Todo mundo tem uma história com o Centro. A do prefeito Luciano Rezende foi escrita a cada nascer do sol na baía de Vitória.
Como se sabe, o prefeito é ex-remador e durante 10 anos deslizou pelas águas de Vitória às primeiras horas da vida, assistindo da baía o Centro despertar para mais um dia. Vem dessa época uma imagem especial. “Uma das visões mais lindas, que quase ninguém vê, é que durante um período do ano, ao nascer do sol, o prédio do Edifício Kennedy fica dourado. Parecem duas torres de ouro com o nascer do sol. Só vê isso quem está remando às cinco e meia, seis horas da manhã”.
As memórias afetivas do ex-remador foram reveladas durante a solenidade que inaugurou o funcionamento do gabinete que o hoje prefeito assumiu no Casarão Cerqueira Lima, no Centro. Na manhã dessa quinta-feira (31), cerca de 80 pessoas, entre secretários, vereadores, servidores municipais e líderes comunitários, se acomodaram na, digamos, segunda casa do prefeito de Vitória. A solenidade também abriu a exposição Elmo Elton, o Colecionador, em cartaz até 31 de outubro no casarão.
A transferência do gabinete do prefeito para o Centro de Vitória é um ato simbólico de valorização da região anunciada pelo prefeito ao início de sua gestão. “Uma das coisas que a gente queria fazer é dar um sinal claro do prestígio do Centro, trazendo o gabinete do prefeito”, disse Luciano. Para levar o projeto adiante, pediu uma coisa à sua equipe: rigor financeiro, que está refletido nos móveis do gabinete, todos da prefeitura, à exceção, claro, do mobiliário tradicional, de Elmo Elton, que foi recuperado.
O prefeito também solicitou um espaço já estabelecido no Centro: daí a escolha do Cerqueira Lima. A galeria do casarão terá vida normal, enquanto o prefeito ocupa uma pequena sala ao andar térreo. A instalação do gabinete no casarão foi aprovada por unanimidade pelo Conselho Municipal de Cultura.
Edificação em estilo eclético com influência neocolonial, o Casarão Cerqueira Lima foi erguido em quadra herdada do período colonial. É provável que o arcabouço de uma antiga construção tenha sido aproveitado, tendo em vista a técnica construtiva das paredes principais, a pedra de mão. O projeto foi aprovado pela municipalidade em abril de 1934. O arquiteto André Carloni foi responsável pela execução da obra.
Duas cópias de dois quadros de Carloni saíram do gabinete de Bento Ferreira para ornar as paredes do novo gabinete. Bem humorado, o prefeito repassou aos presentes o que pouco antes lhe ensinara o historiador e vereador Namy Chequer. Ele se põe ao lado do quadro e aponta as figuras. “Esse aqui é muito perto da gente. Olha o Colégio São Vicente aqui, a Casa de Vasco Fernandes Coutinho e o Hospital dos Funcionários Públicos. Que coisa, né”, diz.
As pinturas são representações singelas de cenas urbanas de um Centro lírico e longínquo. No segundo retrato, uma edificação em cuja fachada se lia “Mercado” em letras garrafais se destacava na paisagem. “E aqui também é outra paisagem do Centro. Qual é? Tá escrito mercado, né?”, perguntou. Um burburinho correu pela sala; alguém arriscou: “O Mercado da Capixaba”. Ninguém acertou. “É o prédio dos Correios no Centro da cidade”. Novo burburinho. Realmente, o Centro muito mudou de lá para cá.
“Nós queremos resgatar o Centro da cidade. O Centro não é um bairro, o Centro são nove bairros. Toda cidade que perde a identidade do Centro perde sua identidade. As cidades são os seus centros. Depois elas ficam todas parecidas, mas os centros são únicos, são onde surgiram as cidades”, disse o prefeito, destacando a seguir uma informação que obteve do mercado imobiliário: os imóveis do Centro se valorizaram nos últimos dois anos.
O gabinete do prefeito será dividido entre o Centro e Bento Ferreira. Segundas e quartas, Luciano Rezende vai despachar no Cerqueira Lima; terças e sextas, em Bento Ferreira; às quintas, o prefeito visita obras. O ato inaugural do novo gabinete foi a assinatura da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Logo a seguir, o prefeito teve uma agenda com o subsecretário de Mobilização Popular Anael Parente para tratar de reivindicações de líderes comunitários. A seguir, receberia um grupo de pastores da Igreja Adventista para discutir assuntos sobre assistência social.
Exposição
Como dissemos, o encontro também inaugurou uma exposição. Durante suas andanças pelo interior do Espírito Santo, o poeta, historiador e jornalista Elmo Elton adquiriu um pequeno porém expressivo acervo de móveis e utensílios. Elmo Elton, o Colecionador reúne 50 peças entre cama, armários, cômodas, baús, berços, máquina de costura, telefone, relógio de parede, diplomas, peças cerâmicas, entre outros objetos, restaurados pelo Instituto Modus Vivendi.
“Existem peças de origem européia e raras, mas principalmente pela sensibilidade dele em reconhecer, ainda que em peças de desenho simples e interioranos, valores que não podemos dimensionar”, analisa a gerente de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura (Semc), Patrícia Bragatto, que aponta ainda a evidente presença da imigração européia no mobiliário. Nascido em 1925, Elmo Elton doou seu acervo ao Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo em 1987, um ano antes de falecer.