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‘O que ocorre em Manaus é sempre indicativo do que pode ocorrer em outros estados’

Para Ethel Maciel, agressividade da segunda onda acentua necessidade de vacinar professores para volta às aulas

“Consistentemente, desde o início da pandemia, Manaus tem sido o primeiro lugar do Brasil onde as coisas acontecem. Temos visto assim. Acontece na Europa primeiro, depois em Manaus e em seguida nos outros estados, começando quase sempre por Rio de Janeiro e São Paulo. Temos visto isso ao longo da pandemia toda e é impressionante como a gente não aprendeu. O que está acontecendo em Manaus agora é só um indicativo do que vai acontecer no restante do Brasil”. 

A análise e alerta é da epidemiologista Ethel Maciel, enfermeira, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), doutora em Epidemiologia, integrante do Núcleo Interinstitucional de Estudos Epidemiológicos (NIEE), que assessora tecnicamente o governo do Espírito Santo, e do comitê que assessora o plano nacional de imunização contra Covid-19. 


Tratando-se de uma crise sanitária mundial e da cada vez maior transmissibilidade do novo coronavírus (SARS-CoV-2), a cada nova mutação identificada, os acontecimentos desta semana na capital amazonense tornam-se um problema nacional e mundial e que deve sim, ser levado em conta na organização dos estados frente à pandemia.

“A falta de oxigênio nos hospitais de Manaus indica uma necessidade de nós nos preocuparmos com nossos estoques de oxigênio, anestésicos para sedação, EPIs, corticoides, seringas … Porque com essa variante que está circulando no Brasil, é possível que tenhamos uma segunda onda mais agressiva. O colapso que não aconteceu na primeira onda pode acontecer na segunda onda”, expõe.

A mutação identificada em Manaus e no Japão, e que certamente já circula em todo o país, sublinha a cientista, “é a pior variante já encontrada no mundo”. “Ela consegue despistar nosso sistema imunológico, por isso as pessoas estão se reinfectando. É como se o organismo não conseguisse reconhecer que é o mesmo vírus. E aí o vírus vai se multiplicando muito rápido, afetando os nossos órgãos”, explica.

O Espírito Santo, ressalta Ethel Maciel, tem feito uma boa condução da pandemia, não tendo colapsado seu sistema de saúde em nenhum momento, devido ao planejamento precoce e eficiente implementado pelo governo de Renato Casagrande (PSB), principalmente na expansão da rede hospitalar, com a abertura de mais de mil novos leitos para tratamento exclusivo de pacientes Covid-19, mais de 700 deles em Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs).

“Uma boa condução, principalmente levando em consideração as guerras de narrativas e os problemas do governo federal, incentivando as pessoas a não usarem máscaras, a não fazerem o distanciamento social. o que fez com que a partir de junho, a pressão de setores da economia capixaba forçaram a reabertura das atividades. Mas conseguimos salvar muitas vidas, fizemos um bom trabalho na ampliação dos leitos e na comunicação com a sociedade. Apesar do vácuo de informação e da falta de coordenação nacional, conseguimos fazer o melhor e salvar muitas vidas”, pondera.

Enem e volta às aulas

Entre a análise do meses passados, da urgência do presente e dos sinais de perigo crescente no futuro, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é outro ponto que traz revolta e muito temor. “O Enem ser mantido no próximo domingo é de uma irresponsabilidade difícil da gente encontrar qualquer respaldo. Na subida de uma segunda onda no Brasil, em meio ao anúncio de uma nova variante, nós vamos mobilizar seis milhões de pessoas em locais onde não há condição nem de ter hospitais!”, indigna-se. 
A faixa etária que predomina entre os candidatos ao Enem, de adolescentes e jovens, apresenta um percentual elevado de pessoas assintomáticas e que apresentam poucos sintomas quando infectadas pelo vírus, lembra a especialista, ressaltando um levantamento feito pela rede CNN de notícias, que mostra, em São Paulo, um aumento considerável do número de infectados na faixa entre 10 e 29, saltando de 1% do total dos infectados no mês de março de 2020 para 6,7% nos primeiros doze dias de janeiro de 2021.

Indo para as provas contaminadas, circulando nas cidades e ficando tantas horas com 30 pessoas em salas de aula sem condições de cumprimento dos protocolos de segurança, certamente irão transmitir o vírus entre si e entre seus familiares, de forma muito rápida. “Nós vamos ver certamente aumentar o número de casos e de mortes em breve”, lamenta. “Não há condições de ter protocolos de segurança, não há segurança pra realizarmos essa prova. Isso é um absurdo, uma irresponsabilidade nesse momento!”, protesta.

A Educação tem ainda outra vertente de imensa polêmica e preocupação, que é o retorno das aulas presenciais, pretendido para fevereiro pela Secretaria de Estado de Educação e pela rede privada como um todo. Até o momento, no Estado, apenas os secretários de Educação de quatro municípios da Grande Vitória afirmaram que não retornam em fevereiro
Assim como a realização do Enem neste momento, querer forçar a reabertura das escolas em menos de três semanas, quando os números oficiais indicam que estaremos com número ainda maiores nos Índices de Transmissão (Rts) e óbitos, é outra medida condenável. 
Vacinação prioritária dos trabalhadores em Educação
Ethel defende que, sendo a educação uma atividade prioritária, a vacinação dos trabalhadores do setor deve ser priorizada também. “Os trabalhadores devem ser vacinados ao menos na segunda etapa”, orienta.  Isso é fundamental, pois crianças e adolescentes ainda estão sem previsão de vacinação, já que apenas algumas fabricantes da vacina incluíram os testes sobre segurança e eficácia nessa faixa, mas ainda para uma fase mais tardia.
“Provavelmente entre junho e julho teremos a indicação da vacina pra crianças e adolescentes”, estima. Excluindo essa faixa etária, que corresponde a cerca de 25% da população, teríamos cerca de 150 milhões de pessoas para serem vacinadas – o percentual de grávidas e pessoas cuja condição de saúde impede a vacinação é pequeno – o que totaliza 300 milhões de doses.

Sendo incluídos na segunda fase do plano de vacinação, os trabalhadores ajudarão a tornar o cenário mais seguro para o retorno das aulas presenciais. “Em fevereiro não vamos ter segurança pra retornar. Mas se começarmos uma campanha de vacinação em fevereiro, forte, poderíamos ter em março condições de voltar, isso se nós conseguirmos colocar a educação como prioridade. Aí teríamos os trabalhadores da educação vacinados, as pessoas com comorbidades e idosos vacinados, com quem as crianças entram em contato, então já faríamos um bloqueio importante da transmissão”, descreve, lembrando que, no caso capixaba, trata-se de um público de 100 mil pessoas, aproximadamente, totalizando cerca de 200 mil doses a mais do que o previsto para as fases iniciais de imunização.

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