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Dois carnavais, ou muitos

É carnaval e estão sozinhos, cada qual ruminando suas saudades

Muita água passou sob a ponte, disse o poeta. Depois de um ano longo e solitário, Lauro e Laura se encontram no sábado pré-carnaval. A surpresa, as frases-feitas de praxe: Como vai; Há quanto tempo…Falam de coisas triviais, o tempo, o emprego, música, filmes, embora assuntos mais prementes fervilhem no pensamento: a paixão que os uniu, os motivos fúteis que os separaram. Nem lembram mais o que deu errado. Ou talvez se lembrem, mas é carnaval e estão sozinhos, cada qual ruminando suas saudades.

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Onde vai passar o carnaval? ela pergunta. Guarapari, como antes, ainda tenho aquele apartamento, lembra? Laura lembrava, claro, como esquecer tantos carnavais que passaram ali, ela reclamando do barulho dos blocos na rua, da praia sempre lotada, da dificuldade de estacionar. Depois que se separaram, sentiu falta. Ele lembra que ela queria ir para Miami, e ele se aborrecia com aquela ideia fixa, da constante reclamação por não terem dinheiro para a viagem: todo mundo que a gente conhece vai a Miami…

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Ficam calados, pensando as chances e possibilidades. Valeria a pena tentar mais uma vez? Como diz o ditado, agulha que se perde não se acha mais. No amor também…Um carro de propaganda passa devagar anunciando a todo volume: “As Casas Bahia têm de tudo para seu carnaval,” Uma velha marchinha de outros carnavais enche o ar: ‘Foi bom te ver outra vez, tá fazendo um ano…’ Eles se olham, sorriem. Ainda tocam essas músicas? ‘Vou beijar-te agora, não me leve a mal, tudo é carnaval…’ Vamos passar o carnaval juntos… Guarapari ou Miami?

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Muita água passou sobre essa ponte, e talvez esse encontro tenha acontecido em Miami. Tudo é possível quando a alma não é pequena, disse o poeta. Lauro e Laura se encontram no aeroporto: Você por aqui… Há quanto tempo! Um ano, rompemos no carnaval passado, lembra? Como esquecer? Ele partindo: Vou passar o carnaval em Vitória, aqui ninguém sabe o que é carnaval. Ela chegando, surpresa, Você está morando aqui? Mas sempre disse que detestava Miami… Ele ri: Pois é, apareceu uma boa oferta.

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Laura explica que veio justamente por causa do carnaval, passagem mais barata. Finalmente consegui realizar meu velho sonho. Ele pergunta se alguém vem buscá-la. Uma amiga, mas está atrasada. Ele olha o relógio, Meu voo também. Vamos tomar um café ali no Starbucks. Acham uma mesa vazia, ele pede um Toasted White Chocolate Mocha, ela acha engraçado, pede só um cafezinho mesmo, sem açúcar. Saboreiam a bebida em silêncio, tentando esquecer o que deu errado entre eles. Mas é carnaval e estão sozinhos, cada qual ruminado suas saudades.

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Muita água passou sobre essa ponte. Onde vai passar o carnaval? Laura pergunta. Vou mais a negócio, estou vendendo o apartamento de Guarapari. Tivemos bons momentos lá…Ficam calados, pesando as chances e possibilidades. Valeria a pena tentar mais uma vez? Como diz o ditado, agulha que se perde não se acha mais. Mais difícil ainda seria recuperar o amor perdido. A suave música ambiente relembra “Help” e a voz dos Beatles: ‘I know that I just need you like I’ve never done before’.

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O ano passou muito devagar. “Socorro” – ‘Eu preciso de você como nunca precisei de ninguém”, cantam. Mas quem precisa de quem nos dias de hoje? Laura e Lauro se embalam nas lembranças: Não fosse pela coincidência dos nomes não teriam se conhecido; não fosse pelos Beatles não teriam se apaixonado. Gostavam de ouvi-los no CD do carro quando iam a Guarapari, ela preferia ‘Lucy in the sky with diamonds’, ele preferia ‘Abbey Road’. Quanto tempo vai ficar em Miami? ele pergunta. Quinze dias…Talvez eu possa adiar meu voo… 

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