Proposta de Fabiano Contarato vai à Câmara dos Deputados com valores inferiores ao texto original
O Senado Federal aprovou, nesta quarta-feira (24), o Projeto de Lei 2564/2020, de autoria do senador Fabiano Contarato (Rede), que institui o piso salarial da enfermagem. Após acordos entre os parlamentares e entidades representativas da categoria, a matéria vai à Câmara dos Deputados com valores menores e sem o estabelecimento das 30 horas semanais.
O projeto aprovado na Casa de Leis institui um piso de R$ 4.750 para enfermeiros; 70% desse valor para técnicos de enfermagem (R$ 3.325) e 50% (R$ 2.375) para auxiliares de enfermagem. O texto prevê também que acordos individuais e coletivos respeitem o piso estabelecido em lei, que será atualizado, anualmente, com base no Índice de Preço ao Consumidor (INPC).
A matéria foi aprovada em turno único, seguido de comemoração dos parlamentares que estavam em plenário. Contarato exaltou a aprovação da matéria, mesmo sem o texto original. O parlamentar ressaltou a importância de um projeto como esse durante a pandemia do coronavírus, quando profissionais da área foram expostos à pandemia em todo Brasil.
“Eu não faço parte da classe da saúde, mas nem por isso não posso deixar de me colocar na dor do outro (…) Qual é o tratamento que nós, políticos, estamos dando para aquelas pessoas que estão doando as próprias vidas para nos proteger? O que nós pensamos desses profissionais? Esses profissionais não querem ser chamados de heróis, porque a dignidade profissional passa, obrigatoriamente, pela dignidade salarial e carga horária”, destacou.
Durante a fala, o senador capixaba agradeceu o apoio dos senadores, do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), da relatora Zenaide Maia (Pros-RN) e da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) pelo trabalho desenvolvido ao longo da tramitação. Contarato também pediu que Pacheco faça a interlocução com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), para que o projeto seja pautado na Casa ainda este ano.
O parlamentar capixaba também destacou a importância do reconhecimento salarial para a categoria, que é formada, em maioria, por mulheres e pessoas pretas e pardas, que tiveram que lidar até com a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) durante a pandemia.
“Eu não poderia deixar de falar pros 2,3 milhões de profissionais; 85,1% são mulheres, 53% pretos e pardos. Eu queria pedir perdão a vocês. Não tenho procuração de todos os meus colegas políticos, mas a forma como os políticos tratam vocês, infelizmente, é fruto de uma sociedade preconceituosa, racista, sexista, homofóbica, misógina, xenofóbica. Esse projeto de lei é uma pauta feminina. É uma pauta para os pretos e pardos, porque infelizmente, no Brasil, dizer que todos somos iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, está longe de ser uma realidade”, enfatizou.
Emocionado, Contarato também lembrou da cunhada, de 44 anos, que era técnica de enfermagem e morreu vítima da Covid-19. “Recebia um salário mínimo, morreu, pagou com a vida, tendo vacina. São mortes evitáveis. Eu não quero isso para ninguém, porque só quem perde alguém sabe a dor. Tenhamos humildade, empatia, vamos nos colocar na dor do outro. Vamos lutar por uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária”, declarou.
Acordo
Os valores iniciais, propostos por Contarato, fixavam um piso de R$ 7,3 mil mensais para enfermeiros, R$ 5,1 mil para técnicos de enfermagem, e R$ 3,6 mil para auxiliares de enfermagem e parteiras. O texto foi alterado após um acordo entre parlamentares e entidades representantes da categoria, única forma encontrada para que a matéria fosse colocada em pauta.
O Sindicato dos Enfermeiros do Espírito Santo (Sindienfermeiros-ES) já havia se posicionado contra os valores propostos no acordo, defendendo o texto original da matéria.
“O PL vem com emendas que descaracterizam totalmente a proposta original do senador Contarato. Essas emendas engessam os valores, reduzem ainda mais os salários dos enfermeiros, e não incorporam a carga horária de 30 horas”, afirmou a entidade.
Em uma nota publicada nessa terça-feira (23), o sindicato manifestou preocupação com o relatório final da matéria. “Caso esse PL seja aprovado, os enfermeiros que optarem por não aceitar a redução do valor, em especial desvinculado das 30 horas, em locais onde não existem jornada de 30 horas estabelecida, passariam a receber R$ 4.750 por 44 horas semanais. Salvaguardando os servidores públicos que recebem mais do que esse valor, entretanto, poderiam ter salários congelados sem reajuste, como já acontece na prática de alguns municípios e estados”, apontou.
Histórico de luta
Apresentada no dia 12 de maio de 2020, o projeto de lei de autoria do senador Fabiano Contarato ganhou destaque durante a pandemia, se tornando uma das principais pautas da Enfermagem.
Desde o início, a tramitação da matéria enfrentou entraves como o posicionamento contrário da Confederação Nacional de Municípios (CNM), que enviou um ofício ao Senado Federal alegando entender a importância da valorização dos profissionais, mas afirmou que a iniciativa levaria “a frágil situação fiscal dos municípios ao colapso imediato”.
O posicionamento foi reforçado inclusive pela Associação dos Municípios do Espírito Santo (Amunes), que também assinou o documento. Em um novo posicionamento, as instituições chegaram a defender a instituição do piso, com a premissa de que, caso a matéria fosse aprovada, as carreiras dos servidores dos municípios fossem federalizadas, transferindo para a União.
Ao longo deste ano, sindicatos, federações e entidades que representam os profissionais da Enfermagem realizaram uma série de atividades em defesa do piso, com o estabelecimento de um estado permanente de mobilização. Em agosto, a diretoria do Sindienfermeiros-ES foi a Brasília reivindicar que o Senado pautasse a matéria. Contarato chegou a solicitar que o projeto fosse votado antes do recesso parlamentar, em julho, o que não ocorreu.