Uma publicação feita esta semana na revista científica New England Journal of Medicine confirmou o efeito diabetogênico do novo coronavírus (SARS-CoV-2), que é sua capacidade de atacar o pâncreas e provocar diabetes mellitus em algumas pessoas ou agravar o quadro de quem já tem a doença.
“A Covid-19 é mais severa em pessoas com diabetes pré-existente e, em pessoas sem diabetes, o vírus pode alterar metabolismo, infectar o pâncreas e despertar resposta autoimune que promove diabetes. Ou seja, melhor não se infectar”, explica a doutora em epidemiologia e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel. O momento, ressalta, é de muita cautela.
O Brasil e o Espírito Santo fizeram muitas flexibilizações de atividades sociais e econômica num momento em que a taxa de reprodução estava acima de 1, caracterizando um crescimento exponencial, relembra a epidemiologista.
“A gente falhou na comunicação”, analisa.
“Quando o mapa de risco passou pra cor verde, deu uma falsa ideia para as pessoas que a pandemia estava controlada, quando ela não estava e não está”, expõe. “O que nós vimos depois disso foram aglomerações, pessoas se juntando, viajando, como se a pandemia tivesse acabado. E a gente está muito longe disso”, assevera, lembrando que atualmente, o Espírito Santo registra mais de dez óbitos por Covid-19 por dia, com picos de 15 a 16. “Não tem nenhuma doença em que isso aconteça. É muito grave. E fora as pessoas que estão morrendo, existem as pessoas que estão adoecendo e a gente não sabe o que esse vírus ainda vai provocar”, pondera. “É uma tragédia e a população precisa ser comunicada claramente sobre isso”, afirma.
Em entrevista coletiva realizada nesta sexta-feira (30), o secretário de Saúde, Nésio Fernandes, junto com o gerente de Vigilância em Saúde, Orlei Cardoso, também criticou o aumento das aglomerações desde o feriado de sete de setembro, confirmando que o comportamento provocou um aumento do número de casos positivos, fazendo com que a curva sofra uma subida significativa, acentuada pela ampliação do protocolo de testagem, abrangendo todas as pessoas sintomáticas, independentemente da idade e existência de comorbidade, bem como de seus contatos intradomiciliares.
“Tivemos de maneira explícita, fato notório, durante os dias oito de setembro e dez de outubro, uma sucessão de feriados e fins de semana com comportamentos sociais inadequados para um contexto de pandemia mesmo de baixo risco”.
Outro fenômeno confirmado pelo secretário é o crescimento da ocupação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) dos hospitais da rede privada, mas considera que o cenário ainda não repercutiu no número de mortos
“Verificamos também que os estratos sociais A e B, que conseguiram fazer um distanciamento social mais qualificado no início da pandemia, passaram a se expor de maneira mais explicita a atividades de risco da doença. Existe um cansaço psicológico, um esgotamento da capacidade da sociedade, no seu conjunto, de manter o distanciamento social praticado em abril, maio, junho e julho”.
Sobre a maior ocupação dos leitos da rede suplementar, no entanto, Nésio declara que “não há colapso ou pré-colapso”. O que existe é, “em alguns planos de saúde, o esgotamento da capacidade de atender a sua clientela em hospitais próprios”, o que sugere que tais empresas adotem a mesma estratégia utilizada pelo governo do Estado no auge da pandemia, de contratualizar leitos na própria rede privada. A Sesa chegou a ter 16% dos leitos ocupados no pico da crise oriundos de contratualização da rede privada, lembrou o secretário.
Como estratégia de preparar o Estado para uma possível segunda onda, o governo ainda pretende inaugurar mais 170 leitos até final do ano, como forma de compensar a desmobilização de leitos, que estão exclusivos para Covid-19 no Hospital Jayme Santos Neves e que devem voltar a atender outras enfermidades. A compensação também pode se dar pela retomada de contratualização da rede filantrópica ou privada, acrescentou o secretário.
Reafirmando que o aumento de casos e de ocupação dos hospitais privados não está repercutindo no aumento de óbitos, afirmou que “o Espírito Santo vive uma queda sustentada do número de óbitos, não obstante estarmos estabilizando a ocupação de UTIs Covid no Estado em 280 a 300 pacientes por dia [ocupação semelhante à da primeira quinzena de maio], com tendência de queda nos óbitos desses pacientes”.
A tendência de queda da idade das pessoas que evoluem a óbito é um fenômeno nacional, informou Nésio. No Espírito Santo, todos os municípios mostram essa tendência. Em Vitória, por exemplo, a média de idade dos pacientes que morrem de Covid-19 subiu para 73 a 74 anos e, em Vila Velha, de 63 pra 68 anos.