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‘A Saúde no ES está refém da iniciativa privada’, avalia doutora em Bioética

Para Elda Bussinger, governo errou ao abandonar a saúde básica e coletiva para privilegiar compra de leitos privados

Divulgação

“O Estado é refém da iniciativa privada. Abandonou o que realmente resolveria o problema e implementou uma política de compra de leitos no privado ao invés de investir no público, construindo equipamentos próprios. Nós deveríamos ter tido equipamentos em quantidade suficiente pra não ficarmos reféns da iniciativa privada”. A avaliação é da doutora em Bioética e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Bioética, Elda Bussinger. 

Professora aposentada da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), pós-doutora em Saúde Coletiva e coordenadora do Doutorado em Direito da FDV, Elda é categórica ao criticar a preferência do governo de Renato Casagrande (PSB) pela saúde hospitalar em hospitais privados ou geridos por Organizações Sociais de Saúde (OSs), em detrimento da saúde básica, coletiva e pública. 


A preferência contraria não só o bom senso e o conhecimento técnico, ressalta a especialista, mas a própria Constituição, que estabelece o setor privado como suplementar ao público. “É residual, não poderia, juridicamente, ter feito essa opção”, afirma.

Enquanto isso, a saúde básica, nos municípios, essencialmente, ficou “abandonada”, na sua avaliação, e, com isso, a busca ativa dos casos, o diagnóstico precoce, a testagem maciça e o apoio para o efetivo isolamento das pessoas infectadas, não aconteceram.

O resultado, diz Elda, é a situação caótica atual, com crescimento exponencial das contaminações, sistema de saúde em colapso e população vulnerável entregue à própria sorte. “Não poderíamos ter entrado junho com shoppings abertos!”, critica, tocando em outra dimensão da gestão que tem feito as piores escolhas, na contramão de um apoio financeiro justo para que a população possa de fato exercer o necessário isolamento social. “Tem que dar condições para as pessoas sobreviverem, o dinheiro tem que chegar nas comunidades”.

“Os municípios têm precariedades. É um absurdo essa falta de ação central, assim como falta uma coordenação pelo governo federal. E Casagrande tinha toda condição de fazer isso”, aponta.

Mas o governo do Estado, pondera, ainda pode dar esse suporte, e a um custo baixo. “As equipes de saúde da família têm um potencial fantástico e poderiam estar atuando mais! As pessoas precisam de um acompanhamento próximo. Um telefonema não é suficiente. É preciso usar os agentes comunitários de saúde, indo às casas, fazendo um controle rigoroso, e ainda em conjunto com a ação social”, conclama.

“Não é recolher, é acolher essas pessoas. Não deveriam estar em casa. Muitas têm com comorbidades, sem condições de isolamento, deveriam estar em um hospital, em enfermaria, pra não ter que não hora final correr atrás de um leito de UTI”, explica.

Um “erro estratégico”, salienta, “que não é permitido por um gestor refinado, que conhece tecnicamente a saúde pública. É diferente colocar um secretário de saúde que é do setor privado, como o ex-ministro Teich, que não sabe nada da saúde coletiva. O grupo técnico da Sesa é altamente capacitado”, exalta.

Enquanto uma “diária normal” de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) no SUS é de R$ 700,00, o Estado contrata leitos privados a R$ 1,6 mil, pontua Elda. “Imagina uma UTI com 50 leitos comprados. Multiplica pelo preço da diária e veja quanto dinheiro está sendo injetado na iniciativa privada”, observa, estabelecendo uma analogia com a desindustrialização.

“Hoje nós hoje vivemos o drama de não termos respiradores e EPIs, porque desmontamos os parques industriais que os produziam e começam a comprar tudo da China. Agora não conseguimos sequer comprar em quantidade necessária”, descreve. A mesma coisa, compara, acontece com a preferência declarada por colocar dinheiro na iniciativa privada ao invés de estruturar a rede própria. “Não fizemos o dever de casa e agora temos que comprar leitos da iniciativa privada a preço de ouro”.

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