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Projeto ‘Eu Escolhi Esperar’ avança na Câmara de Vitória

De autoria de Davi Esmael (PSD), projeto construído em parceria com pastor evangélico é alvo de críticas

Tramita na Câmara de Vitória um projeto de lei que tenta combater os índices de gravidez na adolescência. As estratégias utilizadas para enfrentar o problema, no entanto, são alvos de críticas, já que o PL “Eu Escolhi Esperar” carrega o mesmo nome de um movimento conhecido nacionalmente por pregar a abstinência sexual entre jovens evangélicos.

O Projeto de Lei nº 101/2021 é de autoria do presidente da Câmara, Davi Esmael (PSD), e foi elaborado em parceria com o pastor e conferencista Nelson Júnior, que lidera o movimento “Eu Escolhi Esperar” no Brasil. Nesta segunda-feira (2), o texto foi aprovado na Comissão de Justiça da Câmara.

A proposta sugere a realização de palestras com profissionais de saúde e educação abordando os objetivos do programa e defende a divulgação de materiais explicativos para os adolescentes, “esclarecendo eventuais causas, consequências e formas de prevenção da gravidez precoce”.

A utilização da abstinência sexual como estratégia de combate à gravidez na adolescência é questionada a nível nacional. Em 2020, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH) anunciou uma campanha de prevenção à gestação precoce que tinha, entre as medidas, a mesma orientação.

Em resposta, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) recomendou que a campanha fosse cancelada, argumentando a ineficácia e falta de comprovações científicas para utilização do método.

De acordo com o conselho, a informação sobre educação em saúde sexual e reprodutiva, aconselhamento e provisão de métodos contraceptivos são as melhores maneiras de se prevenir a gravidez não planejada. “Não se consegue impor a ninguém a abstinência sexual como meio de se prevenir a gravidez na adolescência, uma vez que as pessoas iniciam a vida sexual quando se tem desejo e, preferencialmente, estejam preparadas para tanto”, afirma um trecho da recomendação.

O PL em Vitória se inspira em um projeto de lei que tramita na Câmara de São Paulo. De autoria do vereador Rinaldi Digilio (PSL), a matéria carrega o mesmo nome e também é apoiada pelo pastor Nelson Júnior. De acordo com Rinaldi, mais de 30 cidades brasileiras já replicaram a proposta.

Preocupação

A vereadora Karla Coser (PT) alertou para a utilização da abstinência sexual como estratégia de combate à gravidez na adolescência. “As políticas públicas que obtiveram sucesso nesse tema não seguiram pelo caminho da imposição ou de uma indicação religiosa. O combate envolve falar de métodos contraceptivos nas escolas e nas Unidades de Saúde, conversar sobre o corpo humano e falar sobre gênero, o que inclusive tem sido demonizado dentro de alguns espaços”, ressalta.

Apesar de o incentivo à abstinência sexual não ter sido citado ao longo do texto, o título escolhido para a matéria e as formas de elaboração do PL carecem de atenção, aponta Karla. “A gente sabe que os nomes não estão ali por acaso e esse pastor é famoso nas redes sociais. O que ele fala dentro das igrejas é uma responsabilidade dele, mas trazer isso para a política pública nos preocupa”, ressaltou.

Questionado se a defesa da abstinência sexual será uma das estratégias do programa para combater a gravidez na adolescência em Vitória, o vereador Davi Esmael apenas informou a participação do pastor na elaboração do texto, confirmando que Nelson Júnior defende “a conscientização sobre a importância de esperar o tempo certo para desfrutar da sexualidade e também a gravidez”.


Esmael ainda citou dados que indicam que, nos seis primeiros meses de 2021, 174 partos entre meninas de 10 a 19 anos foram registrados em Vitória. “Temos fartos estudos que mostram como a gravidez na adolescência gera problemas de saúde para a mãe e o bebê, além de grande chance de abandono escolar. Isso precisa nos preocupar mais e nos levar a dialogar com os adolescentes sobre esse tema tão complexo”, afirmou.

Para Karla, o projeto de lei parte de uma vinculação religiosa muito forte. “Com todo respeito a quem toma essa decisão, mas as concepções individuais não podem pautar as políticas públicas. Elas devem ser pautadas por evidências científicas”, ressalta.

A vereadora acredita que o combate ao problema passa pela educação sexual, que muitas vezes é criticada. “Eu concordo. Nós precisamos erradicar a gravidez infantil e na adolescência e falar dos impactos que isso tem na vida das jovens, mas a nossa preocupação é sobre como vai ser a construção dessa política”, ressalta.

A matéria ainda será debatida nas demais comissões da Câmara antes de ir a plenário.

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