quinta-feira, novembro 21, 2024
29.4 C
Vitória
quinta-feira, novembro 21, 2024
quinta-feira, novembro 21, 2024

Leia Também:

​’Ter mulheres e pessoas trans na Câmara de Cachoeiro é crucial’

Pré-candidata, a ativista Agatha Benks fala de sua trajetória e da mobilização para as eleições de 2024

Lucas S.Costa/Ales

“Um desafio em Cachoeiro é garantir representatividade feminina na Câmara. Ter mulheres lá é crucial para trazer perspectivas diferentes. É importante ter uma mulher trans, preta e gigante, porque diversidade é fundamental na hora de tomar decisões que afetam todo mundo. Isso garante que todas as vozes sejam ouvidas”.

As palavras são de Agatha Benks, ativista trans negra que deverá ser um dos nomes do Partido Socialismo e Liberdade (Psol) a tentar uma vaga na Câmara de Cachoeiro de Itapemirim, no sul do Espírito Santo, nas eleições municipais de 2024. Em caso de vitória, esse seria um feito histórico em uma cidade marcada pelo conservadorismo.

Se a federação do Psol e da Rede Sustentabilidade definir por uma candidatura própria na disputa majoritária, Agatha também será uma opção para ocupar a vaga. “A decisão de me candidatar a vereadora ou prefeita depende do contexto político. Estou aberta a contribuir onde a minha atuação possa fazer verdadeiramente a diferença e atender às necessidades da comunidade. A decisão ainda está em aberto, estamos dialogando”, ressalta.

Agatha Benks é uma das diretoras da União das Esquerdas Sul Capixaba (Uesc) em Cachoeiro e faz parte do Conselho Estadual para a Promoção da Cidadania e dos Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (Conselho Estadual LGBT), ocupando uma cadeira do Instituto de Fortalecimento e Empoderamento da População Negra do Sul do Estado + Diversidade (Fepnes + D). No início deste ano, ela também se tornou assessora parlamentar da deputada estadual Camila Valadão (Psol).

Com 38 anos, Agatha nasceu em Cachoeiro, mas ficou cerca de dez anos fora do município, em Itapemirim e Vitória. Voltou para a cidade natal em 2021, em meio à pandemia, para ficar mais perto da família, no bairro Bela Vista.

“Me conectei com a minha cidade e vi a necessidade de ficar. Quando voltei para Cachoeiro e vi tanta violação de direitos, exclusão de pessoas e comunidades e a falta de representatividade nos lugares, aí eu resolvi ficar e falei: ‘agora vou lutar! Quero lutar por mim, pela minha família, pelos meus, por todos, todas e todes!’. É extremamente importante eu continuar, já que eu tenho um histórico de militância”, enfatiza.

Corpo político

A ativista afirma que sua militância começou quando se reconheceu “nesse corpo trans e preto”. Sofrendo várias formas de violência e discriminação desde a adolescência, ela busca extravasar em performances artísticas, sendo engajada em movimentos de cultura popular. “Eu sou uma pessoa que nunca foi de retrucar. É na arte que eu coloco para fora, eu uso a arte como expressão política”, comenta.

Agatha já trabalhou como cabeleireira em salão de beleza, mas nunca conseguiu se estabelecer em um emprego formal no mercado. E é por isso que ela considera fundamental a pauta da empregabilidade de pessoas trans.

“Eu via as pessoas, antes mesmo de eu virar as costas, rasgarem ou amassarem meu currículo e jogar na lixeira. A sociedade só me empurrava para a prostituição, para o trevo da Coca-Cola, para a Ilha da Luz, lugares onde as minhas amigas estão e ainda vivem disso, porque é um preconceito estrutural da sociedade contra um corpo travesti”, relata a ativista, mencionando pontos de prostituição conhecidos em Cachoeiro.

Arquivo Pessoal

Decidida a ampliar seus horizontes, Agatha procurou a Educação de Jovens e Adultos (EJA) em 2016 e voltou a estudar. Em 2018, fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e, logo em seguida, começou a cursar Gestão Pública em uma faculdade particular de Cachoeiro. Paralelamente, continuou sua militância. Entretanto, mesmo depois de formada e com vários cursos feitos, continuou com dificuldades para ser inserida no mercado de trabalho.

“As desculpas sempre vieram mais ou menos do mesmo jeito: ‘O seu currículo é bom, mas você não tem o perfil.’ Teve uma vez que falaram que o meu currículo era muito bom para aquela vaga. Se era bom, por que não me deu emprego? Mas a gente sabe o que é isso. É racismo, LGBTfobia e transfobia”, denuncia.

Ela afirma que um divisor de águas em sua vida foi quando começou a militar no Instituto Fepnes + D, em Itapemirim, entre 2018 e 2019. Em Cachoeiro, já havia atuado junto ao coletivo LGBT Núcleo Pedra, mas foi o Fepnes + D que lhe deu mais projeção, permitindo que passasse a integrar o Conselho Estadual LGBT.

Pautas para a candidatura

Também foi em 2018 que iniciou sua militância partidária filiando-se ao Psol. Decidiu dar esse passo devido à necessidade de mais representatividade nos espaços de poder, missão que ela espera cumprir com sua candidatura no ano que vem.

“Essas pessoas estão aqui, contribuem com essa cidade, gastam, pagam aluguel e impostos, fazem a economia girar, mas não têm representatividade na atual legislatura da Câmara de Cachoeiro. Porque é uma Câmara totalmente conservadora, uma Câmara bolsonarista, uma Câmara racista, LGBTfóbica, uma Câmara de várias violações de Direitos Humanos”, protesta.

Caso consiga uma cadeira no legislativo municipal, Agatha pretende encampar não somente a causa LGBTQIAPN+, mas também as de gênero, das pessoas em situação de rua, dos povos de terreiro e dos movimentos sociais em geral.

“A representatividade não vem só da população LGBTQIAPN+ e do movimento negro, não. Tenho aliados importantes que acreditam no meu trabalho, pessoas brancas que são antirracistas, pessoas que não são LGBT, mas que combatem a homofobia e transfobia. Essas pessoas me seguraram aqui em Cachoeiro, porque viram a necessidade. Disseram para mim: ‘a gente precisa de você, Agatha, você é uma representante, é a voz que nós temos neste momento. Seu corpo é um corpo político”, ressalta. 

Mais Lidas