças, orar e agir em defesa do bem estar para todos, da democracia brasileira, do processo eleitoral e do respeito ao resultado das urnas”, diz um trecho do documento.

“Passados mais de 200 anos da chegada dos primeiros protestantes em nossa terra, percebemos que temos nos distanciado dos valores humanos e evangélicos que eles nos deixaram, ideias de liberdade, democracia e dignidade humana, trazendo na bagagem a fé evangélica, eles não vieram para promover ódio e intolerância religiosa. Tinham a esperança de ajudar a construir um país abençoado, onde pessoas diversas pudessem conviver em paz”, prossegue o texto.

O documento lamenta “profundamente que a política esteja contaminando esta fé com a mentira, as fake news, os discursos raivosos e um autoritarismo que não tem nada a ver com a mensagem libertadora de Cristo. Oramos por nosso país e clamamos a Deus por democracia, direitos, justiça e paz”, acentua.

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