Elizete e Julia estão entre as mais de 1,5 mil pessoas que receberam o benefício da Secretaria de Saúde este ano
Um auxílio financeiro que precisa de atualização frente à atual realidade das famílias beneficiadas. O pedido é feito por pessoas ligadas à Associação de Pais e Amigos dos Surdos e Outras Deficiências (Apasod) e que recebem ajuda de custo referente ao programa Tratamento Fora de Domicílio (TFD) da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).
Desde 2017, o valor da diária está fixado pela Portaria 002-R/2017 em R$ 78 por dia, por pessoa, para cobrir despesas de alimentação e pernoite. Segundo a Sesa, somente este ano, até o momento, já foram atendidas 1,5 mil pessoas com a diária.
Elizete Souza Barbosa e sua filha Julia são duas beneficiárias que atravessam dificuldades para fazer as viagens ao interior de São Paulo para manutenção do aparelho auditivo (Implante Coclear – IC). Implantado há mais de dez anos, a adolescente precisa ir a Bauru com regularidade para que o aparelho possa funcionar a contento e o tratamento não regrida.
“No começo do tratamento, a gente tinha direito a viagem de avião, mas há seis anos cortaram e viajamos de ônibus. Eu praticamente vivo para cuidar das questões de saúde dela, nossa renda é só o BPC [Benefício de Prestação Continuada, pelo INSS]. A ajuda de custo do governo supre a necessidade muito apertadinho, porque São Paulo tem um custo de alimentação diferente do Espírito Santo. Vou viajar dia 26 de setembro e até hoje não sei quando o Estado vai me dar de ajuda de custo para a passagem, nem quanto. Se a gente compra com antecedência, consegue desconto. Mandei e-mail dia 29 de julho. Paguei 90,00 só de hospedagem na última vez, antes da pandemia. uma marmita está hoje R$ 20 a 25. Eu já tive que cobrir parte das passagens”, conta a mãe.
Samira Lyra Costa tem relato semelhante. As viagens que faz são para Ribeirão Preto, também para manutenção do aparelho de IC de dois filhos. “A ajuda de custo de R$ 78 não dá pra nada. Tem sempre que desembolsar dinheiro por nossa conta. Às vezes precisa ficar mais do que o planejado, mas o Estado não libera o dinheiro a mais, só depois de muitos dias que a gente volta. Tem que se virar pegando dinheiro emprestado”.
Ela conta ainda que a dificuldade com manutenção do aparelho se soma às dificuldades para tratamento complementar das crianças, que deve incluir fonoaudiologia, psicopedagogia e terapia ocupacional, além de exames também para saber como a criança está ouvindo. “Sem esses tratamentos e exames, a criança sofre, não quer ouvir, quer tirar o aparelho”, afirma.
Essa manutenção incorreta, afirma, resulta em “dinheiro público jogado fora”. Em Vitória, a instituição de referência é o Hospital das Clínicas, localizado no campus de Maruípe da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). “No hospital das clínicas tem poucas cadastradas, umas 30. Mas são milhares que precisam de atendimento e não estão cadastradas”.
Durante o pico da pandemia, ela destaca que a situação ficou ainda mais difícil e foi preciso uma solução criativa e colaborativa para amenizar: a criação de um projeto social, o CyberOuvintes, em que profissionais de saúde voluntários realizam atendimentos presenciais e remotos para as crianças e adolescentes cadastradas, tanto do Espírito Santo quanto em outros estados. Atualmente, são 35 crianças cadastradas e “uma fila de espera enorme”, diz Samira.
O primeiro grande apoio veio da escritora Lak Lobato, de São Paulo, que também é implantada. Foi ela quem fez a primeira divulgação da iniciativa em suas redes sociais, atraindo os primeiros voluntários. Em 2021, o craque do futebol Zico fez uma doação em dinheiro e divulgou um vídeo chamando mais parceiros a se somarem. Para receber os R$ 8 mil do jogador, foi preciso criar um CNPJ da entidade e aí, um novo parceiro surgiu, um escritório de contabilidade que cobra um valor simbólico para cuidar da prestação de contas.
O dinheiro das doações é utilizado para pagar exames e pilhas dos aparelhos das crianças. “A gente precisava comprar tablets para algumas que têm que fazer atendimento remoto no celular. Também precisamos de uma sala para os atendimentos presenciais. Às vezes ajudamos com a diária da viagem de algumas famílias quer precisam complementar o recurso da Sesa. Mas a verba é muito pouca”, explica Samira.
Perguntada sobre a possibilidade de reajustar o valor da diária para TFD, a Sesa informou que não há previsão.