Principal desafio é a falta de uma rede integrada no Espírito Santo
Embora o fim da Aids esteja ao alcance ainda nesta década, de acordo com o relatório do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids), desafios como a desinformação, o estigma e a falta de adesão ao tratamento ainda dificultam a erradicação da doença. Essa é a análise do secretário político e vice-representante estadual das Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS (RNP+Brasil), Thiago Rodrigues, que alerta para a necessidade de políticas públicas mais integradas e inclusivas.
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Segundo dados do Painel Integrado de Monitoramento do Cuidado do HIV e da Aids, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) aponta que 20,1 mil pessoas que vivem com Aids acessaram o tratamento nos últimos dez anos. No entanto, a Rede Nacional estima que esse número seja ainda maior, chegando a 23 mil pessoas, considerando aquelas que não realizaram testagem.
Para Thiago, a adesão ao tratamento continua sendo o maior desafio, especialmente entre jovens de 15 a 29 anos, a faixa etária mais afetada no Estado. Embora o número de novas infecções tenha caído de mais de 2 mil casos em 2023 para 900 em 2024, e os métodos de tratamento e prevenção da infecção tenham tido avanços significativos, a falta de acompanhamento adequado impede que o número de novas transmissões seja completamente eliminado.
O Estado conta com 31 Serviços de Atenção Especializada (SAE) e Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), mas, de acordo com ele, “faltam ações para conscientizar os jovens sobre a importância de manterem seu tratamento”. Ele reforça que com os avanços da medicina, uma pessoa vivendo com HIV pode ter a mesma expectativa de vida da média nacional, desde que siga o tratamento corretamente.
Um dos problemas enfrentados pelos SAEs no Espírito Santo é a falta de uma equipe multidisciplinar adequada. “Os SAEs deveriam ter psicólogos, assistentes sociais, ortopedistas, ginecologistas, psiquiatras, além do infectologista. No entanto, nenhum dos serviços no Estado contempla essa orientação do Ministério da Saúde”, explicou. Isso faz com que os pacientes precisem recorrer à rede de atenção primária, onde enfrentam dificuldades no acesso a um atendimento integral e humanizado, aponta o representante da RNP no Espírito Santo.
Outro problema apontado por Thiago é a falta de capacitação técnica entre os gestores municipais sobre a política de alocação de recursos federais para o enfrentamento da doença. “Muitos gestores não conhecem essa política e, em alguns casos, a verba é usada de forma inadequada, como para pagamento de servidores, e essa não é a ideia”, destacou.
Entre os avanços esperados para 2025, ele destacou a luta pela aprovação da gratuidade no transporte público para pessoas vivendo com HIV no Estado. “O deputado João Coser [PT] apresentou um projeto de lei em 2023, mas ficou engavetado. Este ano pretendemos chamar uma reunião com a Ceturb [Companhia de Transportes Urbanos da Grande Vitória] ainda em março, para que compreendam a importância dessa medida”, afirmou.
Atualmente, algumas cidades como Linhares, Aracruz e Colatina, no norte e noroeste do Estado, já implementam a gratuidade ou oferecem desconto para que essas pessoas possam se deslocar para seus atendimentos médicos. Porém, Rodrigues lamenta que a Capital não esteja cumprindo uma decisão do Ministério Público que determinou o retorno do passe-livre para pessoas vivendo com HIV/Aids.
Um dos retrocessos identificados pela comunidade é a suspensão, há oito meses, das cirurgias para tratamento de lipodistrofia em pacientes com HIV. “Por um impasse administrativo, a Santa Casa não está mais oferecendo esse serviço”, relatou. Além disso, a rede defende a oferta de outras intervenções importantes, como preenchimento facial, drenagem linfática e pulsão lombar.
Rodrigues também demonstrou preocupação com os impactos que o corte de recursos dos Estados Unidos para programas de saúde pode ter no Brasil. “Há instituições que eram geridas por esses recursos e que agora podem enfrentar dificuldades para executar testagens e outras ações essenciais”, explicou.
Conferência temática
Para debater as demandas específicas dessa população e fortalecer a elaboração de diretrizes para as políticas públicas, a Conferência Temática LGBTI+ – Políticas Públicas para LGBTI+ Vivendo com HIV/Aids acontecerá no próximo dia 15, com objetivo de formular propostas que serão incorporadas ao novo Plano Estadual LGBTI+ e encaminhadas para a Conferência Nacional LGBT.
“A importância desse evento está na intenção de construir políticas públicas voltadas para essa população. Apesar dos avanços, ainda temos um grande caminho pela frente”, afirmou Rodrigues. Ele destacou ainda que, apesar da conferência ter foco na população LGBT, todas as pessoas vivendo com HIV/Aids estão convidadas a participar. O evento acontecerá das 8h às 13h, com inscrições abertas neste link.