“Já fizemos uma pesquisa e vimos que se o município produzir bem o que já tem, que é café e leite, consegue subir a receita própria de 5% para mais de 12% do orçamento. Depois é fortalecer as cooperativas que já existem pra aumentar a diversidade de culturas”. A perspectiva empreendedora e otimista da economia do município de menor população e renda do Espírito Santo é de Laudineia Pirovani (PSD), primeira candidata a prefeita de Divino de São Lourenço, na região do Caparaó.
O pioneirismo na política local começou em 2008, quando foi eleita a primeira vereadora do município, e a mais votada, com 223 votos. Depois dela, somente mais uma mulher conseguiu vencer até agora o machismo e entrar para a Câmara da cidade: Jociane Campos, eleita em 2013 pelo MDB, filha do ex-prefeito Zé Campos (PL), atual pré-candidato a vice de Laudineia. Seus adversários são o atual prefeito, Eleardo Costa Brasil (MDB) e o pré-candidato do Podemos, Ronaldo Borges.
“Ganhando a eleição, organizando a casa e desenvolvendo o município, com a credibilidade que a gente alcançar em todo o Estado, podemos sim começar a sonhar em gerar empregos no município, atraindo empresas e indústrias pra cá”, projeta.
O município, salienta, precisa de uma área industrial delimitada. “Como um empresário pode investir num lugar que ele nem sabe se pode construir, onde pode montar seu negócio e não tem incentivos? Um município com essa receita, que nem consegue se autossustentar?”, questiona.
Com um eleitorado concentrado na faixa etária mais jovem e que possui majoritariamente o ensino médio, Laudineia quer vencer a eleição de 2020 apostando no fim do clientelismo, que marca fortemente a política regional. “Nunca um político conversou com ninguém aqui não. Ele chega pra pedir o voto assim: ‘o que você quer, o que você precisa para votar em mim?’ Eles não têm a coragem de falar como eu: ‘o que eu quero pra São Lourenço é isso”, expõe.
“Eu não quero gastar um milhão para me eleger. Eu quero gastar no máximo cem, 150 mil, porque alguém tem que pagar essa conta”, diz, reconhecendo que a cifra é elevada para os padrões regionais. “É um custo muito alto para um município que não tem nem cinco mil habitantes, porque o meu primo gastou 47 mil, de dinheiro dele, pra se eleger em Dores [Claudemir José de Carvalho, o Ninho (PDT), atual prefeito do vizinho município de Dores do Rio Preto]. Ele agora pode administrar livremente”, argumenta.
Além do primo, o marido de Laudineia, Sebastião de Almeida Filho, o Mutuca, também é político conhecido na região, tendo sido vereador em 2001 pelo PSC. Mutuca e o irmão, que é empresário em Ibitirama, são os financiadores diretos de sua campanha. “Eu não estou aqui para ter poder a todo custo, não. Não quero ficar amarrada com secretário, quero secretários técnicos”, assevera.
O clientelismo e o favoritismo que ela ataca frontalmente em sua campanha também são seus velhos conhecidos no trabalho que exerce como técnica em enfermagem em um hospital público de São José do Calçado, também na região do Caparaó.
“Eu trabalho no hospital, eu sei: não tem vaga para UTI na central de vagas, mas se um médico ligar para o outro, tem vaga à vontade!”, revela, para novamente citar o primo e prefeito Ninho como referência de inovação. “No nosso município vizinho de Dores não precisa disso, tem tudo. O pessoal fala assim: ‘nossa, mas o Ninho consegue ambulância para o paciente de câncer ir sozinho pra Cachoeiro fazer quimioterapia!’ Isso é direito garantido por lei, não é favoritismo, não!”, esclarece, ressaltando que vê a saúde da cidade piorando a cada gestão nos últimos anos.
“Quando eu trabalhava aqui, tinha médico 24 horas, tinha raio-x, tínhamos ultrassonografia, pediatra. Tínhamos um atendimento de saúde básica muito melhor”, compara. “Não tem como viver assim! O povo de Divino de São Lourenço tem que aprender a votar igual ao povo de Dores! É o que eu tenho dito por aí por essas roças! Porque na história do nosso município, as pessoas votam por favor, por emprego. De abril pra cá, você pode entrar no Portal da Transparência, vai ver um monte de contrato novo, as estradas, vai ver que agora está ensaibrando”, denuncia.
Agricultura e turismo
As estradas são um dos principais cabos eleitorais locais. Em um município cortado por estradas vicinais que ligam os distritos entre si e à sede, facilitando ou quase impossibilitando o trânsito de ambulâncias, o escoamento da produção agrícola, o turismo e as atividades essenciais dos moradores, Laudineia coloca a qualidade permanente das estradas como um dos setores principais a receber investimentos para apoiar a agricultura e aumentar a arrecadação própria. “O café que nós temos aqui e o leite, se a prefeitura incentivar o produtor com estradas, com pavimentação, com os tratores do Pronaf trabalhando, já vai subir a receita” afirma.
Além de pavimentação adequada, é preciso retomar o trabalho de interação mais próxima ao agricultor. “O S. Miguel [Miguelzinho Caçapa (PMDB), reeleito em 2012 e falecido abril deste ano, e tio do atual prefeito] quando era prefeito, deixou pro Eleardo 12% de receita própria. A prefeitura ia de casa em casa incentivando o produtor e emitir as guias para o município, depois isso foi extinto. Hoje, o produtor não emite guia mais”, relata.
Uma terceira ação fundamental, acrescenta a pré-candidata, é ajuda para elaboração de projetos para acesso a financiamentos e programas como o Reflorestar. “Temos que ter gente na prefeitura para fazer projetos para os agricultores, um profissional técnico, um agrônomo, que venha dar suporte nas propriedades. Aqui em São Lourenço é muito carente de pessoal que faça projeto. Não é só incentivar”, enfatiza.
Outro ponto alto do município que precisa de organização é o turismo, elenca Laudineia. “Temos um potencial muito grande, mas qual a prova de que houve algum ganho para o município com turismo? Está tudo informal! Nós não temos conselho de turismo ativo, então o ministério do turismo nunca vai enviar uma verba pra nós”, aponta.
Com o aumento na arrecadação própria, o objetivo é melhorar a saúde e a educação, prioritariamente. Se a saúde é o setor que ela conhece profissionalmente, como servidora pública, a educação é um ponto de tristeza para Laudineia.
“Eu estudo desde 2012 para concurso federal. E nesse tempo todo, eu tenho aprendido matemática e português, que nunca me ensinaram na escola. O Everton meu filho é super inteligente, mas foi tirado dele, que está estudando para universidade pública, o direito, porque ele também não aprendeu nada que pedem no vestibular. E cadê que o prefeito se preocupa com isso? Não se preocupa”, protesta, relembrando que sua história familiar é a mola propulsora de seu desejo de transformação da realidade.
“Conheça a minha história e você vai saber porque eu defendo mudança. Eu sei o que é sofrer, eu sei o que é passar dificuldade, não ter roupa para vestir, não ter o alimento que quer para comer. Só que aqui ninguém vê isso, hoje vê a gente bem, com casa, com carro, tem tudo, mas não sabe como a gente ganhou isso”, conta.
Oposição
Diferentemente da experiência no Legislativo, Laudineia garante que não vai mais se afastar da vida política, como aconteceu quando encerrou seu mandato, ou caso não ganhe a eleição este ano.
“Estou preparada para fazer oposição e contar com todos que quiserem contribuir”, exulta. “Nós temos que trabalhar a oposição pensando que eu posso disputar para deputada. Eu tenho que ter cinco pessoas fortes pra fazer oposição comigo. Não é uma pessoa sozinha, porque quando chegar lá na frente, eu tenho um vice com bom nome, eu tenho candidatos a vereador com bom nome e eu tenho bom nome. Quem do grupo vai ser não importa, o que importa é que eu não tenha essa dificuldade que eu estou tendo agora, que é fazer um nome na última hora e com pandemia ainda”, descreve, tocando em outro ponto que ela decidiu mudar em sua trajetória política, que é a invisibilidade.
“Sabe por que as pessoas não me viam antes da campanha? Porque eu venho do meu plantão em Calçado e estudo para concurso. São 17 matérias que eu nunca vi na minha vida! Como é que sai pra rua assim?”, diz, anunciando que vai reservar ao menos um dia na semana pra interagir mais com as pessoas. “Não faço isso agora porque eu não quero parecer oportunista”, alega.
Esse recolhimento, no entanto, reconhece, permitiu a impressão de que, caso eleita, quem irá de fato governar será seu marido. “Ninguém governa sozinho, meu marido financia a minha campanha, vai estar comigo, sim. Mas ninguém nunca perguntou para ele qual era o meu papel na política dele. E isso me deixa indignada”, dispara, reafirmando que sua condição de mulher lhe garante um diferencial que ela não deixará ficar à sombra.
“Não é justo eu ter uma casa confortável, um carro bom, e o meu vizinho não ter o alimento em casa, não ter educação, não ter saúde. Minha visão feminina é de acolhimento, de cuidar das pessoas”, garante.