Fotos: Riokan
Enquanto a maioria dos candidatos adota a “fórmula mágica” da redução da maioridade penal como solução para a conter os altos índices de criminalidade no Espírito Santo, o ex-subsecretário de Direitos Humanos do Estado, Perly Cipriano (PT), faz o caminho inverso. Ele lança um olhar mais profundo sobre o encarceramento em massa da população e a falta de compromisso da classe política e da sociedade em geral com as desigualdades e os interesses políticos que geram a violência no Estado.
O motivo para escolher o caminho menos fácil para uma campanha eleitoral é sua história de luta. Perly começou a militância na área de direitos humanos ainda na década de 1960, enfrentou a ditadura, foi preso, torturado, teve de deixar o Brasil. Depois de passar dez anos na cadeia por enfrentar o regime militar, Perly entende que o discurso de que permanecer três anos preso é pouco – se referindo aos adolescentes infratores – só serve para quem nunca esteve no sistema penitenciário.
É defendendo uma política de inclusão, de valorização da juventude e da criação de oportunidades que o petista vem construindo sua candidatura. E isso não é só discurso. O candidato que tem um plano sobre a área especifica que milita, um plano de educação em Direitos Humanos, que levou mais de um ano para ser elaborado em várias discussões com a sociedade.
“O político tem de ser coerente, tem de aprender a remar contra a maré, o Brasil tem a prática de matar as pessoas na rua. Temos que ser contra. As pessoas estão falando em redução da maioridade penal, temos que ser contra, porque aquelas pessoas que estão defendendo a redução da maioridade penal, amanhã, quando acontecer o estupro de uma menina de 13 anos, vão dizer que ela também sabe o que faz”, ponderou.
Perly se diz animado com a campanha, porque o eleitorado não tem rejeição ao seu nome. Ele se sente revigorado com o apoio da juventude em suas caminhadas. Outro fator que vem animando Perly é a possibilidade de trabalhar a mobilização de campanha pelas redes sociais.
O candidato do PT conta como era difícil fazer a mobilização em tempos de ditadura, quando a pichação dos muros do “Abaixo à ditadura” era feita com sebo e graxa. Ele lembra com alegria das manifestações de junho do ano passado, quando a mobilização que levou mais de 100 mil pessoas às ruas de Vitória, não tinha por trás um partido, igreja ou carro de som à frente. “Toda a mobilização foi pelas redes sociais”.
De outro lado, ele diz que ver um jovem que nega o direito à participação política o deixa triste. Neste sentido, Perly destaca a importância das comissões da verdade que mostram de que lado estavam as pessoas que até hoje estão na vida pública, naquele momento histórico. Mas, alerta, é preciso ter engajamento já que a democracia é um processo em construção e é preciso avançar.
“Tenho tristeza de ver jovens negando a política, temos que dizer para esse jovem que muita gente se sacrificou, foi à luta, inclusive à luta armada para conquistar liberdade,e agora alguns jovens negam a política. Isso abre caminho para uma política totalitarista. Não foi para isso que eu lutei. Além disso, temos que acabar com essa generalidade de que todo político é corrupto. Betinho já ensinava, se um não presta escolhe-se um que possa te representar. Tivemos generais governando sem nenhum voto, tivemos governadores biônicos, por isso as comissões da verdade são tão importantes para mostrar de que lado estavam as pessoas naquela momento”, afirmou.
Para Perly, o afastamento da juventude da política abre espaço para o crescimento de ideias autoritárias e que as instituições precisam também ser democratizadas, assim como a sociedade. O petista diz que é preciso ficar atento aos enriquecimentos não só da classe política, mas também de lideranças populares e sindicais.
Um dos fundadores do PT, Perly também cobrou dos companheiros do partido mais comprometimento com a defesa de Lula e do governo Dilma. Ele também pediu apoio ao candidato ao governo do PT, o deputado estadual Roberto Carlos. Segundo Perly o militante não pode pedir votos para o presidente do partido e se alinhar a candidatos de outro palanque no Estado.
Perly acredita que nos últimos 12 anos o PT capixaba se afastou de sua história política e deixou de defender um projeto de governo para o Espírito Santo. O partido que ficou em silêncio durante o governo Paulo Hartung e no governo de Renato Casagrande deixou de ser um partido de ruas e se acomodou muito nos governos. Afirmou ainda que embora o partido faça parte do governo, não influi politicamente no Estado, o que o angustia.
Sobre a Assembleia Legislativa, espaço que pleiteia, Perly também é bem crítico com o silêncio da Casa nos últimos anos e a subordinação ao Executivo. Ele defende a autonomia e o compromisso de debater e fiscalizar não só o Executivo como também o Judiciário e cita a omissão do Legislativo sobre o escândalo da Operação Naufrágio.
O Executivo também teve casos graves de denúncias, e para Perly a omissão da Assembleia prejudica a população e ao próprio poder e, alerta, as pessoas estão cobrando coerência, ética e transparência. Essas foram as cobranças nas ruas, mas não acredita em grandes mudanças na Casa a partir desta eleição.
“Se tivesse passado a reforma muito poucos seriam eleitos, mas como não passou, o poder econômico e as coligações podem manter muitos deles”, disse.
Os direitos humanos para Perly é uma fratura exposta no Brasil e também no Espírito Santo. Ele cita o grampo na Rede Gazeta, que até hoje não apontou culpados. O Naufrágio para ele também é questão de direitos humanos. O sistema prisional e o sistema sócioeducativo foram denunciados. Esta é uma questão que vale para Executivo, Legislativo e Judiciário. Para Perly, a “reconstrução do Estado não é real, nem o crime organizado foi exterminado, já que todos os poderes são dominados e o crime organizado tem sua teia forte. Mais da metade dos presos estão aguardando julgamento e em qualquer País do mundo muitos nem estariam presos. Temos que pensar quais as políticas públicas para a juventude”.
Ele critica ainda o sistema de atendimento ao adolescente em conflito com a lei, afirmando que é falho. Segundo o candidato, o parlamentar tem o papel de discutir essa questão de forma mais ampla e não alimentar a ideia de encarceramento em massa de pobres e negros. “Parece que classe média não comete crime, nunca vi um jovem de classe média que foi para um lugar desse”, desafiou.
História
Perly Cipriano começou sua carreira política em 1960 no PCB e no movimento estudantil. Em 1965, participou do Congresso da Une, em São Paulo, quando cursava odontologia na Ufes, mas teve de deixar o Brasil por conta da perseguição da ditadura faltando um mês para a conclusão do curso. Foi preso pelo Exercito e no Quartel da PM em Vitória. Em 1967 foi preso pelo Dops, em Niterói, no Rio de Janeiro.
Fora do Brasil por causa do regime, cursou direito internacional. Perly retornou ao Paísl em 1969 e passou atuar clandestinamente como militante da Ação de Libertação Nacional (ALN). Em março de 1970 é preso pela PM em Olinda, Pernambuco, onde foi torturado e condenado a 94 anos e oito meses de prisão, alem da perda dos direitos políticos por 60 anos.
Em dezembro de 1979, sai da prisão por liberdade condicional e não anistiado. Em 1980 torna-se um dos fundadores do PT. Foi candidato a governador em 1982, e também chefe de Gabinete do Prefeitura de Vitória,ES, Deputado Estadual, Secretário de Estado de Justiça e Cidadania. Foi subsecretario de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Presidência da República e no governo do Estado. Agora pleiteia uma vaga na Assembleia Legislativa