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Cesar MC: do Morro do Quadro, um campeão da rima

Quando César Resende Lemos se aproxima não parece (mas é) Cesar MC, rapaz sisudo que rima de forma tão feroz nos clipes e vídeos de batalhas de MCs. Traz nas mãos o surrado boné do Flamengo que sempre enfeita sua cabeça e parece mais jovem, um menino. Tem uma fala tranquila e também bastante objetiva, sem dar muitas voltas. 

Cria do Morro do Quadro, em Vitória, o jovem capixaba de 21 anos ganhou o Brasil nas batalhas de MC. Literalmente. No ano passado, sagrou-se campeão do Duelo Nacional de MCs em Belo Horizonte. “Tem gente que vê a batalha e acha que é uma coisa agressiva. Mas a batalha não é um contra o outro, são dois sonhadores rimando. No dia a dia a gente passa tanta coisa difícil, tanta violência, que transformar isso em rima talvez seja a forma mais nobre de ser agressivo”, diz.

Consagrado no “freestyle”, como chamam a rima de improviso no rap, Cesar MC agora se prepara para o desafio de projetar uma carreira e preparar um disco. Trajetória que faz lembrar o rapper Emicida, uma das principais referências que o capixaba traz.

E o início dessa carreira solo foi com sucesso estrondoso com sua “lírica engatilhada”. Gravou um rap de sua autoria produzido em videoclipe pelo canal Pineapple, um dos mais conceituados na cena do rap nacional. Quando lançado no mês passado, chegou a figurar nos Trending Topics dos mais vistos no YouTube no Brasil. Em 10 dias foram um milhão de visualizações, e vários vídeos de vlogers comentando sua performance. 

“Quem tem boca vaia Roma” é o título da música, que sagazmente dialoga com sua carreira nas batalhas, pois foi uma das rimas que o consagrou no Duelo de MCs “Quem tem boca vai à Roma / Quem tem peito enfrenta o Cesar”. 

O vídeo que em um mês de lançamento já ultrapassa 2 milhões de visualizações, serve como cartão de visitas de César MC:

“E eu naquela de vingar, nesse plano suicida

De mudar o mundo com a fé, papel, caneta e batida

Quer saber em meio ao caos o que ainda motiva?

Me diz algo mais motivador do que não ter saída!”

Além do “flow”, do ritmo acelerado, Cesar MC traz letras duras e com um profundo sentido social. Quando o país se voltava em torno do futebol, cravou:

“Enquanto o verde e amarelo as ruas vão decorando

Até queria essa alegria de ver a Copa chegando

Mas não dá pra pintar a rua 

que ainda tem sangue dos meus manos!”

O rapper define como uma das características de suas letras viajar por vários temas numa mesma canção, como num labirinto, com as infinitas possibilidades de narrar algo. Sua inspiração, diz, vem da vida.

“Nunca vou me ver realizado com um trabalho. Tô sempre querendo evoluir. Então, estou sempre estou em busca de um solo melhor”

O caráter sério, de cara fechada, faz parte da forma com que Cesar se apresenta no rap, “o MC que nunca ri”, como diz a letra de sua canção. “Às vezes precisa ser mais sério, precisa dar uma ideia mais forte. A forma que eu cresci e que eu consigo dar mais relevância a tudo que eu quero fazer é me expressando dessa maneira”, conta. “Acredito que é mais uma questão de personalidade. Também admiro muito outras pessoas que têm outro perfil de atuar, mas a forma que vi e vivi o mundo extraiu de mim esse lado”.

Diz que a partir da música conseguiu dar vazão a sentimentos ruins e transformá-los em poesia, o que o fez uma pessoa muito mais equilibrada. 

Como tudo começou

“Desde criança eu tinha uma mania um tanto estranha de escrever sobre as coisas que tinham ao meu redor e de improvisar sozinho, não mostrava pra ninguém. Não entendia muito bem o porquê eu fazia isso. Eu só fazia, era uma coisa bem minha mesmo”, lembra Cesar 

A primeira batalha que participou foi no final de 2014 na Praça Costa Pereira, em Vitória, no projeto Rap de Quinta.“Tudo aquilo que eu tinha feito sozinho na minha vida fez sentido naquela praça. Vi que tinha um monte de gente com essa mesma loucura que a minha”.

Sem conhecer o funcionamento das coisas, chegou a perguntar se tinha que pagar para participar da disputa. Mas era grátis. “O primeiro confronto eu ganhei, porém o segundo perdi. Primeiro foi a sensação de que nasci pra isso. A segunda foi uma surra tão grande que eu falei: ‘talvez não seja bem assim’. Depois voltei de novo e continuei”.

Conheceu e passou a frequentar também o Projeto Boca a Boca. E da persistência se moldou o talento. “Eu não tinha ambição nenhuma, nem sabia que existia o duelo nacional. A única coisa que eu queria era rimar e rimar bem”.

Cesar mostra certo espanto com um salto tão grande, de uma batalha com 8 pessoas em volta e nenhuma câmera para filmar em 2014 para cantar num final nacional para 25 mil pessoas em Belo Horizonte, com um registro que repercutiu nas redes. “Nunca pensei que eu ia fazer parte disso, mas tudo isso foi ficando em mim”.

Para o Duelo Nacional de MCs deste ano, o atual campeão não tem vaga garantida. Representante do Espírito Santo nas últimas duas edições, ele precisa disputar as eliminatórias estaduais que começam em breve. E tem certeza que não será tarefa fácil. “Não consigo garantir. Tem uma galera muito forte no Estado. Tem que ir pra guerra”, diz.

Ele enxerga que o cenário do freestyle capixaba é único no Brasil. “Temos uma forma bem nossa de rimar, com sentimento e vontade. Um empenho muito válido, que tem sido reconhecido”.

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