O ano de 2018 foi o último do terceiro mandato do governador Paulo Hartung (sem partido). Na área da Saúde, foram doze meses marcados por uma intensa luta contra as terceirizações dos hospitais estaduais. Em dezembro, quando o atual secretário estadual da pasta, Ricardo de Oliveira, suspendeu dois editais que estavam em curso para entrega da gestão do Antônio Bezerra de Farias, em Vila Velha, e do Silvio Avidos, em Colatina, a batalha parece ter sido vencida (pelo menos em parte) pelos movimentos sociais, tendo como protagonista o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde no Estado (Sindsaúde-ES). A expectativa, no entanto, é sobre como o assunto será tratado pela nova gestão de Renato Casagrande (PSB).
Dentro do tema terceirização da saúde no plano estadual, alguns fatos tiveram destaque neste ano. Logo em janeiro, Século Diário divulgou um estudo até então desconhecido pela sociedade – Complexo Econômico Industrial da Saúde (CEIS) – que revelou que os gastos com as Organizações Sociais (OSs) que administram três hospitais estaduais terceirizados – Jayme dos Santos Neves (Serra), Hospital Central (Vitória) e Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE/Vitória) – são 2,4 vezes superiores às unidade totalmente públicas, sem garantias de melhoria nos serviços.
“Fizemos um levantamento de todos os contratos de gestão firmados entre entre 10 estados brasileiros e as OSs. Descobrimos que o problema não é o contrato de gestão inicial, que é mais divulgado. O problema são os aditivos que ninguém sabe que existem. Alguns serviços, que tiveram o contrato de gestão inicial divulgado com custo de R$ 250 mil/ano saltaram para R$ 1,5 milhão/ano. Há casos de um único contrato com 15 aditivos em apenas 12 meses”, explicou à época a professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Estado (Ufes), Francis Sodré, coordenadora do estudo no Espírito Santo. A pesquisa é realizada, há três anos, por um grupo de acadêmicos de oito universidades brasileiras, que se uniram para responder a um questionamento inicial: afinal, quanto do Sistema Único de Saúde (SUS) continua sendo público diante da invasão de empresas privadas no setor?
Caos no Himaba
O último hospital estadual terceirizado pela gestão Paulo Hartung, em setembro de 2017, também não saiu do noticiário durante o ano de 2018: o Infantil de Vila Velha, também conhecido como Himaba. Uma das notícias mais impactantes, também revelada por Século Diário, foi o aumento de mortes registradas na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal após a transição para a Organização Social IGH. Em maio, o jornal teve acesso a um relatório com dados oficiais da Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo (Sesa) que indicou que, no período de seis de outubro até 22 de dezembro de 2017, quase 30 recém-nascidos morreram na Utin do Himaba. De acordo com a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), indicado por próprios trabalhadores da unidade no relatório, boa parte por infecção, o que levou a quadros de septicemia. Mas não apenas isso.
Antigos e atuais trabalhadores, incluindo médicos que atuaram na Utin, e o Sindsaúde-ES elencam outros fatores, como a iatrogenia (aplicação equivocada de remédios) e também a não administração devida dos medicamentos, além de descuidos com diversos protocolos, incluindo os de higienização. Para eles, houve negligência da Organização Social Instituto de Gestão e Humanização (IGH), que assumiu o hospital após terceirização realizada pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).
Em setembro, por sua vez, foram revelados problemas com racionamento de comida para pacientes e trabalhadores do Hospital Infantil de Vila Velha. Insatisfeitos com a qualidade da alimentação, um abaixo-assinado chegou a ser entregue a representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde (Sindsaúde-ES) pedindo providência urgentes da Sesa para resolver o problema. Crianças internadas na unidade estavam comendo apenas café com leite e uma maçã pequena pela manhã, assim como os servidores. Há relatos ainda de que itens essenciais, como arroz, não estavam tendo os estoques renovados.
Outro hospital que acumulou problemas em 2018 foi o Antonio Bezerra de Farias, em Vila Velha. Nesse caso, a falta de infraestrutura colocou até a vida de pacientes em risco, como falta de materiais, medicamentos e equipamentos como respiradores; além de estrutura física sucateada e superlotação com leitos improvisados até no chão. Também foram relatados falta de materiais como luvas de procedimento, cateteres, transpore (tipo de esparadrapo) e uma lista de, pelo menos, 19 medicamentos; entre eles, item essenciais como analgésicos, antibióticos, anti-hipertensivos, anti-inflamatórios orais e injetáveis, vitaminas e até remédios usados para conter hemorragias. A unidade hospitalar, conforme denunciado por Século Diário, continua sem climatização, pois os aparelhos de ar-condicionado estão quebrados devido ao sucateamento e à falta de manutenção.
Diante de tantos problemas numa área tão essencial, a expectativa agora recai sobre o novo secretário de Estado da Saúde, Nésio Fernandes de Medeiros Júnior, de apenas 36 anos e ex-secretário de Palmas (TO). Apesar de desconhecido no Estado, militantes da área da saúde receberam de maneira positiva o anúncio do novo secretário pelo fato dele ser médico e experiente no setor, no entanto, há reservas sobre como será a continuidade do processo de terceirização dos hospitais estaduais.
Municípios
Militantes de movimentos sociais nos municípios de Serra e Cariacica, na Grande Vitória, também realizaram uma intensa mobilização contra a terceirização da saúde nessas cidades. Nesses casos, estão em processo de privatização o Pronto de Atendimento (PA) do Trevo de Alto Laje e o PA e Maternidade de Carapina.
Diversas manobras dos gestores públicos dos dois municípios, respectivamente os prefeitos Audifax Barcelos (Rede) e Geraldo Luzia de Oliveira Júnior, o Juninho (PPS), foram foram denunciadas no ano de 2018, desrespeitando, inclusive, deliberações dos conselhos municipais de saúde.