Projeto de Rafael Favatto com foco nas escolas, aprovado na Assembleia, não foi sancionado pelo governador
O veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à proposta de distribuição de absorventes para pessoas em vulnerabilidade provocou discussões em todo o Brasil sobre a garantia de acesso a esses itens de higiene essenciais. No Espírito Santo, uma proposta semelhante do deputado estadual Rafael Favatto (Patriota), para distribuição de absorventes em escolas públicas, foi aprovada em regime de urgência na Assembleia Legislativa, mas vetada pelo governador Renato Casagrande (PSB).
A proposta foi protocolada em maio deste ano, por meio do Projeto de Lei 165/2021. A matéria instituía o Programa de Fornecimento de Absorventes Higiênicos (PFAH) nas escolas públicas de ensino fundamental e médio. Um dos objetivos era “combater a precariedade menstrual, identificada como a falta de acesso ou a falta de recursos que possibilitem a aquisição de produtos de higiene e outros recursos necessários ao período da menstruação feminina”.
No dia 3 de agosto, a matéria foi aprovada em uma votação simbólica, no plenário da Assembleia Legislativa, mas foi barrada ao chegar no Executivo. O governador Renato Casagrande (PSB) se posicionou pelo veto total da matéria, justificando que, apesar de considerar “justo propósito da iniciativa parlamentar, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) teria encontrado barreiras ao analisar aspectos constitucionais”.
Na justificativa do veto, Casagrande argumentou, baseado no entendimento da PGE, que a proposta assumia uma competência privativa do governo do Estado, interferindo na execução dos serviços prestados pelas escolas públicas, ao elevar seus custos cotidianos.
A proposta também foi contrariada pela Secretaria de Estado da Educação (Sedu), que alegou não ter dados indicativos que correlacionassem o período menstrual à evasão escolar. O posicionamento da pasta alega que o projeto era nobre, mas exigiria “estudo fundamentado em dados reais”, além do planejamento de investimentos e de protocolos de implementação.
Apesar das justificativas apresentadas, esses dados já existem. Em uma pesquisa realizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), 62% das entrevistadas que menstruam responderam que já deixaram de ir à escola ou a outros locais em razão do período menstrual.
Na justificativa do projeto de lei, o deputado Rafael Favatto, que também é médico ginecologista, ressaltou que a precariedade menstrual é um problema real para as adolescentes. “A falta de acesso a produtos de higiene para lidar com o período menstrual traz enormes riscos à saúde dessas jovens, muitas vezes em virtude das soluções precárias e insalubres a que recorrem. Ademais, na falta de absorventes higiênicos, muitas perdem dias letivos, chegando a abandonar os estudos por constrangimentos vividos”, descreveu o parlamentar.
“É evidente que entraves para acessar direitos menstruais representam barreiras ao completo desenvolvimento do potencial das pessoas que menstruam. Por isso, é fundamental que se investigue mais profundamente o tamanho do impacto econômico na vida delas, que pode gerar reflexos ao longo da vida adulta. Faz-se urgente entender, ainda, a importância das perdas econômicas (ou não ganhos) implicadas, não só para elas como para toda a sociedade”, pontua o documento.
Discussão nacional e legislação em Vitória
A pobreza menstrual tem sido debatida em várias partes do mundo, mas ganhou destaque no Brasil nessa quinta-feira (7), quando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetou a distribuição gratuita de absorventes para estudantes de baixa renda, pessoas em vulnerabilidade socioeconômica, mulheres em situação de rua e presidiárias.
A sanção do Projeto de Lei 4968/19, já aprovado no Congresso Nacional, foi publicada no Diário Oficial, excluindo o fornecimento desses itens de higiene. A decisão foi criticada por políticos e entidades que defendem o direito das mulheres.
Em Vitória, uma lei sancionada em janeiro de 2020, pelo então prefeito Luciano Rezende (Cidadania), já determina a distribuição gratuita de absorventes em escolas municipais. A Lei Nº 9.613, aponta que os insumos deveriam ficar disponíveis nos banheiros das escolas da Rede Municipal de Ensino, em quantidade adequada às necessidades dos estudantes.
Nesta sexta-feira (8), a vereadora Karla Coser (PT) enviou um requerimento ao executivo municipal pedindo informações sobre o cumprimento do projeto de lei. Procurada por Século Diário, a Prefeitura de Vitória informou que instruiu as unidades de ensino quanto à aquisição de absorventes menstruais. De acordo com o município, a compra “pode ser realizada com a verba do Conselho de Escola, na rubrica custeio, mediante a três orçamentos e nota fiscal”.
No requerimento, Karla Coser ressalta a importância da garantia da dignidade menstrual e questiona se a legislação é cumprida em todas as unidades escolares. A vereadora também questiona se os absorventes são disponibilizados também em banheiros utilizados pelo gênero masculino, tendo em vista que a lei estabelece que os insumos fossem disponibilizados a todas as estudantes do sexo biológico feminino, independentemente da identidade de gênero.
“Em um país com milhões passando fome e filas para pegar osso, as pessoas têm que escolher o que comprar e, infelizmente, muitas vezes o que fica de fora são itens básicos como os absorventes”, afirma Karla.
Em abril, ela e a vereadora Camila Valadão (Psol) também enviaram uma indicação à Prefeitura de Vitória, solicitando a inclusão de absorventes menstruais em cestas básicas distribuídas pelo município. Segundo a vereadora Camila Valadão, até essa quinta-feira (7), o requerimento não tinha sido respondido pelo município.